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Informação e análise
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Ressaca da vitória

Negociar com o Congresso é governar. A questão central está em o que e como negociar

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 27 ago 2022, 13h47

Aconteceu na terça-feira, 26 de novembro, numa suíte de hotel em Brasília. Deputados federais há mais de uma década, eles presidiam partidos e negociavam a base parlamentar do novo governo.

A conversa na manhã daquela primavera de 2002 foi curta e proveitosa para ambos. Ao sair, Valdemar Costa Neto, do Partido Liberal, deixou com José Dirceu, do Partido dos Trabalhadores, uma lista com duas dezenas de nomes para ministérios e empresas estatais.

Quando o inverno chegou, Lula já governava com o apoio de seis em cada dez deputados e senadores. Sua base parlamentar aumentara um terço em apenas um semestre. O epílogo desse enredo do Centrão de Lula é conhecido. Hoje, enleva petistas na aversão ao relacionamento com partidos de centro, sobretudo com os de centro-direita. “Nós não vamos aprender com a história?” — tem repetido Fernando Haddad, candidato do PT ao governo de São Paulo.

Passaram-se duas décadas até a última segunda-feira, quando Jair Bolsonaro foi ao Jornal Nacional justificar a dependência e a utilidade de ter o próprio Centrão, depois de demonizá-lo na campanha de 2018 — contradição questionada por seus eleitores.

“O Centrão são mais ou menos 300 deputados” — argumentou. “Se eu deixar de lado, vou governar com quem? São 513 deputados (…) O lado de lá, os 200 que sobram, pessoal do PT, PC do B, PSOL, Rede, não dá para você conversar com eles. E até não teriam número suficiente para aprovar sequer um projeto de lei comum (…) Como é que eu vou trabalhar com o Parlamento sem os partidos do Centrão?”

Com Bolsonaro, esse aglomerado de partidos foi além da partilha de espaços na administração pública. Uma providencial ajuda da maioria da oposição permitiu-lhe consolidar o controle direto do Congresso sobre um quarto do Orçamento federal. Multiplicaram-se por quatro (para 20 bilhões de reais) os gastos anuais com emendas parlamentares, em comparação com os governos Dilma Rousseff, do PT, e Michel Temer, do MDB. A falta de transparência nos repasses caracterizou o “orçamento secreto” ou “paralelo”.

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“Agora, a aprovação dos presidentes despenca cada vez mais rápido”

Quem se eleger presidente em outubro vai precisar encarar um Congresso mais coeso e enxuto — hoje são 24 partidos. Revigorado na imposição do Orçamento e, também, no domínio de uma agenda para 2023 pontuada por enormes conflitos de interesses. É o caso da revisão do papel das agências estatais que regulam e fiscalizam os mercados de saúde, energia, finanças, saneamento, transportes e telecomunicações, entre outros.

O país, de novo, vai eleger um presidente sem maioria para governar. No máximo, terá bancada aliada equivalente a um quarto dos deputados e dos senadores, de acordo com os cenários mais otimistas do PT de Lula e do PL de Bolsonaro. Vai precisar obter o dobro e mais um para completar a maioria na Câmara e no Senado.

Dois dos cinco presidentes eleitos nas últimas três décadas foram apeados do Palácio do Planalto por impeachment (Fernando Collor e Dilma Rousseff). Bolsonaro resolveu entregar corpo e caixa do governo aos aliados do Centrão para escapar da centena e meia de pedidos de impedimento. O número mágico da sobrevivência política no Congresso é 171. Equivale a 33% dos votos dos deputados e é o mínimo necessário para impedir a aprovação de impeachment na Câmara.

Sendo cada voto imprescindível, negociar com o Congresso é governar. A questão central está em o que e como negociar. Essa é a escolha fundamental de cada presidente. É pessoal e intransferível. Nas últimas duas décadas prevaleceu o método, variou a forma — antes, por fora do Orçamento, com o mensalão, e agora por dentro dele, com o “orçamento secreto”. O resultado tem sido uma crise perene.

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Arrogância presidencial, é bom lembrar, costuma ser vista como pecado capital, passível de eterno arrependimento. Como naquela história de Antônio Soares Calçada, dirigente do Vasco, que diante da oferta de um jovem atacante, em 1955, respondeu: “Pelé? Quem é Pelé? Você está brincando comigo”.

Vencer em outubro é difícil, e é apenas o começo. A ressaca da vitória ensina que o poder é um empréstimo. E, desta vez, tem uma novidade. A aprovação dos presidentes na América Latina passou a despencar drástica e rapidamente a partir do dia da posse. A lua de mel com os eleitores caiu, na média, de seis para três meses, informa o Directorio Legislativo, da Argentina, que monitora pesquisas de opinião política no Brasil e em mais dezessete países. Negociar é preciso, subestimar o eleitorado custa caro.

Os textos dos colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de VEJA

Publicado em VEJA de 31 de agosto de 2022, edição nº 2804

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