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Russomanno ganha apoio de Bolsonaro e vira aposta para enfraquecer Doria

O presidente quer transformar o candidato em prefeito de São Paulo e, de quebra, derrotar o tucano, seu possível rival em 2022

Por Edoardo Ghirotto, Daniel Haidar Atualizado em 25 set 2020, 12h47 - Publicado em 25 set 2020, 06h00

Na manhã de 25 de agosto, Jair Bolsonaro publicou em seu perfil no Twitter que não se envolveria nas eleições municipais porque a atividade lhe tomaria todo o tempo “num momento de pandemia e retomada da nossa economia”. A promessa não chegou a durar nem um mês. Com o objetivo de construir palanques para a reeleição em 2022, o presidente tem trabalhado nos bastidores a favor de algumas candidaturas, e o político que recebe atenção especial no momento é o deputado federal Celso Russomanno (Republicanos), um amigo de longa data e que está na terceira tentativa de se eleger prefeito de São Paulo. A estratégia do presidente é não trabalhar de forma explícita, pelo menos no primeiro turno, mas as digitais de sua atuação nos bastidores já são nítidas. Em um dos lances mais recentes, às vésperas do prazo final de oficialização das candidaturas, Bolsonaro ligou duas vezes para o deputado estadual Campos Machado (PTB-SP) para viabilizar a entrada do partido na coligação de Russomanno. O PTB, presidido por Roberto Jefferson, um dos condenados no mensalão, tor­nou-se um dos principais parceiros do capitão em Brasília. O acordo de última hora foi firmado e o ex-presidente da OAB-SP Marcos da Costa acabou indicado para ser o vice na chapa.

Apresentador da TV Record, Russomanno já dizia havia tempos pelos corredores da emissora que contaria com o apoio de Bolsonaro caso decidisse se lançar candidato. Era comum o deputado mostrar aos colegas de trabalho as piadas que o presidente lhe enviava pelo WhatsApp. Bolsonaro resolveu embarcar na empreitada de Russomanno após ser informado por aliados de que a escolha de um vice do MDB para o atual prefeito Bruno Covas (PSDB) confirmava uma aliança entre os partidos e o DEM para as eleições da presidência da Câmara dos Deputados, em 2021, e para o governo do estado e a Presidência da República em 2022. Dessa forma, mais do que qualquer outro pleito municipal, a disputa pela prefeitura de São Paulo ganhou ares de uma prévia do embate que acontecerá daqui a dois anos pelo Palácio do Planalto.

TUCANOS - João Doria e Bruno Covas: apoio do DEM e do MDB para a reeleição – (Ettore Chiereguini/AFP)

O governador João Doria (PSDB) não esconde nos bastidores a ambição de concorrer em 2022 e, por isso, entrou na linha de tiro do capitão. Na cabeça do presidente, derrotar Covas, que assumiu a prefeitura após Doria se mudar para o Palácio dos Bandeirantes, significa tirar o principal palanque do rival para a próxima eleição e, de quebra, carimbar nele o desconforto de ter perdido em seu próprio território. Em pesquisas mais recentes sobre a disputa em 2022, Doria nunca alcança dois dígitos de intenções de voto e teria hoje enorme dificuldade para chegar ao segundo turno. O governador acha que há tempo para uma virada, quando poderá demonstrar que teve uma gestão mais responsável do que a de Bolsonaro na pandemia (não é algo muito difícil na comparação com um presidente mundialmente famoso pela postura equivocada, mas é inegável que Doria se destacou nacionalmente no enfrentamento da doença). O tucano conta também com a confiança de que a recuperação econômica em São Paulo será mais rápida do que a do restante do país.

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No início da disputa municipal que serve de termômetro para 2022, o candidato de Doria largou atrás. Na primeira pesquisa Datafolha de intenções de voto, divulgada no dia 24, Russomanno ficou na dianteira, com 29%, seguido logo atrás por Covas, com 20%. O instituto constatou ainda que 64% dos paulistanos rejeitariam um candidato apoiado por Bolsonaro, enquanto 59% dizem reprovar alguém apoiado por Doria. Nacionalizar a disputa municipal, portanto, pode ser um tiro no pé para ambos. No caso do presidente, os riscos parecem maiores. “O pleito municipal nunca foi decisivo para a eleição do presidente seguinte”, afirma o cientista político Rubens Figueiredo. “Seria corrosivo para a imagem de Bolsonaro se ele entrar de cabeça na campanha do Russomanno em São Paulo e perder.”

PARCERIA - Flávio Bolsonaro e Marcos Pereira: novos amigos – (Beto Barata/Ag. Senado)

Não está certo como se dará a participação do presidente e de seus filhos na campanha de Russomanno. No último dia 19, o presidente deu uma mostra do que pode fazer. O deputado, que fez fama na televisão caprichando na demagogia na defesa dos direitos dos consumidores, gravou um vídeo em que isentava o capitão de culpa pela alta do preço do arroz. Bolsonaro gostou da gravação e a compartilhou em suas redes sociais, dizendo que aquela era “uma aula de humildade e conhecimento”. Daqui para a frente, espera-se que ele aumente o volume de ações do tipo.

O empurrão de um presidente com popularidade em alta é tido como fundamental para Russomanno livrar-se da síndrome de “cavalo paraguaio”. Nas disputas municipais de 2012 e 2016, ele largou na frente das pesquisas, como ocorre agora, mas terminou em terceiro lugar nas duas ocasiões. Para não repetir erros do passado, como as declarações desastradas que o tiraram do páreo, Russomanno vem adotando a política da boca fechada. Evita a imprensa (procurado por VEJA, não respondeu os pedidos de entrevista) e já sinalizou a executivos das emissoras de TV que não irá participar de debates no primeiro turno. No Republicanos, além da blindagem de Russomanno, uma das preocupações do momento com a campanha é o uso do dinheiro de fundo eleitoral, que o candidato afirma que irá rejeitar. “Vamos tentar convencê-lo a usar pelo menos o mínimo da verba disponível”, diz o deputado federal Marcos Pereira (SP), presidente da sigla.

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INDEFINIÇÃO - Marcelo Crivella: declarado inelegível pela Justiça Eleitoral – (Hermes de Paula/Agência O Globo)

Eleger o prefeito paulistano é uma etapa importante do plano de consolidação nacional traçado pelo Republicanos, criado sob forte influência da Igreja Universal. O partido conseguiu aumentar de 21 para 34 o número de deputados entre 2014 e 2020. No Legislativo, inclusive, trabalha para fazer o sucessor de Rodrigo Maia (DEM-RJ) na presidência da Câmara, sendo que Marcos Pereira é um dos cotados. O objetivo de ampliar sua capilaridade levou a sigla a abrir as portas a dois filhos de Bolsonaro, o senador Flávio (RJ) e o vereador Carlos (RJ), além da ex-mulher do presidente Rogéria (RJ). Para as eleições de 2020, foram lançados candidatos à prefeitura de dez capitais e outros 26 em cidades com mais de 200 000 habitantes. Ao lado de Russomanno, outra aposta prioritária do partido é a complicada reeleição de Marcelo Crivella, no Rio, que acabou de ser declarado inelegível pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE). O motivo: usar a máquina pública para fazer propaganda para a candidatura de seu filho à Câmara em 2018. Ele deve concorrer à base de recursos contra o favorito nas pesquisas Eduardo Paes (DEM) que, ironicamente, se encontra também com a candidatura ameaçada por problemas na Justiça. Até aqui, Bolsonaro vem dando apoio velado a Crivella na campanha da cidade que é a base política da família presidencial. Tanto no Rio de Janeiro como em São Paulo, os desafios para a vitória são enormes. Mas o presidente decidiu que essas apostas fazem valer o risco embutido — e decidiu pagar para ver.

Publicado em VEJA de 30 de setembro de 2020, edição nº 2706

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