O diretor da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) Jarbas Barbosa afirmou em coletiva nesta quinta-feira, 28, que a imunização contra a dengue não será suficiente para bloquear a disseminação do vírus transmitido pelo mosquito Aedes aegypti na temporada atual e que estudos apontam que o controle da transmissão com a aplicação das doses demoraria ao menos oito anos. Barbosa, que é brasileiro, convocou a população das Américas a redobrar os cuidados para evitar a proliferação do mosquito em meio ao surto que afeta países da região.
Segundo a Opas, entre o início do ano e a última terça-feira, 26, foram registrados mais de 3,5 milhões de casos e mais de 1 mil mortes pela doença na região. “Isso é motivo de preocupação, pois representa três vezes mais casos do que os notificados no mesmo período do ano passado”, explicou o diretor da entidade. Em todo o ano passado, foram 4,5 milhões de notificações. A doença tem crescido em toda a América Latina e no Caribe, mas os registros estão concentrados no Brasil (83%), Paraguai (5,3%) e Argentina (3,7%), países que respondem por 92% dos casos e 87% das mortes.
De acordo com Barbosa, 21 países nas Américas têm notificação de circulação de mais de um sorotipo do vírus — são quatro ao todo –, o que tem feito a entidade intensificar as ações de treinamento de profissionais da saúde e medidas para difundir informação sobre a doença. “Provavelmente, esta será a pior temporada de dengue nas Américas e a população deve redobrar os cuidados”, disse.
Limitações da vacina
Sobre a vacina, o diretor da Opas alertou que o controle da doença não virá tão rápido. “É importante ressaltar que a vacina que está disponível é de duas doses e precisa de três meses de intervalo entre uma dose e outra. Não é para controlar neste momento. Há estudos que demonstram que só oito anos de vacinação teriam um impacto importante para a transmissão da dengue.” Além disso, há limitações da farmacêutica japonesa Takeda para a produção de mais doses.
“A grande ação seria a eliminação dos criadouros em casas, parques e comércios para a redução de mosquitos”, completa.
Ele informou que o Brasil é o país que mais utiliza o imunizante na região, seguido da Argentina, mas que, por ser uma vacina nova, deve ser aplicada em localidades com sistema de vigilância para registro de eventos adversos robusto. Isso é importante para verificar como a vacina vai se comportar “na vida real” e também com a circulação do sorotipo 3, que não estava presente quando os testes de fase 3 foram realizados.
“Há uma vacina objeto de estudo que já está em fase 3, do Instituto Butantan, que pode facilitar o uso por ser em dose única, mas só deve estar disponível no ano de 2025”, relembrou.
Surto de dengue
O Brasil enfrenta uma forte alta de casos de dengue desde as primeiras semanas de 2024 e o número de casos no país já ultrapassou os registros de todo o ano de 2023, quando foram contabilizados 1.658.816 casos e 1.094 mortes pela doença.
Até esta quarta-feira, 27, foram registrados 2.323.150 casos da doença e 831 mortes. Outros 1.269 óbitos estão em investigação. O número de notificações até o momento é o maior dos últimos dez anos.
“Apesar de a letalidade no Brasil estar abaixo de 0,05%, temos de fazer mais esforços para treinar profissionais sobre os primeiros sinais de alerta para baixar mais (esse índice)”, afirmou Barbosa.
No início de fevereiro, o ministério divulgou a estimativa de que o número de casos de dengue no país pode chegar a 4,2 milhões em 2024, índice que seria um recorde.
Vacina contra a dengue
O Distrito Federal e o estado de Goiás foram os primeiros a receber doses da vacina contra a dengue, dando início à campanha de imunização que, no momento, está concentrada na faixa dos 10 aos 14 anos de idade. Além dessas localidades, Acre, Amazonas, Bahia, Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Paraíba, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Roraima, Santa Catarina, São Paulo e Tocantins também receberão doses, que seriam distribuídas, inicialmente, a 521 municípios. Mais 154 foram incluídos na lista nesta quarta-feira, 27.
Eles foram selecionados por serem locais com mais de 100 mil habitantes que estão com predominância do sorotipo 2 da doença e tiveram números altos de notificações desde o ano passado. Também são pontos que registraram índices elevados de infecção nos últimos dez anos.
O grupo prioritário foi escolhido por ser o mais afetado por episódios que levam à internação.
Em outubro do ano passado, a OMS recomendou a vacinação contra a doença com foco principalmente em crianças e adolescentes de 6 a 16 anos em países endêmicos, caso do Brasil. Por aqui, o imunizante Qdenga, da farmacêutica japonesa Takeda, foi liberado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) meses antes, em março.
O Ministério da Saúde seguiu a recomendação da entidade e vai ofertar o imunizante para essa faixa etária. Com a medida, o Brasil se tornou o primeiro país a incluir a vacina no sistema público de saúde.
Reações adversas da vacina
O Ministério da Saúde apresentou esclarecimentos sobre uma nota técnica com dados sobre eventos adversos relacionados à vacina contra dengue, a Qdenga, incorporada no Programa Nacional de Imunizações (PNI) e aplicada no público de 10 a 14 anos.
Segundo o documento, entre as 365 mil doses aplicadas das redes pública e privada, foram relatadas 529 notificações, das quais 70 foram reações alérgicas, como hipersensibilidade e anafilaxia.
Os casos são considerados raros e especialistas recomendam que os pais continuem levando filhos a postos de vacinação para protegê-los contra infecção causada pelo mosquito Aedes aegypti.