Hipnos, o deus grego do sono, filho da deusa primitiva Nyx, a Noite, se enclausurava em uma caverna para que pudesse dormir tranquilo. Seu filho Morpheus, o deus dos sonhos, era o responsável por vigiar o repouso e impedir qualquer um que tentasse o acordar. Nesse mito antigo, a família de deuses juntava a observação dos povos sobre o que era intrinsecamente necessário para que os humanos pudessem gozar de uma noite de sossego. Passados mais de 2500 anos do surgimento das lendas gregas, entre os elementos “noite”, “sono” e “sonhos”, frente à modernidade, é possível dizer que um quarto deus é encaixado como essencial à dinâmica: o “onipresente” smartphone.
É o que mostra um estudo da consultoria Grupo Croma, que analisou o comportamento de 1400 brasileiros ao usarem seus celulares. Descobriu-se que na cama, antes de dormir e ao acordar, é a hora do dia mais frequente para o uso do aparelho. Momentos antes de cair no sono, 65% dos entrevistados afirmou estar com o smartphone em mãos. E, ao despertar, 50% tem como primeira atividade do dia checar as notificações que foram recebidas. Em ambos os momentos, o uso do WhatsApp é o hábito mais comum. A pesquisa também constatou que o aplicativo aparece na rotina dos consultados quando estavam comendo sozinhos (47%) e assistindo TV (45%).
Tal constatação acompanha o resultado de um outro estudo sobre o sono no Brasil. Segundo a organização americana National Sleep Foundation, que se dedica em analisar a qualidade de descanso em diversas nações, os brasileiros passam mais tempo conectados do que dormindo. Em 2019, a média diária de tempo na internet chegou a 9h29, já o tempo de sono foi de 7 horas. O WhatsApp, somado a outras redes sociais, se tornou o foco da atenção por 3h24.
Com esse diagnostico, vale retornar ao mito dos deuses. Na caverna em que Hipnos descansava corria o rio Lete, o “rio do esquecimento”, uma alegoria para a abstração causada pela sonolência e o destino de tudo que pudesse ficar para outra hora. Seria, em outras palavras, a dedicação plena ao momento de descanso. Nessa alegoria, revela-se, por assim dizer, uma possível orientação das lendas dos gregos antigos para onde deveria ir o smartphone na rotina do sono: para bem longe da cama, pois só assim seus usuários poderiam mergulhar no “rio do esquecimento” e recuperar as energias para o dia seguinte.