Chacoalhando o bambual
É compreensível que a nação tenha decidido pela renovação, ainda que diante de cardápio magro de boas opções.
Em janeiro próximo, muito provavelmente algum colunista importante vai escrever artigo já avisando no título que 2018 é ano que não acabou. É triste e previsível. Para analistas tropicais, o ano nunca acaba. Sempre fica em aberto.
Talvez seja porque o Brasil nunca conseguiu mesmo ser uma nação completa. Jamais chegou a ser obra acabada ou pelo menos bem definida que nos desse alguma estabilidade sobre o que somos, onde estamos e (principalmente) para onde vamos.
Provavelmente, esta maneira de ser contribua decisivamente para a nossa perpetua miopia. Miopia que, combinada com a crônica falta de memoria que nos assola desde sempre, vira matéria explosiva.
A gente fala, debate, xinga, se irrita. Perde amigos, deixa de falar com parentes, dedica horas nas mídias sociais para, no fim, abraçar gostosamente soluções simplistas e que já sabemos, não funcionarão.
Consumimos anos com dúvidas que não deveriam existir alimentando crises desnecessárias através da aceitação de valores e condutas inaceitáveis. Até o ponto em que as escolhas razoáveis desaparecem e sobram somente opções (ou melhor, alternativas) ruins.
Faz tempo que não perseguimos melhorias. Basta piorar menos e a gente acha suficiente. Nossos sonhos se tornaram pequenos, mesquinhos, limitados, estreitos mesmo. E o horizonte sempre fechado.
Dizem que nunca se mente tanto como antes da guerra, depois de pescaria e durante eleições. Como pescar não é para qualquer um, e a gente nunca foi mesmo muito de guerra, a gente foi economizando mentiras para gatar durante a eleição. E haja mentira. Ou para parecer moderno, “fake news”.
Engana-se quem acha que a população não percebe tanta mentira. O brasileiro já desenvolveu vacina contra isso. Acreditamos em mais nada. Sabemos que verdade é algo que não escorrerá da boca de nossos políticos. Por boa razão e excelente medida, viramos cínicos.
É compreensível que a nação tenha decidido pela renovação, ainda que diante de cardápio magro de boas opções. Chacoalharam o bambual para espantar macaco velho. Agora é tolerar o final do campeonato de arremesso de lama que a gente insiste em chamar de campanha política. Não dá mesmo mais para aturar as mesmas caras.
Agora, cabe ao cidadão e contribuinte trancar a bolsa da viúva para que os macacos novos não se revelem velhacos. Exercitar cidadania é não ficar apalermado nos anos que separam eleições.
Com sorte, dessa vez a gente aprende a fritar o peixe olhando o gato. Sonhando alto, talvez até aprofundar a renovação e vitaminar as instituições. Democracia é assim. Dá trabalho.
No fundo, a qualidade do político não importa muito. O que vale é a disposição do cidadão em controlar o governante. Mas isso nunca tivemos. E como faz falta.
Elton Simões mora no Canadá. É President and Chair of the Board do ADR Institute of BC; e Board Director no ADR Institute of Canada. É árbitro, mediador e diretor não-executivo, formado em direito e administração de empresas, com MBA no INSEAD e Mestrado em Resolução de Conflitos na University of Victoria. E-mail: esimoes@uvic.ca .