A Justiça Eleitoral de São Paulo aceitou nesta quinta-feira, 30, a denúncia apresentada há uma semana pelo Ministério Público contra o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin, do PSDB. Com a decisão do juiz Marco Antonio Martin Vargas, da 1ª Zona Eleitoral de São Paulo, o tucano passa à condição de réu e será julgado pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica eleitoral, como é tipificado legalmente a prática de caixa dois.
Ao receber uma denúncia do Ministério Público e abrir uma ação penal, o magistrado não faz juízo sobre a culpa dos acusados, mas apenas analisa se a promotoria reuniu indícios suficientes de autoria e materialidade dos supostos crimes narrados na acusação. Após a abertura do processo, o MP e os réus apresentarão provas, testemunhas e acusados serão ouvidos e, ao final, o juiz dará uma sentença, para condenar ou absolver.
Segundo a denúncia, assinada pelos promotores Fábio Bechara, Everton Zanella, Luiz Ambra, João Santa Terra e Rodrigo Caldeira e baseada em delações premiadas e provas entregues por delatores da Odebrecht, o tucano recebeu 11,3 milhões de reais em dinheiro vivo da empreiteira nas eleições de 2010 e 2014. Entre as evidências também estão depoimentos de testemunhas, planilhas de controle de pagamentos e dos sistemas da Odebrecht, e-mails, transcrições de áudios de gravações e análises de quebra de sigilo telemático.
“Os depoimentos dos colaboradores e das testemunhas, somados aos elementos de corroboração acostados aos autos, em tese, perfazem conjunto de indícios, por ora, capaz de reforçar a convicção sobre o envolvimento dos denunciados no complexo esquema de solicitação e recebimento de vantagens indevidas em razão de função política, omissão de dados à Justiça Eleitoral e lavagem de capitais, supostamente erigido para dissimular os fins ilícitos dos grupos políticos e empresariais apontados”, assinalou o juiz na decisão de hoje.
O Ministério Público afirma que em 2010 Geraldo Alckmin recebeu 2 milhões de reais da Odebrecht, aos quais teriam se somado mais 9,3 milhões de reais em 2014, quando conseguiu a reeleição. O dinheiro não foi registrado nas prestações de contas de Alckmin à Justiça eleitoral.
Os promotores paulistas sustentam que o dinheiro destinado a Alckmin foi encaminhado pelo setor de Operações Estruturadas da empreiteira, responsável pelo pagamento de propinas e caixa dois a políticos. Atribuídos nas tabelas a codinomes, os valores eram entregues pela equipe do doleiro Alvaro Novis mediante a apresentação de uma senha pelo recebedor. No caso de Alckmin, seu apelido era “Belém” e os de seu ex-secretário de Planejamento e tesoureiro de campanha, Marcos Monteiro, eram “Salsicha”, “MM Partido” e “M&M”.
A denúncia afirma que os montantes se destinavam, além do financiamento eleitoral do tucano, a “manutenção da influência” da Odebrecht junto a seu governo. Por ser controladora de uma concessionária que administra a rodovia estadual Dom Pedro I e ter participado do consórcio que construiu a linha 6 do metrô, a empresa não poderia fazer doações eleitorais oficiais.
Em 2010, diz a acusação, os repasses ao tucano foram intermediados pelo cunhado dele, Adhemar César Ribeiro, cujo escritório recebeu os valores da Odebrecht. Na eleição seguinte, teria sido Marcos Monteiro, então tesoureiro da campanha de Geraldo Alckmin, o operador do dinheiro, dividido em 11 repasses em dinheiro vivo a Sebastião Eduardo Alves, assessor de Monteiro.
Conforme a denúncia, seguindo as regras do departamento de propinas da Odebrecht, os supostos pagamentos ao cunhado do ex-governador foram liberados mediante a apresentação de senhas, como “acara”, “escravo”, “cabana”, “teatro peixe”, “presépio”, “borracha”, “fafa”, “colônia” e “pastel”, entre outras. Em 2014, sustentam os promotores, foram usadas senhas como “cedro”, “formiga”, “tesoura”, “marceneiro”, “pudim”, “bolero”, “árvore”, “sardinha”, “cimento”, “chocolate” e “martelo”.
Além de Geraldo Alckmin, se tornaram réus Marcos Monteiro, Sebastião Alves, Álvaro Novis e seis executivos e funcionários da Odebrecht: Benedicto Barbosa Júnior, o BJ; Arnaldo Cumplido, Maria Lúcia Guimarães Tavares, Fernando Migliaccio, Luiz Eduardo da Rocha Soares e Luiz Antonio Bueno Júnior. Adhemar César Ribeiro, o cunhado de Alckmin, não foi alvo da denúncia porque, como ele tem mais de 70 anos, os crimes prescreveram em relação a ele, assim como o ex-executivo da Odebrecht Carlos Armando Paschoal.
Outro lado
Por meio de nota, a defesa de Geraldo Alckmin afirma que o recebimento da denúncia dará a ele “a oportunidade que foi até agora negada de se defender e de contraditar as falsas e injustas acusações de que está sendo vítima e, principalmente, de provar a sua improcedência”. O comunicado assinado pelos advogados José Eduardo Rangel de Alckmin Marcelo Martins de Oliveira afirma que o tucano “lamenta essa injusta e indevida exposição, confiante de que, ao final do processo, a verdade e a justiça prevalecerão, pois nunca recebeu valores a título de contribuição de campanha eleitoral que não tenham sido devidamente declarados nos termos da legislação vigente, nem tampouco praticou qualquer ato de corrupção, como, aliás, nunca fez durante mais de 40 anos de vida pública”.
O presidente do diretório paulista do PSDB, Marco Vinholi, secretário de Desenvolvimento Regional de São Paulo, divulgou na ocasião nota na qual afirma que o partido “reitera sua confiança na idoneidade do ex-governador Geraldo Alckmin. Em seus mais de 40 anos de vida pública, Alckmin manteve uma postura de retidão e respeito à lei sem jamais abrir mão dos princípios éticos e de seu compromisso em servir ao setor público e ao cidadão. Acreditamos na Justiça e temos convicção de que, ao final do processo, os fatos serão devidamente esclarecidos”.