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Rolf Kuntz: Congresso Nacional, interesses, nem tanto

São três Poderes, mas só um é visto como responsável pela saúde financeira do Estado

Por Augusto Nunes Atualizado em 30 jul 2020, 20h40 - Publicado em 21 nov 2017, 07h05
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  • Publicado no Estadão

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    Há sinais de civilização no Brasil, e até, podem crer, de responsabilidade e seriedade. Quem quiser uma prova, certamente escassa, deverá olhar os números da inflação. Será reconfortante esquecer por um momento as baixarias e barganhas brasilienses, a decomposição do PSDB e a insistência petista em copiar o desastre venezuelano. Uma pergunta crucial para a avaliação do sistema político – de quem depende, em Brasília, a defesa do poder de compra das famílias? – poderá ser feita pouco depois. Valerá a pena curtir em primeiro lugar os dados positivos. Os preços ao consumidor subiram 2,70% nos 12 meses terminados em outubro e 2,21% em 2017. Essa foi a menor taxa para o período de janeiro a outubro desde 1998, quando ficou em 1,44%. A alta do indicador no mês passado, 0,42%, é atribuível principalmente à elevação dos preços da energia elétrica e do botijão de gás, afetados um pela seca e outro pelas condições internacionais. São preços flexíveis e podem baixar mais tarde.

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    Retome-se a pergunta: a quem compete zelar pelo poder de compra dos consumidores e, portanto, pelo valor da moeda? A resposta completa envolve os três Poderes do Estado, com destaque para o Executivo e o Legislativo. Mas quem se responsabiliza mais claramente pela estabilidade dos preços é o Executivo, ou uma parte dele. No caso do Brasil, a concentração de responsabilidades econômico-financeiras em um Poder é especialmente visível quando se trata do gasto público. Invoca-se a independência dos Poderes para defender o aumento de salários e benefícios no Judiciário e no Legislativo, enquanto se despreza um dado tão simples quanto fundamental: o Tesouro, assim como o Estado nacional, é único e indivisível.

    A função de manter ou buscar a estabilidade fiscal e da moeda é em geral assumida, até contra os demais segmentos do governo, pelos setores econômicos e financeiros da administração, com destaque para o Ministério da Fazenda e o Banco Central (BC). No País, alguns fatores tendem a exacerbar a oposição entre interesses político-eleitorais e a defesa da estabilidade. A lista inclui a multiplicidade de partidos e, é claro, o presidencialismo de coalizão. Mais do que em muitos outros países, a relação entre o político e o econômico aparece no Brasil como problemática.

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    Isso tem dado credibilidade a uma tese corrente nos últimos meses. O recuo da inflação e outros fatos positivos, como a lenta reação do consumo, o início de recuperação da indústria e o saldo positivo das contratações de pessoal, apesar do desemprego ainda muito alto, têm sido atribuídos por alguns analistas a um descolamento entre economia e política. Essa é uma tese precipitada. Será perigoso tomá-la como base para qualquer aposta sobre o cenário brasileiro no próximo ano, marcado por eleições, e nos dois ou três seguintes.

    Há, de fato, uma limitada separação e isso explica a melhora de alguns indicadores. Se a política monetária dependesse do Congresso, os juros seriam provavelmente muito mais baixos, para atender aos interesses dos parlamentares e de sua clientela, e a inflação estaria, talvez, emparelhada com a venezuelana. A hipótese de uma política monetária vinculada ao dia a dia do jogo parlamentar é obviamente caricatural. Mas ilustra com clareza o conflito frequente e desastroso entre o interesse eleitoral e o mínimo indispensável de racionalidade administrativa.

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    Mesmo no Executivo a separação entre político e econômico, de um ponto de vista técnico, pode ser totalmente borrada. A História recente ilustra esse ponto. O fortalecimento do BC foi essencial para a manutenção, até outubro de 2016, de juros bastante altos para frear o aumento de preços. A reversão da política havia começado em 2013, depois de uma fase de contenção voluntarista dos juros, salto da inflação e desmoralização da autoridade monetária. A indicação de uma nova diretoria para o BC, no ano passado, sinalizou o compromisso de respeito a uma política monetária autônoma e profissional, sem recaída nos truques e no predomínio das vantagens eleitorais e das bandeiras do populismo.

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    A boa reação do mercado a essa mensagem contribuiu para a eficácia da ação anti-inflacionária. A estratégia seria muito menos eficaz se uma atitude negativa produzisse, por exemplo, instabilidade cambial e pressões sobre preços vinculados ao mercado internacional.

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    Os parlamentares, dirão as pessoas de boa vontade, contribuíram pelo menos para a reativação da economia, aprovando alguns projetos importantes para a melhora do cenário. A criação do teto constitucional para os gastos públicos e a reforma trabalhista são provavelmente os exemplos mais notáveis. Terá havido, nesse caso, um vínculo positivo entre política e economia. Mas nada é mais frágil que esse vínculo, num ambiente de 30 e tantos partidos e centenas de parlamentares empenhados, com pouquíssimas exceções, na defesa de grupos privados, de interesses corporativos, de reivindicações paroquiais e, no máximo, de bandeiras meramente regionais.

    A deformação da proposta do novo Refis, para beneficiar descaradamente empresas devedoras do Fisco, sem levar em conta o Tesouro, é uma boa ilustração. A resistência ao fim da ineficiente e custosa desoneração de dezenas de setores é outro exemplo, assim como a oposição ao adiamento do reajuste do funcionalismo.

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    Na expressão Congresso Nacional o qualificativo é claramente inadequado. A ideia de Estado nacional e a concepção de interesses objetivos, como a solidez dos fundamentos econômicos, são estranhas a esse Parlamento. Alguns parlamentares até admitem como necessária a reforma da Previdência, mas em seguida se mostram hesitantes quanto à sua aprovação. O Executivo é apontado, afinal, como único responsável pela solução do problema. Sem outra saída, o Executivo iniciou há poucos dias a negociação de um projeto bem menos ambicioso. Nos Estados Unidos, os Poderes são chamados branches of government, ramos do governo. Não por acaso, no Brasil a palavra governo é usada como sinônimo de Executivo.

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