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Demócritos e Heráclitos (por Gaudêncio Torquato)

Que saudades dos homens e mulheres, simples nos costumes e firmes nas crenças, cultivavam a solidariedade

Por Gaudêncio Torquato
Atualizado em 30 jul 2020, 19h07 - Publicado em 1 mar 2020, 10h00

Demócrito e Heráclito, dois grandes filósofos, tinham concepções diferentes sobre a condição humana. O primeiro, arrogante e zombeteiro, ridicularizava a vida e o homem. O segundo tinha compaixão pelo ser humano, aparecendo sempre com semblante entristecido e os olhos marejados.

Pois bem, nos últimos tempos, a índole de Demócrito tem baixado sobre nossas plagas, impondo posições extremadas e desferindo flechadas entre grupos. Os valores do Homem são desprezados. O clima é de emboscada. Ânimos acirrados, guerra de expressões, divisão social, resultando na expansão da distância entre território, País e Nação.

Expliquemos. O território é o porte continental que abriga belezas e riquezas naturais. Não tem alma, é um diamante bruto. Lapidado por leis, códigos, habitado por pessoas e governado por representantes legitimados pelo voto popular, o território adquire status de País.

Mas a Nação continua distante. Pois é um ente com alma, direitos, deveres e seus atributos: civismo, solidariedade, justiça, desenvolvimento, liberdade, democracia, autoridade, cultura, soberania, cidadania.

O que vemos na paisagem? Milhões de brasileiros encolhidos como conchas em rochedos entre tempestades e fu­racões. É o desemprego em massa; são doenças antigas e novas que trazem medo; é a autoridade máxima convocando o povo a atirar pedras nas instituições; são as Forças Armadas em silêncio, em vez de proclamar a crença na democracia; são xingamentos contínuos contra meios de comunicação e jornalistas.

A esperança vira um pontinho aceso nos céus.

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O clima de faroeste transpira violência, com estranhas armas (empilhadeiras, por exemplo) e cowboys exibindo cartucheiras e selo de milicianos na testa. Onde já se viu motim de policiais?

E assim, a poeira tórrida do território obnubila o civismo, esse sonho que permanece na consciência dos homens de bem.

O país se entrega a Demócritos, mas a maior carência é de Heráclitos.

Quem ouviu um grito de “Viva o Congres­so”? Ora, é ali que se sustenta a democracia. Quem acha que os impostos e tributos estão diminuindo? O que se ouve é uma voz cavernosa pedindo a ressurreição de malfadada CPMF. A obsoleta legislação trabalhista até foi mudada, mas há quem a queira de volta.

A violência diminui? O Ceará parece um abatedouro de pessoas. Alguém acha que professo­res e alunos estão satisfeitos com o ensino ou com a gestão de um ministro que só azucrina com suas extravagâncias? Que felizar­do encontra uma bandeira brasileira para adquirir antes da bandeira de time de futebol? Quem acha que o PIBF – Produto Interno Bruto da Felicidade – está crescendo?

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O tom do mundo, escreveu Montesquieu em Meus Pensamentos, consiste muito em falar de bagatelas como se fossem coisas sérias e de coisas sérias como se fossem bagatelas. Quantas autoridades não fazem essa inversão com pitadas de riso, embora os tempos sejam de dor e angústia? Muita gente debocha de coisas sérias da política, inclusive pessoas estreladas.

Será que o interesse comum é só uma abstração? Que saudades dos tempos em que homens e mulheres, simples nos costumes e firmes nas crenças, cultivavam a solidariedade, a benção paternal, o amor filial, o respeito aos mais velhos, a vida descomplicada que se levava com certa doçura. E hoje? Baixou o signo do medo e da amargura.

 

Gaudêncio Torquato é jornalista, professor titular da USP e consultor político 

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