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O futuro das arboviroses

Devemos conviver por muitos anos com a tríplice epidemia de arboviroses; reflexo de um complexo contexto de ineficácias do poder público e da sociedade

Por Artur Timerman
Atualizado em 24 fev 2017, 12h00 - Publicado em 24 fev 2017, 12h00
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  • Há uma vasta experiência acerca do comportamento epidemiológico da circulação dos quatro sorotipos do vírus da dengue (DENV); o grande questionamento que se tem atualmente prende-se aos seguintes fatores:

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    O impacto global trazido pela circulação do vírus da dengue é enorme. Há estimativa de 50 milhões de infecções por esse vírus por ano abrangendo aproximadamente 100 países do mundo. As condições favoráveis à proliferação do mosquito transmissor observadas em vários locais do mundo fazem com que as perspectivas quanto à uma disseminação ainda mais ampla sejam preocupantes.

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    À medida que o Aedes aegypti evoluiu e passou a se tornar intimamente associado aos habitats dos seres humanos, preferencialmente neles se alimentando e compartilhando seus domicílios, essa espécie se tornou vetor extremamente eficiente do vírus da dengue, quando o mesmo foi introduzido, inicialmente nas cidades portuárias. Essas foram as condições que consubstanciaram as grandes pandemias de dengue relatadas durante os séculos XVIII, XIX e início do século XX, quando nos recordamos que essa foi uma época de forte desenvolvimento da indústria naval, que se deu paralelamente à grande urbanização das cidades portuárias, em resposta ao amplo incremento no tráfego oceânico.

    Enquanto na década de 1960, mais da metade da população que habitava o Brasil residia em zonas rurais, os números observados em 2010 mostram que 84,4% da população reside em regiões urbanas. Essa inversão se deu sem que toda a necessária infra-estrutura de saneamento básico requerida fosse implementada. A falta no abastecimento de água e de coleta de lixo está relacionada ao alto número de casos de dengue nas cidades. Dos 48 municípios com risco de surto da doença no verão de 2012, 62,5% tinham menos da metade das casas com acesso ao saneamento adequado.

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    A situação atual e preocupante das arboviroses no Brasil reflete um complexo contexto, no qual interagem entre si ineficácias gerais de atuação do poder público e da sociedade em geral. Assim, deve-se buscar soluções para essas epidemias e também manter planos de combate eficientes contra a febre amarela, cuja transmissão igualmente ocorre pelo Aedes aegypti, sendo que sua migração em massa para o ambiente urbano não deve ser descartada, principalmente porque já houve constatações de casos esporádicos de febre amarela em centros urbanos brasileiros.

    Os condicionantes da expansão das arboviroses nas Américas e no Brasil são similares e referem-se, em grande parte, ao modelo de crescimento econômico implementado na região, caracterizado pelo crescimento desordenado dos centros urbanos.

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    O Brasil concentra mais de 80% de sua população em áreas urbanas, com importantes lacunas no setor de infra-estrutura, tais como dificuldades para garantir o abastecimento regular e contínuo de água, assim como também é deficiente a coleta e destinação adequada dos resíduos sólidos. Outros fatores, tais como a acelerada expansão da indústria de materiais não biodegradáveis, além de condições climáticas favoráveis, agravadas pelo aquecimento global, conduzem a um cenário que impede, pelo menos a curto prazo, a proposição de ações visando à erradicação do vetor transmissor.

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    Some-se a esse já sombrio panorama, o modelo de urbanização implementado em nosso país, assim como em muitas outras cidades que compõem essas sociedades do “capitalismo periférico”:

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    Temos sido bombardeados por informações, muitas vezes desencontradas, sobre diferentes métodos para combater a presença do mosquito Aedes aegypti em nossas cidades. Especial ênfase vem sendo dada ao combate domiciliar do mesmo, sobressaindo-se as informações acerca de como evitar a eclosão de larvas dos mosquitos que estiverem presentes nos vasinhos de plantas presentes dentro das casas e apartamentos da população.

    Considero essa atitude uma maneira pela qual desviamos de uma abordagem mais objetiva do problema. Dentro desse panorama, onde se situaria a ênfase no combate domiciliar ao mosquito ? Em minha opinião, serve apenas para que retardemos o debate sobre a importância do saneamento básico no controle e possível futura erradicação do vetor. Creio, portanto, que dengue, chikungunya e zika estão intimamente correlacionados à problemática do saneamento básico. Encaremos isso de frente, não escamoteando a realidade através da valorização dos vasinhos de plantas presentes nas casas das pessoas.

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    Isso posto, esperamos expressiva circulação do vírus zika a partir do mês de novembro, principalmente nas regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul do Brasil. Nossas mulheres devem permanecer atentas a essa situação e deve ser enfatizado os cuidados para evitar a picada do Aedes, através do uso de repelentes de forma correta.

    Em relação à epidemia de infecções pelo vírus chikungunya, o comportamento epidemiológico se mostrou semelhante àquele observado inicialmente com o vírus da dengue:

    Devemos ainda conviver por muitos anos com essa tríplice epidemia; a interação entre elas deve ser objeto de estudos aprofundados. Um dos aspectos a ser abordado diz respeito à dificuldade de melhor avaliação de vacinas, que devem abordar o questionamento quanto à imunidade cruzada.

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    Como exemplo, podemos levantar a seguinte dúvida, ainda longe de ser esclarecida: a presença de anticorpos contra dengue em uma pessoa leva à maior proteção ou ao aumento do percentual de casos graves quando essa pessoa for infectada pelos vírus zika ou chikungunya?

     

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    (Felipe Cotrim/VEJA.com)

     

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