Em depoimento à Justiça Federal na sexta-feira passada, o ex-executivo da JBS e veterinário, Flávio Cassou, preso em março na Operação Carne Fraca, contou que pagava há quatro anos uma mesada de 20.000 reais para o ex-superintendente do Ministério da Agricultura no Paraná, Daniel Gonçalves Filho. O mensalinho, segundo Cassou disse ao juiz Marcos Josegrei, da 14ª Vara Federal, servia para que ele escolhesse pessoalmente quais fiscais do governo atuariam dentro das unidades da JBS no Paraná, fazendo vista grossa na vigilância sanitária e agilizando licenças.
Cassou também confessou que pagava propina para a chefe do Serviço de Inspeção de Produtos de Origem Animal do Ministério da Agricultura, no Paraná, Maria do Rócio Nascimento. Segundo ele, a propina, só para essa quadrilha, somava 60.000 por mês. Em seu depoimento, Cassou assegura ainda que tanto Gonçalves quanto Maria do Rócio – ambos também presos – comentavam quando faziam cobrança que parte desse dinheiro era destinada a políticos do PMDB do Paraná. Mas ele não mencionou nomes.
A quebra do sigilo bancário de Cassou feita pela Justiça revelou que ele tinha em conta corrente 4 milhões de reais, valor que acabou sendo sequestrado por falta de justificativa. Os advogados do ex-executivo negam essa acusação. Dizem que reconhecem na conta do cliente pouco mais de 250 mil reais, que estão bloqueados.
A Operação Carne Fraca já tem a lista dos políticos do PMDB e PP que recebiam propina da JBS, entre eles o deputado federal Osmar Serraglio (PR), que era ministro da Justiça na época em que a operação foi deflagrada. Em gravações telefônicas interceptadas pela PF durante a investigação, foi flagrada uma conversa de Serraglio com Gonçalves na qual o superintendente chamava o parlamentar de “grande chefe”. Gonçalves fechou delação premiada e relata em depoimentos detalhes da participação de Serraglio no esquema da Carne Fraca. Ele conta, por exemplo, como Serraglio e outros acusados com foro privilegiado recebiam dinheiro vivo de propina da JBS. Segundo a PF, um caderno de anotações apreendido com Cassou também prova os pagamentos, que eram feitos quase sempre em dinheiro dentro das unidades da JBS. A defesa de Serraglio nega as acusações e diz que o ex-ministro não interferia no trabalho dos fiscais.
A delação de Gonçalves é uma das peças mais extensas da operação. Ele deu mais de 20 depoimentos de 12 horas de duração ao delegado federal Maurício Moscardi, coordenador da Carne Fraca. A delação está no Supremo Tribunal Federal (STF) à espera de homologação.
Em nota encaminhada a VEJA, o deputado Osmar Serraglio diz que é muito triste ser vítima de injúria. “Não conheço, nunca tive contato com Flavio Cassou e sequer sei onde ele trabalha (…) Da mesma forma, nunca tive contato com qualquer diretor ou funcionário da JBS”, diz o parlamentar. “Não recebi, nem autorizei ninguém a receber qualquer valor ilícito em meu nome”, finaliza.
O depoimento de Cassou ao juiz começou às 16 horas da sexta-feira, durou mais de quatro e se estendeu pela noite. Como foi beneficiado pelo acordo de leniência assinado entre a JBS e a Justiça Federal, ele é obrigado a revelar tudo o que sabe sobre a organização criminosa da qual fazia parte, caso queira ter benefícios como progressão para o regime semiaberto com uso de tornozeleira e redução de pena. Cassou está preso na Carceragem da Polícia Federal em Curitiba, assim como Maria do Rócio e Gonçalves. Com as revelações que fez na Justiça, ele espera não ficar preso até o fim do ano, e assim, escapar de comer no xilindró o tradicional peru de Natal e panetone que são servidos aos presos nas festas de fim de ano.