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A variante indiana chegou ao Brasil: devemos nos preocupar?

A mutação pode ter uma capacidade de transmissão 50% maior em relação à cepa inglesa. O país precisa urgentemente adotar medidas para minimizar a difusão

Por Salmo Raskin
Atualizado em 26 Maio 2021, 15h39 - Publicado em 26 Maio 2021, 11h37

Variantes da sequência original do coronavírus tem surgido a todo momento, e isto é esperado. Uma parte da população já está imune, estamos nos defendendo do vírus com isolamento social e vacinação e o vírus começa a entender que está perdendo a batalha. Erros no processo de divisão do RNA do SARS-CoV-2 acontecem em uma linhagem a cada 15 dias, e evolutivamente ele tem que fazer algo para sobreviver.

Então muda seu material genético para tentar ser menos reconhecido pelas nossas defesas, pelas vacinas e pelos medicamentos como anticorpos monoclonais, e para infectar de modo mais eficiente já que estamos nos escondendo dele. Muitas variantes que se formaram a partir da original já estão extintas, outras passaram por flutuações de frequência e outras aumentaram ou diminuíram rapidamente suas frequências.

A linhagem Indiana do coronavirus, denominada B.1.617, foi detectada pela primeira vez em outubro de 2020. A cepa, que já está presente em mais de 50 países, chegou ao Brasil nesta semana. Assim como as variantes da Inglaterra, África do Sul e Brasileira P1, a variante Indiana já é considerada pela OMS desde 10/5/2011 como uma VOC (Variant of Concern, Variante de Preocupação).

CARACTERÍSTICAS GENÉTICAS DA VARIANTE INDIANA

Quando comparamos a sequência genética da variante Indiana com a sequência da variante original de Wuhan, na China, observamos que a Indiana tem várias mutações em sequências que codificam para a proteína Spike, principal responsável pela entrada do vírus em nossas células, incluindo as mutações G142D e E154K, sendo duas delas na parte mais importante da Spike (L452R e E484Q) e uma em um ponto crucial para a infectividade do SARS-CoV-2, o sítio de clivagem polibásico para a Furina (P681R). Nenhuma destas mutações é totalmente nova e desconhecida, mas a combinação das mutações encontradas na variante Indiana a torna única, tanto quanto cada uma das outras três VOCs.

Dados mais detalhados sobre as características e posição das mutações presentes nesta variante, assim como a prevalência nos diversos países, podem ser acessados aqui.

VANTAGENS QUE A VARIANTE INDIANA CONFERE AO SARS-CoV-2

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A presença na variante indiana das mutações L452R e E484Q provavelmente ajuda o vírus a escapar de alguns anticorpos, e a presença da mutação P681R pode favorecer o aumento da capacidade de ligação do vírus com o receptor celular, contribuindo assim para que o vírus seja mais transmissível. Em sua busca por aperfeiçoamento evolutivo, SARS-CoV-2 produz variações que o tornam mais fraco, que mantem suas características, e algumas poucas que o tornam mais efetivo. Como ensinou Darwin, as do último grupo tendem a ter mais sucesso a prevalecer.

Uma das perguntas que os pesquisadores fazem neste momento, é qual delas prevalece em um ambiente no qual mais de uma está presente. O grande avanço na capacidade de rastreamento epidemiológico molecular das populações, associado a colaborações científicas internacionais, pela primeira vez permite que a resposta desta pergunta seja precisa. Por exemplo, já se pode afirmar que no Reino Unido a variante original de Wuhan foi substituída pela variante V1 Inglesa, que agora já está sendo substituída pela variante Indiana. A Inglaterra é o país que mais realiza este tipo de análise molecular, o que lhe dá grande vantagem na capacidade de se antecipar aos fatos e tomar medidas preventivas para minimizar os efeitos das variantes.

Ainda não existem evidências sobre o impacto da variante Indiana na evolução da infecção para casos mais graves ou no número de mortes. Até o momento há também poucos relatos de reinfecção pela variante, sugerindo que quem já se infectou deve estar protegido desta variante. Dados preliminares sugerem que a variante tenha um ganho de cerca de 50% na transmissão em relação a variante Inglesa, parte pelo escape de anticorpos, parte por aumento de capacidade de infecção propriamente dito. Dados de vigilância genômica da Índia, Inglaterra e Canadá sugerem alta transmissibilidade da variante B.1.617 e indicam presença de vantagem adaptativa altamente favorável a essa variante, mesmo sobre a variante que hoje predomina no Brasil (P1). Se isto se confirmar, a variante Indiana tende a se tornar a mais prevalente do Brasil.

IMPACTO DA VARIANTE INDIANA NA VACINAÇÃO

Um aspecto importante é que a eficácia das vacinas da Pfizer e Astrazeneca para a variante Indiana reduz em cerca de 20% após a primeira dose e aumenta com a segunda dose, o que sugere que o intervalo de 12 semanas entre doses, determinado no Brasil para a vacina da Pfizer, deva ser reavaliado, pois neste intervalo pode haver um risco maior de infecção por esta variante. No Reino Unido, por este motivo, o intervalo entre a primeira e a segunda dose para a vacina da Pfizer já foi reduzido de 12 semanas para 8 semanas. No Brasil a prevalência da variante Indiana neste momento parece ser ainda muito pequena, mas pela sua infectividade, talvez seja o caso de uma atitude preventiva neste sentido.

O QUE O BRASIL PRECISA FAZER PARA MINIMIZAR O IMPACTO DA VARIANTE INDIANA?

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O Brasil precisa urgentemente adotar uma série de medidas para tentar minimizar a difusão da variante Indiana em nosso território.

– Testar os viajantes, não só aqueles que vem da Índia, mas dos outros 50 países na qual a variante já foi identificada;
– Implementar sistema de quarentena para viajantes, como já foi feito naqueles que vieram de Wuhan;
– Testar em massa a população brasileira aonde se detecta uma pessoa com variante Indiana;
– Aumentar o investimento em monitoramento epidemiológico molecular;
– Reconsiderar o critério de espaçamento de intervalo da vacina Pfizer, reduzindo de 12 semanas para 8 semanas;
– Estimular cada vez mais o uso de máscaras e o isolamento social. Evitar aglomerações!
– Aumentar muito a velocidade de vacinação! Demoramos 4 meses para vacinar com duas doses 10% da população. Mantida esta velocidade demoraremos 36 meses (três anos) para vacinar os outros 90% restantes!

O QUE ESPERAR DE NOVAS VARIANTES DO SARS-COV-2?

A resposta para esta pergunta não é simples. Não podemos prever se o vírus se tornará mais ou menos virulento apenas com base na teoria da evolução. Isto porque a taxa de letalidade de SARS-CoV-2 não é tão alta o suficiente para que a seleção natural reduza efetivamente sua virulência. Lembrando que a transmissão da COVID-19 é feita também (e talvez principalmente) por pessoas que não apresentam sintomas ou que apresentam poucos sintomas. Se uma variante pode causar infecção sem sintomas ou leve e não matar, dificilmente haveria uma pressão evolutiva forte contra ela. Portanto a mortalidade do ser humano pela COVID-19 não representa uma força evolutiva tão forte contra o SARS-CoV-2. Se o vírus é muito infeccioso mais não tão letal, talvez com o passar do tempo prevaleçam variantes que causem doença menos severa. Mas e se novas mutações ocorrerem sobre estas variantes mais leves? Ou será que as VOCs, com o passar do tempo, vão acumular novas mutações que as enfraqueçam? Este acompanhanhamento epidemiológico molecular diário permite dizer que até o presente momento a diversidade genética da SARS-CoV-2 permanece baixa e a maioria das linhagens atualmente em circulação são provenientes de variantes intermediárias que se originaram de uma raiz única. Com tantas dúvidas, o tempo e o investimento em monitoramentro epidemiológico molecular é o que nos trarão estas respostas. Por enquanto, vacinar é preciso!!!!!

Letra de Médico - Salmo Raskin
(Gilberto Tadday/VEJA)
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