A arquitetura da palavra arquiteto
Niemeyer em foto de Bernardo Gutiérrez/Folhapress A morte de Oscar Niemeyer privou a arquitetura brasileira do maior de seus carpinteiros-chefes – palavra composta que é a tradução literal do termo grego arkhitékton, matriz de nosso o vocábulo arquiteto (após uma quase indefectível tabelinha com o latim, claro). Carpinteiro-chefe? Se o sentido original parece modesto e […]
A morte de Oscar Niemeyer privou a arquitetura brasileira do maior de seus carpinteiros-chefes – palavra composta que é a tradução literal do termo grego arkhitékton, matriz de nosso o vocábulo arquiteto (após uma quase indefectível tabelinha com o latim, claro).
Carpinteiro-chefe? Se o sentido original parece modesto e braçal demais para dar conta da complexidade do saber de um profissional de arquitetura, basta esmiuçar um pouco a etimologia do termo grego para perceber que não é bem assim.
O elemento arkhi era carregado de grande prestígio: arkhés era o que vinha em primeiro lugar, o que se situava na origem e no comando, ideia da qual emanavam palavras ligadas ao poder (arkhon era o magistrado supremo da Grécia antiga) e à gênese das coisas (arkhaiología era o que nome sugere, “arqueologia”). Na era moderna, “arqui” acabou por se tornar o que o Houaiss chama de “verdadeiro morfema prefixal hiperbolizante ou superlativizante”, ou seja, assumiu papel semelhante ao de “super”. Arquiinimigo é só um exemplo.
Sob o segundo elemento da palavra, tékton, “carpinteiro”, percebe-se a ideia de tékhnes, que era tanto uma técnica quanto uma arte – a de fabricar, dar forma ao que antes não existia – e uma palavra com raízes indo-europeias imemoriais (tek-, “fazer”) que tinha parentes no sânscrito e no antigo persa, entre outros idiomas.
Para se avaliar o prestígio dos arquitetos da antiguidade, basta mencionar que no latim tornou-se uma espécie de lugar-comum retórico a expressão architectus omnibus, isto é, “arquiteto de todas as coisas”. Queria dizer Deus.