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Um teste de hospitalidade

Um incêndio criminoso e a reação das autoridades à crise migratória em Roraima escancaram a falta de uma política consistente para os refugiados no Brasil

Por Duda Teixeira Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 16 fev 2018, 06h00 - Publicado em 16 fev 2018, 06h00

Só neste ano, o Estado de Roraima já recebeu quase 18 000 venezuelanos, que escolheram morar no Brasil para fugir da fome, da falência do sistema de saúde, da criminalidade nas ruas e da repressão estatal. Na segunda-feira 12, o presidente Michel Temer resolveu ver a diáspora venezuelana mais de perto. Em Boa Vista, onde ficou por cerca de quatro horas, Temer prometeu aumentar os repasses federais para que Roraima possa lidar com a crise, falou em instalar um hospital de campanha, centros de triagem e reforçar a fronteira com a ajuda das Forças Armadas. Em seu discurso, deu uma no cravo e outra na ferradura, ao tratar os venezuelanos como “problema” e dizer que o Brasil não lhes fechará as fronteiras: “Os venezuelanos vão criar problemas para outros estados brasileiros se não tomarmos providências. Este é o aspecto principal. Precisamos preservar as fronteiras e os empregos dos brasileiros, mas não podemos deixar de receber os refugiados que vêm para cá em situação de miserabilidade absoluta”. Há meses o senador Romero Jucá, do MDB de Roraima, aliado de Temer, repete um discurso menos ambíguo. Jucá prega o fechamento das fronteiras e a “interiorização”, ou seja, um eufemismo para o envio de venezuelanos a outros estados brasileiros. Nenhuma palavra sobre como integrá-los à sociedade.

A diáspora venezuelana alcançou uma dimensão impossível de ser ­ignorada. Quase 60 000 pessoas deixam a Venezuela todos os meses rumo aos países vizinhos. A Colômbia recebe a maior parcela dos refugiados, mas o Brasil não fica muito atrás. Com os 18 000 que foram para Roraima só em 2018, essa onda humana já é comparável à dos desesperados que se lançavam ao Mar Mediterrâneo em botes infláveis e barcos rumo ao sul da Itália no auge da crise migratória europeia de 2015.

Na capital, Boa Vista, com 330 000 pessoas, vivem 40 000 venezuelanos, o equivalente a 12% da população. Em todo o estado, 17 000 solicitaram oficialmente refúgio ao governo brasileiro em 2017. Até agora, nenhum foi concedido. Muitos dormem em ginásios esportivos ou ao relento nas praças. De dia, pedem dinheiro e emprego nos semáforos com cartazes em espanhol. Com tudo isso, a chegada em massa de venezuelanos tem apresentado um teste para o Brasil, que se considera hospitaleiro, mas, na realidade, não vê como positiva a vinda de trabalhadores de países pobres que competem por empregos de baixa qualificação (veja a reportagem).

De tempos em tempos, a presença dessa massa de desamparados leva a reações agressivas por parte do restante da população. “Como quem mais anda de bicicleta na cidade são os venezuelanos, já vi até motoristas revoltados jogar o carro contra eles”, diz o juiz Oswaldo Ponce, refugiado político que toca harpa e violão em Boa Vista. No início de fevereiro, duas casas habitadas por venezuelanos foram incendiadas. O guianense Gordon Fow­ler foi detido em flagrante e acusado de tentativa de homicídio. Ele disse que teve um desentendimento com os venezuelanos e que acabou “tomando raiva” deles. Guiana e Venezuela têm um histórico conflituoso. No entanto, os venezuelanos de Roraima ouvidos por VEJA não têm dúvida de que o episódio é mais uma manifestação da xenofobia que enfrentam diariamente.

Publicado em VEJA de 21 de fevereiro de 2018, edição nº 2570

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