A vacina é a principal esperança na luta contra o novo coronavírus. “Para voltar à anterior aparência de normalidade, o desenvolvimento de vacinas contra a SARS-CoV-2 é uma necessidade absoluta”, diz uma perspectiva publicada no final de maio na renomada revista Science.
Portanto, não é surpreendente que, em todo o mundo, a expectativa sobre quando ela estará disponível seja alta. Em uma velocidade inédita na ciência, menos de 1 ano após a descoberta do vírus, 192 vacinas estão em desenvolvimento, das quais 41 já estão na fase de testes em humanos e 11 na derradeira fase 3, que busca atestar sua eficácia e segurança em milhares de pessoas.
O avanço é tão rápido, ainda mais nesta reta final, que semanalmente são divulgadas novidades sobre o assunto e é fácil se perder na enxurrada de informações. Por isso VEJA, reuniu as principais dúvidas relacionadas à vacina neste momento. As resposta têm como base entrevistas com a pediatra Melissa Palmieri, especialista em vigilância em saúde pelo Ministério da Saúde e diretora da regional do Estado de São Paulo da Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim); Renato Kfouri, diretor da Sbim, e reportagens publicadas em VEJA sobre o assunto.
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Clique e AssineQuando uma vacina contra Covid-19 estará disponível? A expectativa é: em breve. Astrazeneca, Pfizer, Moderna e Sinovac esperam resultados preliminares sobre a eficácia da vacina entre outubro e dezembro. Além disso, a produção em massa já começou. Isso significa que, assim que houver comprovação de que o imunizante é capaz de prevenir a doença e for aprovado pelas agências regulatórias, já haverá doses disponíveis.
Por enquanto, o Brasil formalizou acordos de compra com a Astrazeneca e com a Sinovac Biotech. O acordo com a Astrazeneca prevê a compra de 100 milhões de doses, das quais cerca de 30 milhões chegarão ao país entre dezembro e janeiro e as demais, serão entregues no ano que vem se houver aprovação do produto. Além disso, haverá transferência de tecnologia para que a vacina possa ser produzida pela Fiocruz. Já o acordo com a chinesa Sinovac, assinado pelo governo do estado de São Paulo, prevê a compra de 60 milhões de doses – 46 milhões chegam ao país até dezembro e outras 14 milhões, em fevereiro – e a transferência de tecnologia para o Instituto Butantan.
Quem receberá a vacina primeiro? Atualmente, a demanda pela vacina é maior que a oferta, portanto, a vacinação deve começar pelos grupos de risco e, em seguida, ser expandida para a população em geral. De acordo com o Ministério da Saúde, assim que a vacina contra o coronavírus estiver aprovada e chegar ao país, as doses iniciais serão destinadas a idosos, pessoas com comorbidades, profissionais de saúde, professores, profissionais de segurança, indígenas, motoristas de transporte público e pessoas privadas de liberdade. A definição exata de quem poderá receber a vacina, porém, depende dos critérios aprovados pela Anvisa, que são baseados nos ensaios clínicos. Recentemente o governador de São Paulo, João Doria, afirmou que a vacinação no estado pode começar em 15 de novembro, em profissionais de saúde.
Após a vacina, vida normal? O início da vacinação da população representa a possibilidade de retorno à normalidade que conhecíamos, mas isso não será imediato. Dados sugerem que cerca de 90% da população é suscetível à Covid-19 e que é necessário que 60% a 70% da população esteja imune, seja como resultado de infecção natural ou da vacinação, para alcançar a famosa imunidade de rebanho). Isso corresponde a cerca de 146,6 milhões de pessoas e não há vacina suficiente para imunizar toda a população brasileira simultaneamente. Além disso, também vai depender de características específicas das vacinas, como eficácia da vacina na prevenção da doença, em evitar quadros graves como morte e hospitalização e impedir a transmissão. Portanto, por algum tempo ainda será necessário manter as regras que já conhecemos, incluindo uso de máscaras, higiene das mãos e distanciamento físico.
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Se houver mais de uma vacina, posso/devo tomar mais de uma? Especialistas afirmam que não há necessidade de tomar mais de uma vacina. Já que uma vacina será suficiente para conferir proteção. No entanto, se acontecer de posteriormente aparecer uma opção mais eficaz, a possibilidade de tomar também essa outra vacina fica a cargo do próprio paciente, que deverá discutir o assunto com um médico.
Já tive coronavírus, devo/posso me vacinar? Os estudos clínicos vão responder isso, mas especialistas acreditam que mesmo pessoas que já foram infectadas poderão se beneficiar da vacina. Primeiro porque ainda não se sabe quem teve a doença está totalmente protegido, segundo, porque em alguns casos a vacina promove uma imunidade melhor do que a infecção natural.
A vacina será 100% eficaz? Uma vacina 100% eficaz seria perfeita, mas isso não existe. Mesmo as vacinas mais eficazes existentes, como a da febre amarela, não atingiram esse nível. Especialistas consideram muito boa se a vacina contra coronavírus demonstrar 70% de eficácia. Mas as empresas por trás do desenvolvimento de vacinas definiram que seus imunizantes mostrar de 50% a 60% de eficácia, que é o mínimo exigido pela FDA, agência regulatória dos EUA, e pela Organização Mundial da Saúde (OMS) no caso desta vacina, especificamente. Especialistas acreditam que em um cenário pandêmico, essa eficácia já será suficiente para reduzir o fardo da doença.
Como e quando os cientistas saberão se a vacina é eficaz? Diversas empresas, incluindo Astrazeneca e Pfizer, esperam ter resultados, ao menos preliminares, sobre a eficácia da vacina nos próximos meses. Mas devido à forma como o estudo é conduzido, é difícil estimar um período determinado. Os estudos clínicos fase 3 buscam atestar a eficácia da vacina na vida real. Para isso, são selecionados milhares de voluntários que são divididos aleatoriamente em dois grupos: um recebe a vacina contra o coronavírus e o outro um placebo ou vacina controle.
Depois, é preciso esperar para ver quantas pessoas no estudo irão contrair a infecção. Se a vacina for eficaz, o número de participantes que receberam a vacina e testaram positivo para Covid-19 será significativamente menor do que o número de participantes do grupo controle. Ao aumentar o número de voluntários e realizar o estudo em países com alta taxa de transmissão da doença, aumenta a probabilidade destes resultados saírem mais rápido.
Será necessária apenas uma dose? Depende da vacina. A maioria das vacinas em fase 3 atualmente trabalha com um esquema de duas doses. O imunizante da Johnson & Johnson é o único que, no momento, tem a eficácia avaliada após apenas uma dose. A grande vantagem da estratégia de dose única é que isso aumenta a adesão à vacina e o número de pessoas que podem ser vacinadas com determinada quantidade de doses.
A vacina contra o coronavírus será como a vacina contra a gripe, que precisa ser tomada anualmente, ou mais parecida com a vacina contra sarampo, que pode exigir doses de reforço? Essa resposta ainda não existe. Estudos iniciais indicam que o SARS-CoV-2, nome oficial do novo coronavírus, não muda muito rapidamente – ao contrário do influenza, vírus causador da gripe. Então se uma vacina eficaz for desenvolvida, ela pode funcionar para sempre. Por outro lado, ainda não se sabe quanto tempo dura a imunidade a esse vírus. Se ela for passageira, podem ser necessárias injeções de reforço em algum momento.
A vacina é segura? A segurança é o primeiro item avaliado em uma vacina e é o único que continua a ser avaliado em todas as etapas de estudo clínico. Mas, a recente paralisação global do estudo da Astrazeneca levantou preocupações em relação à segurança das vacinas em desenvolvimento. Resultados dos estudos fase 1 mostram que os principais efeitos colaterais relatados nas candidatas que já estão na fase 3 são leves e passageiros, como febre, fadiga, dor de cabeça, dor no corpo e no local da injeção. Além disso, especialistas afirmam que pausas são perfeitamente normais em estudos clínicos – a grande diferença é que a gente não os acompanha tão de perto para saber disso – e garantem que um imunizante só será aprovado pelas agências regulatórias se houver confirmação não só da eficácia, mas em especial, da segurança.
Quanto custará uma vacina contra o coronavírus? Toda a produção inicial de vacinas, das mais diferentes empresas, já estão vendidas para governos e organizações internacionais que buscam garantir um acesso igualitário ao imunizante ao fornece-las para países subdesenvolvidos. Por isso, ainda não se sabe quanto a vacina custará para o consumidor final, por exemplo, nem quando essa opção estará disponível. Mas diversas empresas já divulgaram uma estimativa do preço. A americana Moderna, por exemplo, estima um valor de menos de 40 dólares (cerca de 225 reais) por dose para a maioria dos clientes. Aqui você pode ver o preço de outras vacinas.
Pandemia no Brasil
Nesta quinta-feira, 1, a média móvel de novas notificações da doença foi de 27.055,7 e a de novos óbitos de 696. A média móvel semanal é calculada a partir da soma do número de casos e mortes nos últimos sete dias, dividida por sete, número de dias do período contabilizado – o que permite uma melhor avaliação ao anular variações diárias no registro e envio de dados pelos órgãos públicos de saúde, problema que ocorre principalmente aos finais de semana.