“Clava forte” para autoridades cúmplices nas invasões
Ataques provocaram reequilíbrio entre Poderes e consenso sobre a necessidade de punições. Principalmente, às autoridades civis e militares envolvidas
O tempo mudou em Brasília. A invasão do Palácio do Planalto, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal, no 8 de janeiro, provocou reações institucionais imprevistas: o reequilíbrio entre os Poderes republicanos e um consenso sobre a necessidade de punições. Principalmente, às autoridades civis e militares envolvidas.
Chefes do Executivo, Legislativo e Judiciário anunciam-se dispostos à autocontenção, o que significa cada um manter-se no seu “quadrado” constitucional, respeitando fronteiras de autonomia.
Governo e Congresso ensaiam acordo com partidos para mitigar a febre da judicialização de questões políticas, passíveis de solução em negociações legislativas.
Seis em cada dez ações reivindicando intervenção do STF têm partidos, deputados e senadores como autores. Em quase todas requerem arbitragem judicial para impasses de natureza política — desde arguições sobre regimentos internos da Câmara e do Senado até nulidades de matérias legislativas aprovadas nas comissões e nos plenários.
Esgotou-se um ciclo, observou Arthur Lira (PP-AL), depois da reeleição no comando da Câmara com 90% dos votos: “É hora de desinflamar o Brasil, distensionar as relações, e os Poderes da República devem dar exemplo. É hora de ver cada um no seu ‘quadrado’ constitucional, para voltarmos a ver os Poderes articulando, interagindo com a clareza exata de onde termina o espaço de um e começa o do outro.”
“Não dá mais”, acrescentou, “para que as decisões tomadas nesta Casa sejam constantemente judicializadas e aceitas [no STF] sem sustentação legal. Resta a nós, investidos pelo poder popular, exercer a cada dia a boa política do entendimento, da conciliação e do equilíbrio.”
Nas palavras de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), reeleito na presidência do Senado e do Congresso com 60% dos votos, “o paradigma será a relação de harmonia e de independência entre os Poderes da República”.
Lula foi ao Supremo, na reabertura do prédio destroçado na invasão de 8 de janeiro, com a proposta de “construção de uma agenda institucional” com o tribunal e o Conselho Nacional de Justiça, responsável pelo controle transparência do sistema judiciário.
Rosa Weber, presidente do STF, e Alexandre de Moraes, do Tribunal Superior Eleitoral, reiteraram “respeito e harmonia” entre Poderes, dando ênfase às medidas de autodefesa do regime e das instituições.
Os ataques de 8 de janeiro não apenas levaram ao realinhamento do Executivo, Legislativo e Judiciário como, aparentemente, induziu a um consenso sobre como devem agir, usando a autonomia que dispõem.
O Judiciário, avisou a juíza Rosa Weber, prepara-se para responder “à ignorância crassa da força bruta”. Explicou, com didatismo: “Se alguma dúvida, ou dificuldade de compreensão, acaso esteja a pairar neste momento sobre o sentido do que estou a dizer, assevero, em nome do Supremo Tribunal Federal, que, uma vez erguida da justiça a clava forte sobre a violência cometida em oito de janeiro, os que a conceberam, os que a praticaram, os que a insuflaram e os que a financiaram serão responsabilizados com o rigor da lei nas diferentes esferas.”
Haverá atenção especial, completou o juiz Alexandre de Moraes, ao comportamento de servidores públicos, com e sem mandato. A invasão do Planalto, do Congresso e do STF, comentou, só pode ocorrer “com a anuência, e até participação efetiva, das autoridades competentes pela Segurança Pública e Inteligência”.
Acrescentou: “Absolutamente nada pode justificar a existência de acampamentos cheios de criminosos, com armas inclusive, patrocinados por diversos financiadores e com a complacência de autoridades civis e militares em total subversão ao necessário respeito à Constituição. Absolutamente nada pode justificar a omissão criminosa e a conivência covarde de diversas autoridades públicas com criminosos que, previamente, anunciaram que praticariam atos violentos.”
O tempo mudou em Brasília. A previsão é de nuvens carregadas no horizonte político de Jair Bolsonaro e dos seus seguidores na extrema-direita.