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Não, nós não gostamos de apanhar!

Roraima reflete um problema nacional

Por Maria Laura Canineu
8 jul 2017, 06h00

“Mas, Maria Laura, tem mulher que gosta de apanhar”, disse uma empresária. Outro conhecido acrescentou: “São relacionamentos abusivos, as mulheres batem nos companheiros e acabam apanhando”. Esses comentários me chocaram. Foram feitos em resposta a uma recente pesquisa sobre violência doméstica em Roraima, estado com a maior taxa de homicídios de mulheres no país.

A pesquisa, na qual trabalhei, expôs as falhas do governo no enfrentamento da violência doméstica. Mas algumas pessoas parecem não perceber os inegáveis equívocos estatais e, em vez disso, minimizam a violência e culpam as mulheres. Notícia do século XXI: a agressão às mulheres continua bem real, assim como a decepcionante resposta do Estado. A culpa não é das mulheres.

Vejamos o caso de “Ana”, que sofreu ofensas e agressões de seu parceiro por oito anos. Em dezembro, ele a expulsou de casa e, no meio da rua, bateu em sua cabeça, no rosto e nos braços. Ele só parou quando um filho dela o afastou. A filha de Ana, de 13 anos, chamou a polícia, que não fez nada. “Apenas deixou um cartão.” Às 3 da manhã, as duas caminharam por uma hora até uma delegacia, onde escutaram que teriam de ir à delegacia da mulher para denunciar a agressão, apesar de ela estar fechada naquele dia. Só na semana seguinte Ana conseguiu registrar a ocorrência e pedir proteção.

É claro que algumas mulheres podem também agredir. Isso não tem absolutamente nada a ver com o sofrimento de milhares delas que sentem que não têm escolha senão suportar abusos, esconder hematomas e fingir que nada aconteceu.

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Mulheres sofrem violência por anos antes de procurar ajuda. Apenas 25% reportam a agressão. Podem sofrer pressão familiar para ficar com o parceiro. Podem se preocupar em como alimentar, vestir e abrigar seus filhos. O peso do estigma pode inibi-las de compartilhar suas experiências e traumas com a polícia. Muitas vezes, temem que o agressor faça valer suas ameaças, caso descubra que elas foram à polícia, sem que esta possa detê-lo.

Mas uma das principais razões para não reportarem a violência está na descrença de que isso fará diferença.

Quando se trata de violência contra a mulher, a impunidade é a regra. Encontramos cerca de 8 400 boletins de ocorrência de violência doméstica acumulados na delegacia da mulher em Boa Vista. A delegada-chefe disse que falta pessoal para tomar os “passos iniciais de investigação”, inclusive ouvir a vítima, que permitiria a instauração de inquérito. Roraima reflete um problema nacional.

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Temos uma legislação abrangente para prevenir a violência e garantir a justiça, e o Brasil participa de tratados que protegem os direitos das mulheres.

Infelizmente, muitos avanços continuam apenas no papel. Comentários que ouvi mostram que o machismo permanece vivo e permite a impunidade, tornando-­nos cúmplices. Para mudar, devemos reconhecer que as mulheres sofrem abusos cotidianamente e que a lei é insuficiente. Muitos casos não são registrados nem investigados, muito menos concluídos. Os homens que agridem sua companheira continuarão a fazê-lo enquanto permanecerem impunes.

Publicado em VEJA de 12 de julho de 2017, edição nº 2538

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