Uma perícia técnica nas prestações de contas de um convênio no Ministério do Esporte indica que o cheque de pagamento de produtos destinados ao projeto “Pintando a Cidadania” e a nota fiscal do material vendido foram preenchidos pelo mesmo representante de uma Organização Não-Governamental (ONG). A pedido do jornal O Estado de S. Paulo, o perito criminal federal Maurício José da Cunha, professor de criminalística e documentoscopia da Academia Nacional do Departamento de Polícia Federal, analisou os documentos. Ele apontou que o mesmo punho escreveu os valores e as datas em cheques do Instituto Pró-Ação e notas fiscais de empresas fornecedoras do projeto.
Ou seja, quem pagou fez a nota fiscal de quem vendeu. “Conseguiu-se detectar as características dos grafismos não só quanto ao aspecto formal como quanto a sua formação genética em vários algarismos, letras isoladas e em palavras completas indicando um mesmo punho para os preenchimentos de cada cheque pesquisado com sua respectiva nota fiscal”, diz o laudo.
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Fachada – Na segunda-feira, o jornal revelou que pelo menos 1,3 milhão de reais em cheques da conta corrente do convênio do Instituto Pró-Ação com o Ministério do Esporte foi parar em contas de empresas fantasmas. O convênio foi assinado pelo secretário nacional de Esporte Educacional, Wadson Ribeiro. Há cheques de 364.000 reais, 311.000 reais, 213.000 reais, 178.000 reais, 166.000 reais e 58.000 reais. O dono de uma empresa disse que “arranjou” a nota fiscal para um amigo.
As cópias dos cheques e das notas fiscais extraídas do convênio do ministério são referentes às empresas Contemporânea Comércio e Serviços e Guerreiro Comércio e Serviços, que aparecem como contratadas. A primeira recebeu 817.000 reais e a segunda, 178.000 reais. Ambas não têm endereço fixo.
Com 40 anos de experiência na área, o perito Maurício José da Cunha analisou uma nota fiscal e um cheque no valor de 178.187,50 reais emitido pela ONG à empresa no dia 21 de maio de 2010. “Foram detectadas convergências não só formais como em relação à gênese gráfica de diversas letras isoladas, em palavras inteiras, em algarismos isolados e na formação de números, tais como o próprio valor 178.187,50, confrontados com o valor da respectiva nota fiscal”, afirmou.
Foram também periciados o cheque e a nota fiscal no valor de 213.254,94 reais emitidos pelo Instituto Pró-Ação para a Contemporânea. A conclusão foi a mesma. Por fim, o perito diz que “tudo indica” que a mesma pessoa escreveu todos os cheques e notas fiscais relacionados a essas empresas. O dono do Instituto Pró-Ação, Zilmar Moreira, disse que vai averiguar o caso, mas negou envolvimento em irregularidades. “Nós cumprimos com nossa obrigação no convênio”, garante.
Prestação de contas – A assessoria do ministério informou que, se o teor da reportagem for confirmado, tomará providências. A pasta disse que poderá convocar o Instituto Pró-Ação, oficiar às secretarias distrital e estadual de Fazenda sobre a validade das notas, dar ciência à polícia, avaliar as despesas no parecer final da prestação de contas e dar ciência das iniciativas ao Ministério Público. Ressaltou ainda: “Na análise das prestações de contas, como a que está sendo feita no caso deste convênio, esse e todos os outros preceitos legais são rigorosamente observados.”
Por conta do esquema de corrupção no Ministério do Esporte, Orlando Silva, que chefiava a pasta, pediu demissão nesta quarta-feira. Ele foi pressionado a pedir para sair depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) abriu inquérito para investigar o caso denunciado pelo policial militar João Dias a VEJA.
(Com Agência Estado)