Para manter o criminoso italiano Cesare Battisti no Brasil, o presidente Luis Inácio Lula da Silva amparou-se num despacho da Advocacia Geral da União que é nada menos que espantoso. O argumento central do despacho é que, de volta à Itália, Battisti poderia ver sua situação pessoal agravada. O “agravamento da situação pessoal” é uma das hipóteses que permitem a Brasil ou Itália negar uma extradição, segundo o tratado bilateral que regula o tema.
Fernando Luiz Albuquerque Faria, advogado-geral substituto que assina o documento, raciocina da seguinte forma: “Na Itália, as opiniões polarizam-se e concretizam-se em vários atos, a exemplo de entrevistas, manifestos e passeatas. Esses fatos constituem substrato suficiente para configurar-se a suposição de agravamento da situação de Cesare Battisti caso seja extraditado para a Itália.”
Entrevistas, manifestos e passeatas: essas seriam, em suma, as armas terríveis das quais o criminoso de estimação do governo Lula teria de ser protegido. A menos, é claro, que o governo brasileiro tenha outro tipo de temor. “Agravamento da situação pessoal” é uma expressão que faz pensar em prisões infectas como as de Cuba, ou em penas de apedrejamento, como as do Irã. Faz pensar em países cujas instituições são frágeis e corroídas pela arbitrariedade.
É assim que o governo Lula considera a Itália? Obviamente, todos os documentos oficiais hoje divulgados – a nota oficial da presidência, o parecer e o despacho da AGU – se apressam em negar essa hipótese. O parecer, em português torto, diz que não há “nenhuma bravata à história e à dignidade da Itália”; o despacho afirma que inexiste “avaliação negativa sobre as instituições atuais ou passadas da República Italiana”.
Nem poderia ser de outra forma. A Itália é uma democracia de pleno direito, e não uma ditadura. Mas coisas espantosas passam pela cabeça das autoridades do governo Lula. Nunca é demais lembrar a frase de Tarso Genro sobre o caso Battisti, quando ele ainda era Ministro da Justiça: “A Itália de hoje não é um país nazista ou fascista, embora o movimento fascista lá seja forte e galopante, inclusive em setores do governo.”
Ou governo brasileiro ofendeu a Itália de maneira espantosa – ainda que velada – ou o embasamento jurídico da decisão de não extraditar Battisti é uma piada.
Ao longo de seu mandato, Lula não hesitou em justificar as brutalidades de ditaduras como Irã e Cuba. Tomou o partido dos tiranos e tripudiou sobre os que são oprimidos por eles ao falar dos casos da iraniana Sakineh Ashtiani e do dissidente cubano Gillermo Farinas. Num episódio que serve de contraste para o de Cesare Battisti, o governo Lula deportou sumariamente dois lutadores cubanos que, no Brasil para disputar os jogos PanAmericanos, sonharam em fugir para sempre do inferno onde ainda reina o comandante Fidel Castro. À época ministro da Justiça, Tarso Genro, hoje governador do Rio Grande do Sul, disse que os lutadores queriam voltar ao lar. A fuga de um deles da ilha, meses mais tarde, o desmentiu e ridicularizou. Mas o que importa o ridículo a políticos como Lula, Genro e o chanceler Celso Amorim, guiados por um misto rançoso de ideologia esquerdista e pragmatismo?
A decisão de manter no Brasil o terrorista italiano Cesare Battisti, julgado e condenado em seu país natal pelos assassinatos de um açougueiro, de um joalheiro, de um agente penitenciário e de um agente de polícia – crimes comuns e não políticos na visão dos tribunais italianos e também na visão do Supremo Tribunal Federal brasileiro, que por essa razão autorizou sua extradição no final de 2009 – simboliza à perfeição a política exterior hipócrita e nauseante adotada pelo governo Lula, de triste memória, no campo dos direitos humanos.