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‘O Brasil não pode ficar seis meses parado a cada 4 anos’

Para o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, José Dias Toffoli, campanha eleitoral longa provoca custo excessivo e trava gastos públicos

Por Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 4 out 2014, 20h28

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), José Dias Toffoli, pretende encaminhar ao Congresso Nacional ainda neste ano uma série de propostas de alterações na Legislação Eleitoral. O texto, ainda em preparação, prevê a redução do período de campanha eleitoral de três meses para 45 dias, com duas semanas para votação no segundo turno; diminuição de seis para três semanas de propagandas no rádio e na televisão – com a proibição de efeitos especiais; estabelecimento de um limite de gastos de campanha; e o fim da reeleição para prefeitos. “O Brasil não pode ficar seis meses parado a cada quatro anos”, afirmou o ministro ao site de VEJA. “A lei eleitoral estabelece limites em relação a convênios e repasses de recursos. Isso impõe uma trava na gestão e na administração pública”, completou. Para Toffoli, a longa campanha eleitoral também acaba favorecendo políticos que estão no poder: “O extenso tempo de televisão que presidente Dilma teve durante seis semanas foi bastante útil para que ela conseguisse manter musculatura nas pesquisas e depois retomar o crescimento”. Leia a entrevista.

Quais são as propostas do senhor para reduzir o tempo de campanha eleitoral? Hoje temos três meses de campanha oficial, o que me parece ser um longo tempo. O Brasil para. E não para apenas durante os três meses oficiais de campanha porque tem a pré-campanha e o período pós-eleitoral. Defendo a redução pela metade, como acontece em muitos países, como na França. Em vez de três meses, um mês e meio de campanha. Se houver segundo turno, duas semanas entre as votações. Inclusive, os próprios candidatos não aguentam mais. Estão visivelmente cansados. Também proponho passar de seis para três semanas o período de propaganda eleitoral gratuita. Todos os índices nos mostram que a audiência cai enormemente. O horário eleitoral está entregando para a Rede Globo uma audiência de 4% após o Jornal Hoje. Quem estava assistindo? Ninguém. As pessoas têm outras opções com canal a cabo e a internet.

Atualmente, o candidato que tenta a reeleição é beneficiado pelo uso da máquina administrativa, já que fica em evidência por muito mais tempo. Com metade do tempo de campanha, a desvantagem dos demais adversários não é maior? Do ponto de vista teórico, isso parece ser factível. Mas, se nós olharmos a história das nossas eleições e, especificamente, a deste ano, verificamos que esse longo tempo fez com que a Dilma conseguisse se recuperar nas pesquisas de um momento em que esteve em situação muito pior do que está chegando às vésperas da eleição. Aquele background que ela tinha lhe favorecia ou lhe prejudicava? Talvez o extenso tempo de televisão que a presidente Dilma teve durante seis semanas foi bastante útil para que ela conseguisse manter musculatura nas pesquisas e depois retomar o crescimento. O candidato à reeleição tem todo o bônus de ter visibilidade, com atenção especial da imprensa, só que ele também tem os ônus do que deixou de fazer, das críticas, das denúncias. Todo esse passado não é só positivo, também tem o passado daquilo que não foi feito e daquilo que fez errado. Talvez uma campanha muito longa como essa, em vez de facilitar a oposição, acaba facilitando que aquele que está no poder consiga mostrar só o seu lado positivo.

Quais os benefícios de uma campanha mais curta? O país não fica parado por tanto tempo. O Congresso já parou durante as convenções partidárias, em junho. O Brasil não pode ficar parado entre cinco e seis meses a cada quatro anos. A lei eleitoral estabelece limites em relação a convênios e repasses de recursos. Isso impõe uma trava na gestão e na administração pública. Ao mesmo tempo em que serve para proteger a eleição do abuso do uso político do cargo, na outra ponta, quem sofre com isso é o cidadão, à medida em que os projetos ficam parados. Além disso, as eleições estão ficando muito caras. No momento em que o Brasil se redemocratizou, havia aquela ideia de que o povo brasileiro tinha de ter uma democracia, de debater e auxiliar a cidadania. Para isso, criou-se um longo tempo de campanha. Essa já é a sétima eleição presidencial e as eleições estão ficando caras. De uma eleição presidencial para outra, praticamente 70%, 80% a mais de recursos são arrecadados e gastos pelas candidaturas. Há uma influência do poder econômico muito grande, as candidaturas são financiadas por grandes empresas..

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Como reduzir os gastos eleitorais? Uma ideia que se consolida é a questão relativa à participação de empresas e de pessoas jurídicas no financiamento das campanhas. No Brasil, não há sequer um limite de gastos para cada campanha. Estive em conversas com representantes de organizações internacionais mostrando as parciais da prestação de contas e eles ficaram chocados. Questionaram: ‘Como uma única empresa doa 50 milhões de dólares para uma campanha ou várias?’. Outros compararam nosso sistema a um cassino e ressaltaram que é óbvio que há algum interesse por trás das doações. Não é caridade eu só querer ajudar determinada ideologia ou política. Atualmente, quem estabelece o teto de gastos é o próprio candidato. Então, obviamente, ele faz um cálculo que tenha uma flexibilidade. Na França, por exemplo, o limite para uma eleição presidencial é de 15 milhões de euros. No Brasil, não há nenhum limite porque o próprio partido se autolimita.

Por que cortar efeitos especiais dos programas eleitorais? Isso não faria com que o eleitor perdesse ainda mais o interesse em assistir as propagandas? Eu defendo um formato sem tanta pirotecnia e mais focado no debate. Hoje, o marqueteiro passa a ser fundamental. Não está em avaliação quem é o melhor candidato. Às vezes, quem tem o melhor marqueteiro consegue uma imagem tal para, de uma maneira criativa, vender um produto. Ou seja: o político passa a ser um produto, e não um projeto, um programa. Então a ideia é limitar o tempo, mas também o uso dessas tecnologias. O candidato tem de mostrar a sua competência, o seu trabalho e as suas propostas. Talvez um formato de debate seja interessante. Nele, cria-se uma dialética onde as pessoas podem ver os candidatos comparativamente e analisando-os nas suas discussões.

Nesse caso, o tempo de televisão disponível para cada partido também teria de ser alterado. Sim. Penso que, da mesma forma em que é possível diminuir os tempos das campanhas, é possível ter um tempo mais igualitário. Nós assistimos no primeiro turno a campanha da Dilma com onze minutos e a da Marina Silva com dois. Há uma desproporção muito grande dentro das regras do jogo atual. Penso que isso tem que ter um equilíbrio também maior.

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O tempo da propaganda eleitoral é calculado com base no tamanho da bancada dos partidos na Câmara dos Deputados. O senhor defende um novo parâmetro? Ainda não pensei em um formato concreto. Hoje se tem uma distribuição por tempo, com um terço repartido igualitariamente para todos, e dois terços são divididos de acordo com a bancada. Nesses dois terços, entram as coligações. Ou seja: o tempo de televisão de uma coligação passa a valer muito. A pré-campanha vira um período de grande negociação e de grandes acordos, que muitas vezes passam por cargos, questões que talvez não sejam as melhores possíveis. Então é um formato de se fazer política que nós temos de repensar.

A legislação eleitoral está ultrapassada? O nosso sistema eleitoral dificulta a governabilidade. Ele foi útil no passado, é um modelo que vem da da década de 1930 e que ficou. Mas parece que hoje já não é atual. Também não adianta a Justiça pensar e colocar uma camisa de força na política. O que nós temos de fazer é provocar esse debate para a sociedade e os políticos se convencerem disso. As coligações, por exemplo, merecem questionamento. Hoje, se um partido conseguir eleger um deputado, ele passa a ter acesso ao Fundo Partidário e a maior tempo de televisão. Então, a cláusula de barreira é uma coisa que temos de voltar a discutir. Temos muitos partidos com um ou dois parlamentares, se tivesse a cláusula de barreira não teríamos esses partidos. Se não tivessem as coligações muito provavelmente esses partidos jamais chegariam ao quociente para fazer uma cadeira.

O senhor defende a alteração da legislação para criminalizar o caixa dois? Como essa questão se trata de uma proposta num contexto de uma campanha específica, prefiro não comentar. Eu acho que mais importante do que criminalizar as práticas é impedi-las. Então vamos já impedir que as empresas que possam contribuir e estabelecer um teto de gastos. E talvez uma pena melhor do que cadeia é a perda do mandato. É a melhor pena que podemos aplicar.

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Essas são as primeiras eleições com a aplicação da Lei da Ficha Limpa e houve muitos questionamentos judiciais. A lei também precisa de atualizações? Três candidatos a governador tiveram de renunciar por causa da nova lei. O que ela precisa é de ter uma redação melhor, porque muitos dispositivos não são claros, o que não dá objetividade para o julgador. Muitas vezes o cidadão pode não entender porque um candidato foi considerado inelegível e o outro não. A redação deixa algumas áreas em branco e o julgador tem de preencher esse vazio. O ideal seria que a lei fosse mais objetiva. Muita gente acha que Lei da Ficha Limpa tornou as regras mais rigorosas. Isso porque antes precisava do trânsito em julgado e agora basta uma decisão colegiada. Por outro lado, do ponto de vista de conteúdo, ela não foi tão fechada em relação às possibilidades.

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