Só as muçulmanas tuteladas na ignorância e talvez os muçulmanos menos instruídos não sabem que a inferioridade desumana a que o fundamentalismo islâmico condena a mulher não nasceu com o Islã e não é justificada no Corão. Essa escuridão não é matéria essencialmente religiosa ou cultural, como querem os seguidores fundamentalistas e os relativistas prontos a chancelar qualquer barbaridade sem sotaque americano nem jeitão europeu.
Ainda que fosse, a lucidez exige que ao multiculturalismo seja agregado o humanismo e que o relativismo seja relativizado, pois, se as religiões e as culturas não tivessem sido desafiadas, até hoje os recém-nascidos doentes estariam sendo atirados do alto das falésias gregas e persistiriam os sacrifícios humanos para subornar os deuses em troca de chuva e colheita farta.
Livros sagrados exigem leitura simbólica e o que lhes confere beleza pode levá-los a tal deformação que passam a ser suporte da negação de sua mensagem. Além disso, o exemplo dos profetas – Jesus ou Maomé – está na luminosa moralidade atemporal porque sempre instrução divina, nunca humana ou mundana. Assim, nenhum cristão precisa jejuar 40 dias no deserto e nenhum muçulmano precisa se casar com crianças para serem bons e verdadeiros cristão e muçulmano. Sim, quando tinha 50 anos, Maomé se casou com Aisha de apenas 9. Providenciou que a esposa preferida se tornasse uma mulher educada, respeitada e que, viúva aos 18 anos, viveu ainda mais 50 sendo consultada sobre questões importantes de religião e política.
O prestígio dela decaiu no contexto das disputas nada santas pela liderança do Islã. Para copiar o exemplo do profeta, os muçulmanos hoje legalmente pedófilos fazem-no pela metade, ocultando que Maomé honrou a mulher que Aisha se tornou, não lhe cassou a dignidade nem sua humanidade. Não sei se esta tara islamo-misógina se presta apenas a uma política de estado brutalmente repressora que tem na população masculina um agente com poderes absolutos sobre a feminina, facilitando o trabalho do regime no controle sobre todos, ou se também satisfaz um aleijão moral autojustificado.
Respeito e me interesso por culturas e religiões diferentes das minhas, mas, como qualquer pessoa que leva na consciência a ferida acesa lembrando que somos todos semelhantes, não critico – críticas, reservo à minha religião e à minha cultura –, e sim repudio com nojo e desconsolo um sistema em que homens obscuros impõem leis primitivas, como se divinas fossem, para sacrificar meninas e confiscar a humanidade às mulheres. Na homenagem ou na vingança ao profeta, os fundamentalistas matam Alá seguidamente. Matam-no de fundamentalismo. Respeitar isso é conversinha mole das redes sociais e das frases (mal) feitas e fáceis do Facebook.