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Blog de notícias exclusivas e opinião nas áreas de política, direitos humanos e meio ambiente. Jornalista desde 2000, Matheus Leitão é vencedor de prêmios como Esso e Vladimir Herzog
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Bolsonaro faz a pior política externa do Brasil, diz embaixador

Roberto Abdenur, que chefiou as embaixadas em Pequim e Washington, avalia que presidente está errando com os dois países

Por Matheus Leitão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 ago 2020, 14h34 - Publicado em 4 ago 2020, 10h09

O embaixador Roberto Abdenur, que comandou as representações diplomáticas do Brasil tanto em Pequim quanto em Washington, avalia que todos os movimentos feitos pela diplomacia até agora são perigosos. “Estamos numa posição delicada, no meio de uma queda de braço entre Estados Unidos e China”. Em longa entrevista à coluna, ele destaca os pontos delicados da política externa bolsonarista, que coloca o Brasil em dois perigos maiores ao mesmo tempo: a dificuldade de relação com um possível governo do democrata Joe Biden, e os conflitos com a China, maior parceiro comercial do Brasil.

Quando fala de uma queda de braço, Abdenur se refere, de um lado, às pressões de Donald Trump para que o presidente Jair Bolsonaro não abra espaço para a Huawei, que tenta entrar na disputa para fornecer equipamentos e tecnologia 5G ao país. Recentemente, o embaixador americano no Brasil, Todd Chapman, afirmou que se a empresa chinesa encontrar abertura aqui, haverá consequências – uma clara ameaça. Por outro lado, na avaliação do diplomata, o Brasil pode perder o espaço já conquistado na China em relação às exportações, sendo substituído por outros parceiros, num movimento de reação às (muitas) declarações contra o país asiático por integrantes do governo, inclusive do presidente Jair Bolsonaro. Entenda aqui.

“Eu acho que a China não ficará imóvel se nós continuarmos a dar sinais negativos em direção a ela e, mais concretamente, se rejeitarmos a Huawei [na disputa do 5G]. A China valoriza o Brasil, a China depende do Brasil para sua segurança alimentar. Não haverá nenhuma ruptura, mas haverá uma perda de força. A China pode optar por outros fornecedores de alguns dos produtos da nossa exportação para lá, como carnes, soja, açúcar, celulose, etc. Haverá outros países em condições de supri-la, se não totalmente, pelo menos em parte. Seguramente haverá uma retranca chinesa em relação a investimentos no Brasil”, enfatizou.

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Abdenur estava em Pequim em 1989 quando houve o terrível episódio de Tiananmen, a repressão aos estudantes na Praça da Paz Celestial. Foi peça importante para sustentar o acordo entre Brasil e China para a produção conjunta de satélites artificiais, entre 1989 e 1994, e, posteriormente, estimular a relação econômica entre os dois países durante o governo Itamar Franco. Quando foi para Washington, anos depois, manteve uma posição crítica em relação ao governo do PT e foi retirado da embaixada, em 2006.

Hoje ele está aposentado e vê com muita preocupação a maneira como o Brasil vem se colocando entre as potências americana e chinesa. Por isso, defende a serenidade. “Justamente por causa dessa complexidade, da delicadeza, das pressões que esses assuntos envolvem, o Brasil precisa ter uma posição serena, fria, realista, pragmática, não ideológica, de equidistância, entre os Estados Unidos e a China”, analisou.

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O experiente embaixador define o atual modelo da política externa brasileira como “absurdo” e destaca que a diplomacia do Brasil vive seu pior momento da história. “É o pior, o mais difícil momento e nós estamos nos colocando numa situação ainda mais equivocada, dada essa atitude pró-americana, pró-Trump e antichinesa, que o governo brasileiro está expressando. É a pior das situações possíveis, é o pior dos mundos”.

Abdenur avalia ainda que qualquer que seja o resultado das eleições nos Estados Unidos, o conflito entre o país norte-americano e a China vai continuar, já que Biden, candidato democrata à presidência, também tem tido uma posição dura em relação ao país asiático. Mas o governo Bolsonaro comete, na verdade, outro erro na relação com o presidente Donald Trump, que almeja a reeleição. 

“Bolsonaro se coloca escandalosamente numa posição de subserviência. E me preocupa muito a associação excessiva com a pessoa do Trump. Ele se coloca obviamente, claramente, escandalosamente, em uma posição de admirador, de seguidor do Trump. Em outras palavras, uma posição subalterna, de subserviência em relação ao presidente americano, o que, naturalmente, não cai bem junto aos democratas”, afirma o diplomata. 

“No mundo nós só temos hoje três países e meio como amigos. Três países: Israel, Hungria, Polônia, regimes de extrema direita – no caso de Hungria e Polônia já nem são mais propriamente democracias, e meio Estados Unidos, o de Trump”. Além desses três países e meio, o embaixador acrescenta a monarquia totalitária da Arábia Saudita. E registra que o país não faz qualquer movimento em relação à África. Ignora totalmente o continente em mais um erro diplomático.

Em relação aos Estados Unidos, o diplomata diz “meio país” porque o Brasil está abrindo um fosso com os democratas. “Já há uma primeira atitude dura: a manifestação de mais de 20 deputados democratas contra avanços nos entendimentos comerciais com o Brasil”, lembra.

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Com Biden, a situação será diferente e Bolsonaro sofrerá certamente pressões em relação a algumas bandeiras, como a ambiental e a de direitos humanos. “Biden dá mais importância à questão ambiental, à Amazônia, aos direitos humanos, à democracia. O Brasil, portanto, corre o risco, seguramente, de ter relações difíceis, complicadas com os Estados Unidos. Estaremos sob pressão, sob cobrança de resultados em diferentes áreas”, ressaltou.

Nesse aspecto, o embaixador também reforça o que já sabemos: que a política ambiental está nos levando a um confronto direto com investidores. “Há uma pressão espontânea das sociedades democráticas na Europa e também nos Estados Unidos na questão ambiental. A política regressiva, negacionista do governo em relação à Amazônia, em relação às queimadas, em relação aos índios, em relação à mudança climática, está sendo objeto de cobranças duras por parte de grandes fundos de investimentos internacionais, de grandes grupos empresariais, industriais, e estamos começando a sofrer boicotes espontâneos dos consumidores europeus desses produtos”, diz o Roberto Abdenur. 

Segundo o embaixador, supermercados na Suécia e em outros países não estão mais vendendo produtos brasileiros sob alegação de que o brasileiro destrói a Amazônia. “Nós estamos correndo o risco de perder investimentos por parte das democracias ocidentais, e por parte da China, por conta de todos os ataques, que hoje não nos incomoda”. 

O diplomata lembra que a principal voz do clã Bolsonaro em assuntos internacionais é o deputado Eduardo, filho 03. “Ele foi, por assim dizer, nomeado representante na América do Sul do movimento de extrema direita, conduzido agora na Europa por Steven Bannon, ex-guru do Donald Trump, que montou o chamado ‘The Moviment’. O objetivo é estimular e completar movimentos de partidos políticos contra a União Europeia, contra a integração europeia, e, por extensão, contra as próprias democracias do bloco”. Ou seja, para Roberto Abdenur, trata-se de mais uma aposta diplomática arriscada que o Brasil decidiu colocar à mesa.

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