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Cidades sem Fronteiras

Por Mariana Barros Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
A cada mês, cinco milhões de pessoas trocam o campo pelo asfalto. Ao final do século seremos a única espécie totalmente urbana do planeta. Conheça aqui os desafios dessa histórica transformação.

“Paraisópolis é exemplo de cidade inteligente”, diz suíço

Urbanista Hubert Klumpner falou ao blog Cidades sem Fronteiras

Por Mariana Barros Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 30 jul 2020, 21h01 - Publicado em 21 fev 2017, 18h05
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Grotão Fábrica de Música, projeto desenvolvido pela equipe do suíço Hubert Klumpner para Paraisópolis (Urban Think Tank)

Dos vários lugares que o urbanista suíço Hubert Klumpner visitou em São Paulo, o bairro de Paraisópolis, antiga favela na zona sul, é seu preferido. “Paraisópolis é a verdadeira smart city, disse ao blog Cidades Sem Fronteiras durante encontro na swissnex Brazil, centro de relacionamento entre Brasil e Suíça, referindo-se ao conceito de cidade inteligente, um local onde tudo funciona. Klumpner é velho conhecido da comunidade. Em 2011 participou da criação do Grotão Fábrica de Música, projeto premiado e que prevê um edifício público multifuncional vertical no coração de Paraisópolis — mas que nunca saiu do papel. A atual gestão da prefeitura se comprometeu a analisar a  proposta para verificar se será possível implantá-la.

Para Klumpner, o sucesso de um espaço público depende apenas de uma infraestrutura mínima. Todo o resto vem como consequência. Ele afirma que, ao se preocupar em finalizar demais os edifícios, a arquitetura contribui para aumentar a desigualdade em vez de reduzi-la.  “As pessoas podem substituir a infraestrutura”, diz.

O urbanista esteve no Brasil no início deste mês participando do Global Schindler Awards, concurso para eleger o melhor projeto para a área atualmente ocupada pelo Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo), na zona oeste de São Paulo. O prêmio é promovido pelo grupo suíço Schindler, ao qual pertence a fabricante de elevadores Atlas Schindler, e é aberto a estudantes do mundo todo. Klumpner esteve entre os jurados que selecionaram doze propostas finalistas. O grande vencedor será conhecido em abril.

Além de professor de Arquitetura e Urbanismo da Escola Politécnica Federal de Zurique (ETH), Hubert Klumpner é co-fundador do Urban-Think Tank (U-TT), vencedor do Leão de Ouro da Bienal de Veneza (2012) e foi curador da Bienal de Arquitetura de Shenzhen em 2015, quando escolheu para mostra o tema Urbanismo Radical.

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Leia a seguir os principais trechos da conversa com o blog Cidades sem Fronteiras.

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O suíço Hubert Klumpner     (Foto: Wander Malagrine) (Divulgação)

1) Alguns urbanistas dizem que o planejamento urbano falhou, especialmente em países pobres como o Brasil. O senhor concorda?

Isso é uma generalização, porque o planejamento também deu certo em muitas áreas. Claro que há resultados diferentes, qualidades diferentes e também alguns desastres. O fato é que o planejamento não é mais escalável. O planejamento tradicional não existe mais, isso de dividir as áreas e definir uma como residencial, outra como comercial etc. Em planejamento, como em várias outras áreas, é preciso inovar e se perguntar: como é que chegaremos aonde queremos chegar? Quando ficamos presos a regras tradicionais não conseguimos alcançar os resultados que desejamos. As pessoas falam em smart cities, as cidades inteligentes, e a verdade é que ninguém sabe o que isso significa. Eu acredito na Los Angeles de Blade Runner. Do meu ponto de vista, Paraisópolis é uma cidade inteligente. São esses os locais que oferecem respostas sobre o que é uma smart city. Não é algo futurista. Esses ambientes deixam aflorar a realidade, enquanto melhoram e permitem inovar e absorver soluções. Há muito potencial experimental nas favelas, são ótimos laboratórios que a América Latina deveria usar. Temos de informalizar o formal e formalizar o informal.

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2) Qual a melhor maneira de criar bons espaços públicos, observar como a população os utiliza espontaneamente ou insistir em propor novos usos para melhorar velhos lugares?
Observar, sem dúvida. A maior parte das ideias já existem nas cidades. Você não pode tê-las numa mesa de trabalho porque elas estão nas ruas. Perceba como as pessoas de diferentes idades usam o que é oferecido e construído para elas e, principalmente, como não usam da maneira como se esperava. Autoridades não deveriam pensar de maneira monofuncional, criando coisas específicas para grupos e segmentos específicos. Precisam ser mais abertas e entender que de repente a escadaria da Opera House pode ser um bom espaço público para descansar ou mesmo praticar atividade física. Esses potenciais precisam ser recuperdos. Um pouco mais de liberalismo seria muito bom. Veja o caso do Minhocão, que virou um local para lazer à noite e nos finais de semana. É uma lição para os europeus, que sempre reclamam da falta de espaço. É algo que acontece em toda a América Latina. Usar avenidas e interromper os fluxos de tráfego são os melhores meios de abraçar e entender que o melhor de uma cidade são os espaços de confronto. É o que torna uma cidade diferente da outra.

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Vista aérea de Paraisópolis com o projeto do Grotão Fábrica de Música inserido digitalmente (Urban Think Tank)

3) O que é urbanismo radical, termo que o senhor usa com frequência?
Este foi o tema que escolhemos para a Bienal de Arquitetura de Shenzhen, da qual fui curador. O evento buscou lidar com o fenômeno da globalização mostrando que precisamos de novos paradigmas. Não se trata de desistir do que já temos, e sim de perceber a fragilidade de tudo isso e a existência de novas possibilidades, do que poderíamos estar fazendo. Na Índia, por exemplo, há o fenômeno das cidades líquidas, que aparecem durante grandes festivais e somem logo depois. Já em Hong Kong havia milhões vivendo em barcos, o que acabou sendo proibido pelo governo chinês, que não viu com bons olhos essa liberdade de as pessoas transitarem de um lado a outro. São alternativas de padrões de urbanização. O mesmo vale para as favelas brasileiras, as cidades informais, cujo sistema de urbanização não foi suficientemente estudado. O que é realmente necessário mudar para que esses locais se tornem melhores? Temos de trabalhar de baixo para cima. A possibilidade de melhorar os locais que já estão passando por processos urbanizatórios é o urbanismo radical. Não podemos ficar presos nos lugares comuns, repetindo coisas só por que a indústria da construção civil impulsiona isso ou os mecanismos políticos e legistativos. Muitas vezes são padrões errados, que levam à segmentação, à falta de qualidade urbana. A Bienal de Shenzen foi o local perfeito para discutir isso, já que a própria cidade de Shenzen é hoje a quarta maior da China e há alguns anos simplesmente nem existia, algo parecido com o que houve com São Paulo nos anos 1950. Temos de reconstruir essas cidades, e descentralizar é uma boa maneira de reduzir a confusão.

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4) Como jurado da premiação que elegerá o melhor projeto para o local onde está o Ceagesp, qual o senhor acredita ser o melhor uso para aquela área?
Acredito que ali deveria ser um dos muitos mercados existentes na cidade. Nao estou falando de supermercados, mas de mercados com produtos locais. Uma das experiências mais interessantes de qualquer cidade é o mercado. É onde grupos de diferentes classes sociais se encontram, onde o grande advogado compra tomates do pequeno agricultor. Temos de pensar em formas de tornar esses locais mais vivos, de abrir espaço para mercados assim como abrimos para grandes avenidas, criando igualdade social e de uso do território. Mercados são, de longe, os locais mais econômicos para se comprar comida. Mercado sempre será o programa certo, uma boa maneira de trazer vida para a rua.

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