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Para recuperar público, Cirque du Soleil faz aposta na alta tecnologia

Com incursão no mundo dos óculos de realidade aumentada e outros recursos de ponta, o grupo corre o risco de perder sua alma

Por Luiz Paulo Souza Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 17 fev 2024, 08h00

Aqueles que primeiro se aventurarem na utilização do Vision Pro, os óculos de realidade aumentada recém-lançados pela Apple, terão, entre a leva inicial de aplicativos, uma versão inédita do documentário Cirque du Soleil — Outros Mundos. Produzido pelo cineasta James Cameron e lançado originalmente em 2013, apenas quatro anos depois de Avatar, foi considerado muito à frente de seu tempo, em virtude do uso do 3D, e não teve o sucesso esperado. Agora, o filme deve encontrar público entusiasmado, acostumado às chamadas “experiências imersivas”. O ousado movimento de parceria com a empresa da maçã simboliza um novo momento da companhia circense que reinventou a arte do picadeiro. O salto, agora, é feito de chips, de mãos dadas com as proezas das tecnologias de ponta.

A pirueta virtual foi a saída de renovação de uma trupe que só respira se puder estar um tantinho à frente dos outros. Além do lançamento do espetáculo filmado, há outras iniciativas. Há cinco meses, o Cirque du Soleil estreou no universo dos videogames. Dentro do espaço virtual do Roblox, apresentou um jogo em que é possível gerenciar um circo, como se fosse um SimCity de malabaristas e engolidores de fogo. A plataforma majoritariamente infantojuvenil é atalho para divulgar um novo show, Echo, em cartaz em Montreal, no Canadá. A empresa também prepara uma parceria com a start­­up Cosm, que anuncia a inauguração de estruturas em formas de cúpulas imensas — a exemplo da Sphere, em Las Vegas —, palco de experiências visuais multicoloridas.

DIGITAL - A lona do Soleil na plataforma de jogos Roblox: aproximação com público mais jovem
DIGITAL - A lona do Soleil na plataforma de jogos Roblox: aproximação com público mais jovem (./Divulgação)

Não poderia faltar, no movimento de evolução, um leque de truques atrelados à inteligência artificial (IA), porque assim caminha a humanidade. Os criadores do grupo garantem manter a sagrada conexão emocional com o público, apesar do uso das máquinas, que supostamente entregariam ideias frias. A tecnologia funcionaria apenas como ferramenta para acelerar algumas etapas, como a seleção de imagens de referência usadas nos estágios iniciais de desenvolvimento dos trabalhos artísticos.

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O Cirque du Soleil invade território já razoavelmente ocupado, e que não para de crescer. Nos últimos anos, a profusão de exposições imersivas inventou, por assim dizer, um estilo. Há de tudo: Michelangelo, Van Gogh, Picasso, Frida Kahlo e um imenso etc. É tendência que se espraia. O Museu do Amanhã, no Rio, conhecido pela avalanche de plataformas digitais muito bem pensadas em suas mostras, é termômetro do movimento. “Em 2023, tivemos o público médio mais alto da história do museu, inaugurado em 2015”, diz o diretor da instituição, João Falcão. “Percebemos que há espaço para mergulhar na arte e na tecnologia.”

REFERÊNCIA - A Sphere, em Las Vegas: cúpula é inspiração de startup parceira
REFERÊNCIA - A Sphere, em Las Vegas: cúpula é inspiração de startup parceira (Tayfun Coskun/Anadolu Agency/Getty Images)

O receio dos críticos — vale para o Cirque du Soleil, vale para os museus, vale para a vida — é que as produções em massa facilitadas pelos recursos digitais façam as exposições e apresentações perderem alma, incapazes de conversar com a plateia. Há um quê de razão nesse medo; basta comparar a sensação de contemplar o Davi de Michelangelo em Florença com a de estar diante de seu irmão de luzes e sons numa instalação dentro de um shopping center — embora se devam respeitar, por óbvio, as pessoas que se entusiasmam com a chance eletrônica, muitas vezes impossibilitadas de viajar para o exterior. Convém, contudo, deixar os temores de lado, porque a realidade é interessante. “Desde as pinturas rupestres nossa espécie lança mão de tecnologias para expressar suas perspectivas”, afirma Nuricel Villalonga Aguilera, membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e presidente da Alpha Lumen, ONG que ajuda jovens em vulnerabilidade social a desenvolver talentos. A adoção de novas ferramentas para a imaginação humana não é, compulsoriamente, sinônimo de pobreza criativa. “Não vejo conflito no uso da IA nas artes, mas há necessidade de discutir limites, estabelecendo critérios”, diz Aguilera.

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Selo Cirque

A TV não matou o cinema. O iPod e o Spotify não mataram a música. Os e-books não mataram os livros de papel. O Cirque du Soleil não enterrou o circo clássico, ainda que exigências positivas da sociedade tenham afastado o uso de animais, por exemplo, mudando a tradição do que se via debaixo de uma lona. Outra convicção: a IA não freará os efeitos impactantes do Soleil. “O digital e o manual são camadas de um mesmo processo”, diz Falcão, do Museu do Amanhã. “Um não existe sem o conhecimento adquirido do outro.” Senhoras e senhores, distinto público, o show deve — e vai — continuar.

Publicado em VEJA de 16 de fevereiro de 2024, edição nº 2880

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