Bastou um estudo observar o potencial dos extratos da Cannabis Sativa, planta da maconha, para o tratamento contra o novo coronavírus que a máxima apareceu: “A maconha pode impedir alguém de pegar a Covid-19”, afirmaram alguns artigos que viralizaram na internet. A realidade não é bem essa. Cientistas da Universidade Lethbridge, no Canadá, encontraram evidências de que os extratos podem fazer parte de um tratamento para prevenir a doença, mas ainda não há a certeza de que isso funcionará em seres humanos.
O estudo feito pelos canadenses foram realizados em laboratório – não em animais, mas utilizando modelos 3D de tecidos orais, das vias aéreas e intestinais de humanos – e não foram revisados por outros pesquisadores. Os próprios autores afirmam que ainda há a necessidade de mais pesquisas, em especial em humanos, para que se possa tirar conclusões sobre o assunto. “Claramente há um exagero na reação das pessoas”, disse Igor Kovalchuk, um dos líderes da pesquisa, em entrevista ao site Polictfact.
A proposta canadense identificou que seria possível inibir a entrada do vírus nas células com a utilização de 13 extratos da Cannabis sativa com altos níveis de canabidiol (CBD), uma das substâncias químicas encontradas na planta. O princípio ativo da maconha atuaria bloqueando o acesso do novo coronavírus à enzima ECA-2 (enzima conversora da angiotensina 2), que é a porta de entrada para que ele se ligue às células do corpo humano.
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Clique e Assine“É como se tivesse uma fechadura e você colocasse um chiclete, para impedir de colocar a chave”, explica Alexandre Barbosa, chefe da Infectologia da Universidade Estadual Paulista (UNESP) e do Hospital das Clínicas de Botucatu, no interior de São Paulo. Ele afirma que é necessário ter cuidado com o estudo por ele ser apenas “especulativo”.
“É um estudo em laboratório, não foi feito nenhum ensaio em seres humanos. É apenas uma especulação de que talvez se usar esse extrato em seres humanos, em um enxaguante bucal, pasta de dente, algo que você pode engolir, você pode bloquear os receptores das células quando o vírus tenta entrar. Não existem evidências científicas de que isso vai funcionar, é só uma possibilidade”, pondera.
Para o infectologista, é importante frisar que caso sejam comprovados os benefícios no tratamento em seres humanos, o cigarro de maconha não será uma forma de prevenção, já que não tem o nível de extrato suficiente para proteger o organismo.
Outra preocupação é com os efeitos colaterais. “Sabemos que o tetrahidrocanabinol (THC), o mais importante princípio ativo da maconha, tem uma série de efeitos psicoativos. O uso continuo do THC pode levar a exacerbação de psicoses e doenças psiquiátricas de base, então tem os eventos adversos que podem estar relacionados”, diz Barbosa.
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Portanto, ainda não se pode provar os benefícios da utilização da maconha para o tratamento da Covid-19. Em teoria, a substância pode funcionar como uma “terapia adjunta”, como ressalta o estudo do Canadá. Porém, ainda faltam estudos e testes em humanos para afirmar que poderia ser um solução para amenizar os efeitos da pandemia.