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Mudança em regra de MG rebaixou risco da barragem em Brumadinho

Deliberação Normativa assinada pelo atual secretário de Meio Ambiente mineiro, Germano Vieira, permitiu à Vale acelerar licenciamento para aumentar produção

Por João Pedroso de Campos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Julia Braun Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 30 jul 2020, 19h56 - Publicado em 28 jan 2019, 18h27

A ampliação das atividades mineradoras da Vale na mina Córrego do Feijão, na qual uma barragem com rejeitos se rompeu e deixou ao menos 60 mortos, em Brumadinho (MG), foi favorecida pela mudança em uma regra do governo de Minas Gerais em dezembro de 2017, na gestão do ex-governador Fernando Pimentel (PT).

Assinada pelo atual secretário de Meio Ambiente mineiro, Germano Luiz Gomes Vieira, único remanescente da gestão Pimentel na de Romeu Zema (Novo), a Deliberação Normativa 217/2017 alterou parâmetros de risco que fizeram o projeto da Vale passar do mais alto grau de potencial de degradação ambiental, o de classe 6, para um menor, o de classe 4, e ser acelerado.

Se tivesse continuado no nível mais alto, cada uma das três licenças necessárias (prévia, de instalação e de operação) representaria uma etapa, no chamado Licenciamento Ambiental Trifásico (LAT), mais demorado, ou, na melhor das hipóteses, seriam analisadas em duas partes, na categoria mais lenta do Licenciamento Ambiental Concomitante (LAC), o LAC2.

Com o risco reduzido e fora dos chamados “critérios locacionais de enquadramento” previstos pela Deliberação Normativa, o projeto da Vale pôde ter as licenças analisadas de uma só vez pelo governo mineiro, na modalidade mais rápida do licenciamento concomitante, o LAC1.  A proposta foi votada em uma reunião extraordinária – e tensa – da Câmara de Atividades Minerárias (CMI) do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam), em 11 de dezembro de 2018. Com dez votos favoráveis, um contrário e uma abstenção, o projeto foi aprovado, seguindo parecer do governo.

A ampliação prevê um salto na produção de ferro na área de 10,6 milhões de toneladas de minério de ferro para 17 milhões de toneladas até 2032. O projeto foi analisado junto da proposta para aumento da produção na mina de Jangada, da Minerações Brasileiras Reunidas (MBR), em Brumadinho e Serzedo (MG).

Onze dias antes, em 30 de novembro, o pedido da Vale havia aparecido na pauta da reunião da CMI como de classe 6, mas com pedido para que as licenças fossem analisadas de uma só vez, no LAC1. A ambientalista Maria Teresa Corujo, conselheira do Fórum Nacional da Sociedade Civil nos Comitês de Bacias Hidrográficas (Fonasc), pediu vistas em função da incompatibilidade do nível de potencial de poluição com o tipo de licenciamento.

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Antes que a sessão fosse suspensa, contudo, o chefe da Superintendência de Projetos Prioritários (Suppri) da Secretaria do Meio Ambiente, Rodrigo Ribas, argumentou que houve um erro no lançamento da pauta e que, com a Deliberação Normativa 217/2017, “os processos de mineração foram todos ligeiramente alterados”. “A unidade de tratamento de minério da Vale é a seco, então, não incide classe 6 sobre ele; ele é classe 4. Na capa do Parecer Único está como classe 4, correto, no processo é tratado como classe 4, após a orientação para a DN [Deliberação Normativa] 217. Então, é só na publicação da pauta que saiu como classe 6”, explicou.

Na reunião extraordinária convocada para 11 de dezembro, ao votar contra o projeto solitariamente, a ambientalista disse ser “abominável que tenhamos hoje esse empreendimento como classe 4, quando sempre foi classe 6” e que a questão estava sendo tratada de maneira “muito grave, muito criminosa e muito preocupante”. “Isso é gravíssimo porque, na realidade, são de grande porte e grande potencial degradador”, afirmou Maria Teresa Corujo. Para ela, o parecer da Suppri sobre o empreendimento estava repleto de “de questões inverídicas, omitindo informações que estão dentro do próprio processo”.

Durante a discussão, o superintendente Rodrigo Ribas chegou a chamar de “extremamente desagradável”, “irresponsável, vil e cruel” a forma como sua equipe foi tratada pelos representantes da sociedade civil que criticaram o projeto de expansão das atividades na região. “Nós somos funcionários públicos, nós servimos à sociedade. Atualmente, nos últimos dois anos e pouquinho, nós temos servido à sociedade com os salários parcelados”, disse.

“Houve uma necessidade urgente de garantir que o processo fosse licenciado com as três licenças no dia 11 de dezembro. Achamos na época que a Vale estava preocupada com a continuidade de Jangada e Feijão porque ia ter mudança de governo e Romeu Zema poderia mudar o secretário”, diz Maria Teresa a VEJA. Rodrigo Ribas, por sua vez, afirma que “havia um processo de impacto positivo a médio e longo prazo que foi instruído com estudos de impacto ambiental. A equipe avaliou todos os estudos e não deixou passar nenhuma informação”.

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Autor do voto em abstenção, Júlio César Dutra Grillo, representante do Ibama, ponderou que o projeto da Vale tinha “novidades positivas”, como o chamado “descomissionamento”, isto é, encerramento em condições de segurança e preservação ambiental, da barragem que acabou rompendo. Ela estava desativada desde 2015. Ele citou, contudo, a possibilidade de ruptura e desastre.

“Casa Branca [distrito de Brumadinho] tem algumas barragens acima de sua cabeça. Muita gente aqui citou o problema de Mariana, de Fundão, e vocês têm um problema similar. E ali é o seguinte, essas barragens não oferecem risco zero. Em uma negligência qualquer de quem está à frente de um sistema de gestão de risco, aquilo rompe. Se essa barragem ficar abandonada alguns anos, não for descomissionada, ela rompe, e isso são 10 milhões metros cúbicos, é um quarto do que saiu de Fundão, inviabiliza Casa Branca e inviabiliza ao menos uma das captações do Paraopeba”, declarou.

Rodrigo Ribas diz que o processo de licitação para reaproveitamento dos rejeitos de minério de ferro nas barragens seria um “processo de impacto positivo na mineração”. “É uma pena que não tenha dado tempo de fazer esse descomissionamento. Se tivesse dado tempo, nós teríamos licenciado a retirada da barragem”, lamenta.

Ainda de acordo com Ribas, a licença para ampliação das atividades ainda não foi entregue à empresa e, por isso, as obras ainda não tinham sido iniciadas antes do rompimento da barragem na sexta.

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