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‘O futuro do livro não está em jogo’, diz editor sobre crise no mercado

Fechamento de livrarias e pedido de recuperação judicial da Livraria Cultura sugerem que segmento não vai se recuperar tão cedo, mas há esperança

Por Meire Kusumoto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 8 nov 2018, 10h24 - Publicado em 8 nov 2018, 09h43

O último mês assustou os amantes dos livros. Em um período de menos de duas semanas, a Fnac fechou as portas de sua última unidade no Brasil, em Goiânia, a Livraria Cultura, que havia comprado as operações da rede francesa por aqui em 2017, entrou com pedido de recuperação judicial, aceita pela Justiça poucos dias depois, e a Saraiva, maior rede de livrarias do país, fechou vinte lojas. Em situação complicada já há cerca de quatro anos, o mercado editorial viu nas últimas movimentações o marco da crise, que fez o setor encolher 21% entre 2015 e 2018, segundo levantamento da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). O panorama, preocupante, sugere que a recuperação do mercado não vai se dar tão cedo, como também acreditam profissionais do segmento. “A indústria está sofrida e precisando de ajuda, vai levar algum tempo para ela se recuperar. Mas o futuro do livro não está em jogo”, diz Marcos da Veiga Pereira, sócio da Sextante e presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel).

Diante desse cenário, o leitor pode esperar que editoras se mantenham cautelosas, com um número menor de lançamentos e aposta em títulos comercialmente mais fortes. A avaliação é de Mauro Palermo, diretor da Globo Livros, que prepara para 2019 o primeiro volume do que será uma trilogia de Laurentino Gomes sobre a escravidão no Brasil. Um novo livro-reportagem do escritor paranaense é uma aposta certeira: sua tríade anterior sobre a história do país, composta por 1808, 1822 e 1889, junto com seu livro autoajuda O Caminho do Peregrino, todos lançados pela Globo Livros, venderam mais de 2,5 milhões de exemplares.

Mesmo antes das últimas notícias, as editoras já vinham fazendo ajustes para lidar com a crise, com redução do número de lançamentos e demissões. A Globo, por exemplo, precisou dispensar cerca de 15% de seu quadro de funcionários desde 2015. Já a Sextante demitiu 10% de seus empregados em julho. Ao mesmo tempo em que promoviam essas mudanças, as casas editoriais mantinham esperança de melhora em 2018. O ano começou com crescimento das vendas em relação a 2017, o que indicava uma possível recuperação do setor: de acordo com pesquisa realizada pela Nielsen e divulgada pelo Snel, o volume de livros comercializados no país cresceu 5,7% no período de janeiro a setembro, em comparação com o ano passado, o que representa aumento de 9,33% em faturamento.

“A indústria está sofrida e precisando de ajuda, vai levar algum tempo para ela se recuperar. Mas o futuro do livro não está em jogo”

Marcos da Veiga Pereira, presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel)

Esse aquecimento do mercado, porém, foi repassado apenas parcialmente às editoras. Isso porque tanto Saraiva quanto Cultura, que representam, juntas, cerca de 40% do faturamento de algumas casas editoriais, não estavam conseguindo honrar seus pagamentos. A dívida da Cultura é de aproximadamente 285 milhões de reais — 92 milhões somente com fornecedores diretos. Esses valores, agora, entram no plano de recuperação judicial que a empresa deve apresentar. Já a Saraiva anunciou para as editoras em março que não conseguiria acertar os pagamentos devidos, que somavam cerca de 120 milhões de reais, e renegociou a dívida, comprometendo-se a pagar entre outubro e dezembro. No mês que passou, no entanto, a rede voltou a suspender os pagamentos, somando a isso uma mudança de sistema que paralisou parcialmente suas atividades.

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Marcos da Veiga Pereira reitera que as editoras mantêm o apoio às duas redes, mas diz que o mercado está machucado. “O esforço financeiro que as editoras terão que fazer para dar conta disso é bastante relevante”, diz. “O que a gente tem conversado com a Saraiva e vai conversar com a Cultura é que a gente tem um limite de crédito. O meu caixa não é sem fundo. Detestaria a situação de não ter meus livros nas duas lojas, mas preciso de um esforço deles também.” Nesta quarta-feira, a diretoria do Snel se reuniu e definiu uma proposta de curto prazo para o pagamento das dívidas das redes, que será enviada aos CEOs das livrarias Cultura e Saraiva. As editoras associadas ao sindicato também devem se reunir em assembleia no dia 22 de novembro para discutir o andamento das negociações.

Como chegamos até aqui?

Segundo avaliação dos editores, a crise no segmento foi provocada por uma conjuntura de fatores, que começa na recessão que atingiu o Brasil a partir de 2014 — mesmo ano em que o governo federal interrompeu a compra de livros de literatura para bibliotecas e escolas públicas, o que desestabilizou todo o mercado —, mas evidencia ainda outras questões, de caráter mais permanente, do setor. Uma delas, sempre citada por profissionais da área, é o preço dos títulos, que não tem acompanhado a inflação. “Fizemos uma aposta, como indústria, de que barateando conseguiríamos atrair um púbico maior, o que foi verdade até 2010 ou 2011”, diz o presidente do Snel. “A gente não conseguiu reposicionar os preços e isso acabou impactando as livrarias, que têm seus custos de operação aumentados sem que sua receita cresça.”

O projeto de expansão das duas maiores redes também é citado pelo editor como um fator dessa conjuntura. A Saraiva comprou a rede Siciliano por 60 milhões de reais em 2008, enquanto a Cultura recebeu aportes do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em 2011 e 2013 e investiu em novas lojas e contratação de profissionais. O problema foi que a crise econômica brasileira bateu e o país não teve o crescimento esperado, obrigando as redes a interromper esse projeto de expansão e a lidar com dívidas contraídas nesse período.

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Somada a isso, está a migração de parte das vendas que antes aconteciam em lojas físicas para o comércio eletrônico – e-commerce representa 30% da receita da Cultura, por exemplo, como contou o CEO da empresa, Sergio Herz, a VEJA –, o que leva ao esvaziamento e, possivelmente, ao déficit dos pontos físicos. Na internet, apelos como a beleza e organização da loja, a disposição dos livros e a indicação de vendedores não existem, como acontece nas livrarias. Por isso, um dos únicos pontos de comparação entre uma loja e outra passa a ser o preço do título. Chega como cereja do bolo lojas virtuais como Amazon e Submarino, donas de frequentes ofertas de livros físicos, entregues confortavelmente na casa do leitor. “Como consumidor, acho ótimo uma promoção. Mas os descontos exagerados foram, aos poucos, corroendo as margens das livrarias”, afirma Mauro Palermo.

E o autor?

Responsáveis pela primeira etapa da produção de um livro, os autores também foram afetados pela crise do setor. Por causa da redução de lançamentos, alguns estão demorando mais a conseguir colocar suas obras nas prateleiras e outros, que vivem da cadeia de publicação de livros – ao traduzir, escrever orelhas e participar de eventos e feiras literárias, por exemplo – tiveram menos trabalho desde que a recessão bateu. “Toda a engrenagem diminuiu”, diz a agente literária Lucia Riff. “Se antes os escritores entregavam um livro e as editoras publicavam em doze meses, agora demora dezoito ou até mais.”

Luiz Ruffato, por exemplo, percebeu a diminuição do número de feiras literárias e do cachê oferecido aos autores por esses eventos. O escritor de Eles Eram Muitos Cavalos tem a percepção de que atualmente o país tenha de 50 a 60% do número de eventos que havia em 2014. “Agora a organização oferece metade do cachê que disponibilizava antes da crise, isso quando não pede que você participe de graça.”

Em relação a direitos autorais, parece não ter havido mudança substancial com a recessão. São raros os escritores brasileiros que conseguem viver exclusivamente da venda de seus livros – paga-se, em média, apenas 10% do preço de capa aos autores. “Quando recebo o acerto das editoras a cada três meses, eu ganho 4.000 reais por meus catorze títulos, o que seria 1.200 por mês, que não paga nem meu plano de saúde”, conta Adriana Falcão, cujo trabalho principal, que efetivamente paga suas contas, é como roteirista da Rede Globo. Atrasos de pagamento por parte das editoras aos autores foram até percebidos, mas pontualmente. Lucia Riff afirma que isso já acontecia mesmo antes da crise abater o segmento e estava mais relacionado à gestão de cada casa editorial.

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