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O corrupto encarcerado

Derrotado no STF e com uma ordem de prisão expedida pelo juiz Moro, o ex-presidente Lula decide não se entregar à PF — mas seu destino é um só: a cadeia

Por Eduardo Gonçalves, Laryssa Borges, Hugo Marques e Gabriel Castro
Atualizado em 7 abr 2018, 06h01 - Publicado em 7 abr 2018, 06h00

A derrota do ex-presidente Lula no Supremo Tribunal Federal (STF) na madrugada de quinta-feira estava sendo encarada com relativa naturalidade. Por 6 votos a 5, os ministros rejeitaram o habeas-corpus preventivo, com base no qual o petista garantiria sua liberdade, e concordaram que o réu, já condenado em duas instâncias, podia ser preso. A defesa de Lula acreditava que ainda teria alguns dias até que a prisão fosse formalizada. Mas na quinta-feira, enquanto o petista e seus advogados discutiam os últimos recursos que poderiam impetrar para adiar a prisão, uma novidade os pegou de surpresa e mudou o curso das coisas: o juiz Sergio Moro anunciou que Lula tinha até as 17 horas de sexta-feira para se apresentar em Curitiba e começar a cumprir sua pena de doze anos e um mês de prisão. Daí em diante, as atenções se concentraram na sede do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC paulista, um prédio de quatro andares, onde Lula se recolheu na quinta e continuava até a noite de sexta-feira, quando VEJA fechou esta edição.

Em São Bernardo - Apoiadores de Lula defendem a “resistência” do petista na frente do Sindicato dos Metalúrgicos
Em São Bernardo – Apoiadores de Lula defendem a “resistência” do petista na frente do Sindicato dos Metalúrgicos (Caio Guatelli/VEJA)

A cronologia mostra a surpresa do ex-presidente e sua defesa diante da decisão de Moro. Às 17h30 de quinta-feira, o advogado Cristiano Zanin havia afirmado em entrevista coletiva que não via “risco nenhum de prisão” imediata do seu cliente — confiava que os chamados “embargos dos embargos” ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) poderiam adiar a medida. Menos de meia hora depois, Moro ordenou o recolhimento do petista. Antes disso, o PT convocara uma manifestação em desagravo ao líder, programada para as 18 horas da sexta-feira, em São Bernardo do Campo. Lula tinha confirmado presença. As expectativas ruíram com a decisão do juiz.

Assim que tomou conhecimento dela, Lula deixou o instituto que leva seu nome e seguiu para o sindicato, onde aliados começaram a pôr em prática a estratégia arquitetada há algum tempo para transformar a prisão do ex-­presidente em um ato político e midiático. A escolha do Sindicato dos Metalúrgicos como base da “resistência” não foi casual. Foi como presidente da instituição que ele foi preso em 1980, durante o regime militar. Agora, pretendia ser preso no local, de forma a reforçar o discurso de que foi vítima de uma “prisão política” e produzir imagens politicamente fortes: as da Polícia Federal entrando em seu berço político para prendê-lo na presença da multidão que o apoia.

Em Curitiba – Diante do prédio da Polícia Federal, manifestantes pedem a prisão do ex-presidente: “Lula, cadê você?” (Mauro Pimental/AFP)

Na Justiça, o último obstáculo para o encarceramento de Lula foi superado na madrugada de quinta-feira. Em sessão do STF que durou onze horas, os ministros decidiram que um condenado em segunda instância podia, sim, começar a cumprir pena imediatamente. A favor dessa tese, votaram os ministros Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Rosa Weber — essa última, dona do único voto que permanecia uma incógnita. Rosa Weber é, pessoalmente, contra a prisão antecipada, mas, como ressaltou em seu voto, recusou o habeas-corpus de Lula em respeito ao “princípio da colegialidade”. Ou seja: como o plenário do STF havia decidido aceitar a prisão antecipada em julgamento feito em 2016, a ministra entendeu que o colegiado tinha de ser respeitado. Os demais, que são contra a prisão antecipada, parecem estar contra o “princípio da colegialidade”.

Os cinco ministros que votaram a favor do habeas-corpus de Lula são os seguintes: Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e o decano Celso de Mello. Alguns deles são completamente contra a antecipação da pena, tal como Rosa Weber, porque entendem que a Constituição exige o trânsito em julgado para que alguém seja declarado culpado. Outros até aceitam uma solução intermediária: que a pena comece a ser cumprida depois de uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), uma espécie de terceira instância do Judiciário. Na sessão, Barroso inclusive fez um alerta: se a ideia é autorizar a prisão depois do STJ, que seja logo após a “primeira decisão terminativa” do tribunal. É uma forma de evitar a interposição interminável de recurso depois de recurso, até que o crime prescreva.

A última chance – Por 6 votos a 5, os ministros do STF negaram a Lula a concessão do habeas-corpus preventivo (Adriano Machado/Reuters)

Num dos momentos mais tensos da sessão, o ministro Gilmar Mendes, que era firmemente favorável à antecipação da pena em 2016, e agora é firmemente contra, denunciou as pressões sobre o STF, sobretudo da imprensa, a que chamou de “mídia opressiva”, que vem, segundo ele, chantageando os magistrados. Gilmar Mendes não disse nada sobre a pressão descabida provocada pelo comandante do Exército, Eduardo Villas Bôas, que na véspera postara uma mensagem em rede social dizendo que o Exército se alinhava ao lado dos que lutam “contra a impunidade”. Coube ao ministro Celso de Mello responder à pressão do general.

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Encerrada a sessão do STF, a defesa de Lula passou a discutir suas estratégias para adiar a prisão por alguns dias. Consumiu a quinta-feira em debates sobre o que fazer, até ser surpreendida pela decisão de Moro. Na sexta-­feira, recolhido à sede do sindicato dos metalúrgicos, Lula não anunciou se se entregaria ou não até as 17 horas. Deixou que o prazo estourasse, enquanto os militantes se reuniam em torno do sindicato e em outros pontos do país. Até a noite de sexta, houve manifestações em 24 estados e no Distrito Federal em favor da liberdade de Lula. Em cinco estados, também houve manifestações pela sua prisão.

Voto decisivo – Rosa Weber: fiel da balança, a ministra manteve incógnita sua opinião até o último minuto (Cristiano Mariz/.)

Na verdade, Lula não anunciou sua decisão porque a questão estava longe de ser um consenso. No sindicato, ouviu conselhos sobre o que fazer. Advogados sugeriram ao petista acatar a ordem de Moro, com o argumento de que qualquer coisa que parecesse insubordinação à determinação judicial poderia dificultar recursos futuros. Já amigos e parlamentares, como Lindbergh Farias e Gleisi Hoffmann, pediam “resistência”. Do lado de fora do sindicato, o clima era tenso. Nos carros de som, as palavras de ordem incluíam “Cadeia para Moro” e “Vamos transformar o país em um caldeirão”. Manifestantes lançaram ovos contra jornalistas e um carro da Bandnews teve os vidros quebrados. Na frente do Instituto Lula, ocorreu o incidente mais grave. Um manifestante anti-Lula xingou aos gritos o senador Lindbergh Farias e foi agredido a socos e pontapés por militantes da CUT e um ex-vereador do PT.

Até a noite de sexta-feira, integrantes da cúpula do PT e da Polícia Federal continuavam a negociar os termos para levar Lula à prisão. Quando se concluiu que nem a Polícia Federal iria até o sindicato prender Lula nem Lula iria até a sede da Polícia Federal se entregar, a possibilidade mais forte passou a ser que tudo se resolvesse no sábado. A ideia era que Lula se entregaria depois da missa pelo aniversário de sua mulher, Marisa Letícia, prevista para a manhã de sábado. Ao mesmo tempo que negociava com a polícia, a defesa do ex-­presidente entrou com um pedido de liminar no STF semelhante ao que já havia sido negado pelo STJ — para que Lula não seja preso antes do julgamento das ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs) que discutem a prisão após a condenação em segunda instância. Do lado de fora do sindicato, diante do racha entre advogados favoráveis à imediata apresentação de Lula à polícia e políticos que achavam que ele deveria se manter onde estava, um grupo de manifestantes passou a gritar: “Lula, não ouça seus advogados, ouça a militância!”.

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Publicado em VEJA de 11 de abril de 2018, edição nº 2577

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