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Assim não, Gaspari! As ruas nem redimem nem condenam o impossível

Colunista vê uma tentativa de anistia parlamentar e/ou judiciária. Não diz como seria feita porque simplesmente inexistem caminhos para isso

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 15 mar 2017, 06h45 - Publicado em 15 mar 2017, 04h22

Elio Gaspari escreve um texto na Folha de hoje que requer uma explicação — no caso, é ele quem tem de explicar, não eu. E também desenvolve uma tese que é, para dizer pouco, polêmica. Começo por esta.

Escreve ele: “Só a rua salva a operação Lava Jato da pizza”. Bem, no Brasil e no mundo, a rua já salvou e já danou, não é mesmo? Se a gente diz que “só a rua” é capaz de operar alguma coisa, o que se faz é ignorar as instituições.

Como fiz a defesa enfática do impeachment e apoiei as manifestações públicas, um dia alguém me perguntou numa entrevista: “E se o Congresso recusar o impedimento de Dilma?”. Dei a resposta que devem dar as pessoas que aceitam os pressupostos da democracia: respeite-se o resultado!

Ir à rua, obedecendo às regras da democracia, em favor disso ou daquilo é do jogo. Não aceitar a decisão do colegiado a quem cabe… decidir, bem, aí já se trata de delinquência política.

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Assim, por óbvio, não existe, no regime democrático, o “só a rua pode”. As instituições podem. Os cidadãos pressionam. Bem, esse, claro, é o ponto de vista de um direitista liberal. E gostaria que alguém me dissesse se há algo na minha convicção que agride a doutrina…

Triplo salto carpado argumentativo
Escreve Gaspari:
A grande pizza começa a ser assada fabricando-se um tipo de anistia parlamentar e/ou judiciária para o caixa dois. Em seguida as propinas virarão caixa dois e estamos conversados.”

Há impropriedades diferentes e combinadas no trecho. E é nesse ponto que ele nos deve, a seus leitores, uma explicação.

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O Artigo 1º do Código Penal traz de forma cristalina:
“Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.”

Ganha uma daquelas bolsas de estudo que Gaspari costuma distribuir quem disser qual é o artigo do Código Penal que trata do “crime de caixa dois” e qual é a “cominação legal”.

Ninguém leva o galardão. Acho, sim, que é preciso criar o “crime de caixa dois”. Há que se votar uma lei para isso. Mas, como é sabido, leis penais só podem retroagir para beneficiar pessoas, nunca para punir.

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Atenção! Não existe “anistia judiciária”. Segundo o Inciso VIII do Artigo 48 da Constituição, a concessão de anistia, de qualquer uma, é uma prerrogativa do Congresso, do Poder Legislativo, com a sanção do presidente da República. Assim, sob nenhuma hipótese, um juiz anistia alguém. O que a Justiça faz é aplicar a decisão.

E aí Gaspari emenda:
“Em seguida, as propinas virarão caixa dois e estamos conversados”.

Não! Não virarão! Como é que isso poderia ser posto em lei, Gaspari? Não há caminho jurídico para isso. O que muitos defendem é o inverso: o caixa dois, que crime não é, só poderá ser considerado “propina” ou “lavagem de dinheiro” se o Ministério Público Federal produzir a prova de que esses outros crimes foram cometidos.

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Uma das coisas que me incomodam no alinhamento automático da imprensa com a Lava Jato (não me refiro a Gaspari em particular; se achasse, diria) é essa fabricação de falsas evidências. Que o colunista não me responda, mas responda a si mesmo: quem poderá impedir o Ministério Público de denunciar alguém por corrupção (propina) se a dita-cuja aconteceu?

Finalmente, noto que Gaspari mandou muito mal no caso do financiamento de campanha e do voto em lista. Pode até ajudar as ruas, mas não colabora com os fatos. Eu sou radicalmente contrário às duas coisas. Defendo a doação de empresas a campanhas e quero voto distrital.

Mas o jornalista deveria dizer, então, quem põe o guizo no pescoço do gato já para 2018. Quem vai dar a cara a tapa e liderar a luta pelo financiamento de empresas? Não só isso. Ainda que possível fosse, haveria empresas para doar depois do tsunami? Não creio.

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Ora, se financiamento de empresas não haverá, então tem de ser público. Só para 2018, defendo eu. Essa modalidade, parece-me, traz junto o voto em lista. Ou se fará o quê? Distribuir “x” reais para cada candidato a deputado do partido Y fazer a própria campanha? Não faz sentido!

E, bem, a minha boa proposta é a seguinte: que se comece agora um estudo profundo, incluindo especialistas em lavagem de dinheiro, caixa dois e coisas do gênero para elaborar um projeto de reabilitação da doação de empresas, mas em novos moldes. E, obviamente, em vez do voto proporcional ou em lista, instituir-se-ia o voto distrital.

Em suma:
– não existe proposta nenhuma de anistia do caixa dois porque já não é crime;
não existe proposta nenhuma para chamar propina de caixa dois;
o Judiciário não pode conceder anistia;
sem doação de empresas e sem fundo público, a eleição continuaria à mercê do crime organizado;
ninguém se mostra com coragem de resgatar as doações privadas para 2018;
se a doação for pública, a única coisa que faz sentido é o voto em lista.

E eu repudio as duas coisas. Mas o modelo em vigor é ainda mais perigoso.

Nota: é verdade que Gaspari fala em “um tipo de anistia”… Bem, é um jeito de deixar claro que anistia não é, e ele sabe disso. A química, por exemplo, não aceitaria essa imprecisão. O carvão jamais será considerado “um tipo de diamante”. Ou o contrário.

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