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O brasileiro que previu pandemia de gripe A

Por Natalia Cuminale Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 24 Maio 2016, 16h39 - Publicado em 27 ago 2009, 18h24

Estudioso do comportamento da gripe, o geriatra João Toniolo Neto, diretor do projeto Vigilância Epidemiológica da Gripe (VigiGripe), da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), previu que uma pandemia de influenza ocorreria no início deste século, mais precisamente entre 2008 e 2017. Acertou. O estudo do especialista, que virou o livro A História da Gripe, baseou-se em estatísticas históricas para realizar o vaticínio.

Diante da chegada da gripe A (vírus H1N1), que no Brasil já fez mais de 500 vítimas, o médico consegue retirar uma conclusão positiva: enfim, autoridades de saúde e população reconheceram a periculosidade das gripes. Na entrevista a seguir, ele explica por que já esperava que a doença se espalharia pelo mundo e discute se, de fato, uma segunda onda do mal pode se alastrar, como previu a Organização Mundial de Saúde (OMS).

Em 2003, a OMS alertou para a possibilidade de uma pandemia de gripe até 2010. Na ocasião, o senhor chegou a declarar que estaríamos lidando com um novo vírus e uma nova epidemia. Como era possível prever isso?

Essa pandemia poderia ocorrer entre 2008 e 2017. Em 2001, no meu livro, inclui essa previsão, a partir de dados da minha tese acadêmica. Analisei números dos últimos cinco séculos e consegui identificar a ocorrência de três pandemias a cada cem anos. Em 1918, tivemos a gripe espanhola, em 1957, a asiática, e em 1968, a de Hong Kong. Então, em média, a cada 20 ou 40 anos, no máximo, contando todos os últimos séculos, há um surto pandêmico. Nunca se soube direito por que isso acontece, mas a explicação mais plausível é que o fenômeno esteja ligado aos ciclos, às gerações humanas. O vírus H1N1 circulou bastante no mundo até 1968, depois teve suas características alteradas. Então, passou a circular outro influenza, o H3N2. Assim, a geração que nasceu depois daquela época não teve contato com o H1N1 até ele se espalhar neste ano. Não se pode dizer que quem teve contato com o vírus adquiriu resistência a ele, mas, sim, criou uma memória imunológica: as células de defesa reconhecem o vírus como um vírus não estranho, então têm facilidade para criar uma resposta a ele. O fato de uma geração não manter contato com o vírus permite prever a pandemia. Isso sempre foi considerado uma hipótese, mas a OMS está assumindo como verdade.

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Isso justificaria o grande número de vítimas jovens da gripe A, ou seja, pessoas que nunca tiveram contato com o vírus?

As pessoas com mais de 40 anos não estão imunes à nova gripe, mas já tiveram um tipo de contato prévio, que faz com que os casos sejam menos graves do que entre os jovens. Se um vírus sazonal da gripe mata mais idosos por causa da baixa de imunidade desse grupo, não haveria motivo para que o H1N1, que é mais agressivo, causasse mais complicações em jovens do que em idosos.

A OMS disse que poderá ocorrer uma segunda onda da gripe A. Ela pode ser mais forte e matar mais gente?

É impossível saber. Ninguém consegue afirmar se este é um vírus que vai ter seu potencial de infectividade menor ou se é um vírus que sofrerá mutação, misturando-se, por exemplo, como o aviário (H5N1) e ficar ainda mais potente. É muito difícil prever. O grande problema é: nós sabemos como a gripe sazonal se comporta, mas não como a nova gripe poderá se desenvolver. A imprevisibilidade é a grande questão.

No caso da influenza sazonal, prioriza-se a vacinação dos idosos. E no caso da gripe A, quem serão os primeiros a receber as vacinas?

Existe um comitê da OMS que dá esse tipo de conselho consultivo. As prioridades em um caso de pandemia são: profissionais de saúde, porque eles não podem ser disseminadores da doença; mulheres grávidas, devido às complicações do estado delas; doentes crônicos e crianças. Em seguida, os demais grupos da população.

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O governo já disse que não pretende promover vacinação em massa, como ocorre na gripe comum. Isso pode ser um problema?

Não. Para utilizar a vacina pandêmica, é preciso certo critério. Não é possível, por exemplo, utilizá-la em massa. Além disso, não sabemos quantas doses vão ficar prontas e em quanto tempo.

Mais pessoas vão morrer por causa da gripe?

Sim. Mas é importante lembrar que demos sorte, uma vez que o vírus que provocou a pandemia foi o H1N1 e não o H5N1, da gripe aviária. Isso, sim, seria uma verdadeira tragédia. Foram registrados 480 casos de gripe aviária no mundo e morreram 262 pessoas, uma mortalidade de quase 60%.

Apesar do pânico provocado na população, o senhor acredita que a gripe pode ter trazido uma maior conscientização?

Assim que a pandemia se acalmar, tenho certeza de que muita gente deixará de morrer nos próximos anos. Isso porque as pessoas passam a respeitar a gripe como uma doença séria. No século passado, mais gente morreu vítima de gripe do que na I e na II Guerras Mundiais somadas. Nos últimos 25 anos, os números de vítimas de gripe e de Aids são semelhantes. Mas como trata-se de uma doença que ainda é confundida com resfriado há desatenção. Além disso, as vítimas morrem de complicações da gripe, então as estatísticas do mal são desconhecidas da população.

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Toda vez que a temperatura cai, as pessoas ficam preocupadas com a gripe. Essa preocupação faz sentido?

Sim, porque em temperaturas mais baixas aumenta o contato das pessoas, as aglomerações e também a quantidade de secreção. A temperatura mais baixa é mais propícia à transmissão do vírus. Por isso, existe preocupação para os próximos meses com o inverno europeu: o frio lá é maior. Eles tiveram mais tempo para se preparar para a gripe do que nós, mas a desvantagem deles é o rigor do inverno.

O inverno europeu pode trazer consequências para os brasileiros?

Depende, já que é um vírus globalizado. Se a pandemia ficar muito forte, o que eu não acredito, ela pode não respeitar a sazonalidade. Se ela explodir na Europa, pode não respeitar o verão dos outros países e podemos ter uma segunda onda simultânea em vários lugares.

Quais são as dicas para não deixar a imunidade enfraquecida?

Quem tem doença crônica, deve manter a medicação absolutamente controlada. Quem mantém atividade física e alimentação saudável, tem vantagens. Todas essas medidas parecem óbvias, mas fazem uma tremenda diferença nessa hora, pois acabam mantendo o organismo mais resistente.

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