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Público ou privado? Falta de moralidade é pano de fundo no caso das joias

Professora da UFRJ discute "conveniência" de políticos flagrados em desvios alegarem desconhecimento ou falta de legislação clara

Por Laryssa Borges Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 2 set 2023, 16h40

Professora da Ética e Filosofia Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Maria Clara Dias é taxativa: é “puro cinismo” dizer que políticos têm dificuldade de separar o que é público do que é privado quando estão investidos como representantes do voto popular. Dizer que a falta de uma lei clara eximiria o governante de responsabilidade por supostos desvirtuamentos também não ajuda, diz a especialista.

Em meio à investigação que atribui ao ex-presidente Jair Bolsonaro a suspeita de ter embolsado irregularmente joias de alto valor ofertadas por chefes de Estado estrangeiros, Dias avalia ser “cômodo” para o político da vez fingir que segue a moralidade, mas, longe dos holofotes, atuar para tirar vantagem. “A suposta dificuldade de se separar o público do privado na verdade é puro cinismo porque os políticos sabem a distinção entre o que eles são enquanto representantes do Estado e o que é a vida privada deles, a ponto de muitas vezes eles tentarem esconder. O político brasileiro está muito acostumado a usar a estratégia de, toda vez que é repreendido, dizer que não sabia. Isso vale para as joias no caso Bolsonaro mas também quando políticos usam, por exemplo, um jato oficial para levar a família”, comenta.

Alvos do escândalo de turno, presentes ofertados por chefes de Estado estrangeiros passaram a ser regulamentados no governo de Fernando Henrique Cardoso, que estabeleceu que bens recebidos em visitas oficiais deveriam ser incorporados ao patrimônio da União. O caso escalou em desgaste político pela primeira vez quando, em 2016, o TCU determinou que, pelo princípio da moralidade, mais de 470 presentes da ex-presidente Dilma Rousseff e do presidente Lula deveriam ser devolvidos ao poder público.

Até hoje o petista briga na justiça para manter a posse dos objetos que amealhou nos dois outros mandatos. Em processo que tramita no Tribunal Regional Federal da 3ª Região, ele questiona a regulamentação da gestão FHC, afirmando que o decreto do governo tucano “inovou na ordem jurídica” porque determinou que presentes recebidos de chefes de Estado ou de Governo pertencem à União, quando a lei original, editada ainda no governo de Fernando Collor, em 1991, não estabelece este tipo de critério.

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“Deveríamos moralmente lutar para que a convicção moral que temos de que atitudes assim são erradas se transforme em lei. É uma falha do Estado se não há uma lei neste sentido. É como se eles não quisessem assumir uma atitude moral e dissessem que precisa ter uma instância punitiva legal para agir corretamente”, resume Maria Clara Dias. A vagueza legal, aliás, é motivo para recorrentes conflitos entre público e privado.

As normas que regem o uso de jatinhos da Força Aérea Brasileira, por exemplo, não são taxativas sobre viagens de familiares de autoridades ou do presidente da República, o que abre brechas para passeios a lazer e caronas em voos pagos com dinheiro público.

No ano passado VEJA revelou as conclusões de uma auditoria sigilosa do Tribunal de Contas da União (TCU) que mostra que ministros do governo Bolsonaro embarcaram em jatinhos da FAB para, casados com alegadas agendas oficiais, acompanharem jogos do Flamengo ou desfrutarem de um feriado na praia. A mesma burla à moralidade já havia sido detectada nos primeiros mandatos do governo Lula.

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Criados em 2001, os cartões corporativos do governo federal também são um constante repositório de irregularidades. Usado desde 2002 para gastos emergenciais do governo, o expediente se vale do selo de confidencialidade de boa parte dos custos para barrar o detalhamento dos gastos. Suspeitas de que os cartões estavam sendo utilizados para fins privados levaram o Senado a abrir uma CPI em 2008.

A falta de transparência nos critérios usados para a escolha de convidados em comitivas presidenciais e na fiscalização das bagagens também já levaram a escândalos em diferentes governos.

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