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3 centavos por voto

O senador Major Olímpio, eleito por São Paulo com mais de 9 milhões de votos, diz ter vencido graças ao WhatsApp, ao Facebook e a Bolsonaro

Apresentado por Atualizado em 19 out 2018, 07h00 - Publicado em 19 out 2018, 07h00

Até o dia da eleição, Sérgio Olímpio Gomes, conhecido como Major Olímpio, não constava nas pesquisas com chance de liderar a disputa pelo Senado por São Paulo. O candidato bolsonarista, no entanto, recebeu 9 039 717 votos, o mais votado do país. Considerando que sua campanha arrecadou 297 000 reais, o investimento por voto foi de míseros 3 centavos. Olímpio credita seu sucesso a duas razões: ter se associado ao fenômeno do capitão da direita radical e usar com maestria recursos digitais como WhatsApp e Facebook. Integrante da bancada da bala na Câmara dos Deputados há quatro anos, Olímpio encontrou em Bolsonaro uma sintonia em assuntos de segurança. Dos 74 projetos de lei que apresentou como deputado federal, 47 versam sobre armamentos, polícias e penitenciárias. Em questões comportamentais, contudo, critica os “exageros” de Bolsonaro. “Hoje, ele amadureceu”, garante.

O senhor obteve pouco mais de 9 milhões de votos e sua campanha arrecadou 297 000 reais. Como conseguiu uma equação tão vantajosa? A TV foi 100% irrelevante para a minha eleição. Eu tinha trinta segundos no horário eleitoral gratuito a cada quatro dias. Se eu fosse contar com isso, estaria perdido. A campanha teve foco em rede social. Realizei, em média, quatro lives por dia, quase sempre em endereços públicos. Acordava de madrugada para gravar em locais de aglomerações, como estações de metrô e ruas de forte comércio popular. Enquanto eu falava ao vivo com trinta pessoas, essas lives alcançavam 100 000 visualizações. Para mensurar o impacto daquilo na vida real, pegava metrô para ver se as pessoas me reconheciam. Pulava de vagão em vagão para averiguar se sabiam quem eu era. À medida que as lives iam acontecendo, mais conhecido eu ficava. O meu maior gasto de campanha foi com impressão de santinhos e custo de postagem, pois os diretórios e apoiadores de cidades pequenas ainda fazem questão de ter o papel.

Quando o senhor aprendeu a usar as redes sociais? Foi por imitação, ao ver o Bolsonaro sempre grudado em seu celular na Câmara. Ele ensinou que temos de responder aos grupos de WhatsApp e divulgar notícias para nos enaltecer ou nos defender. Há eleitores que nos consideram amigos. Muitos nos consomem como ídolos, influenciadores. Estabelecer esse canal direto amplia o engajamento. Antes da eleição, eu tinha 897 grupos de WhatsApp. Agora, são mais de 1 000. É uma coisa incontrolável e insana, no momento que encaminho uma mensagem não tenho mais controle do impacto. Minha agenda telefônica tem o contato de 60 000 policiais e agentes penitenciários. Não sei medir o impacto do WhatsApp e do Facebook separadamente.

“Temos de responder aos grupos de WhatsApp e divulgar notícias para nos enaltecer e nos defender. Estabelecer contato direto aumenta o engajamento”

Quais assuntos têm impacto maior? Aqueles ligados à segurança e redução da maioridade penal. Ataques a polícias causam comoção, assim como relatos de grandes crimes, como assaltos a carros-fortes. O meu público está preocupado com esse assunto.

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Há dois anos, o senhor obteve uma votação pífia, de 116 870 votos, na disputa para a prefeitura de São Paulo. Se rede social vence eleição, por que não se tornou prefeito naquela ocasião? Quando disputei a prefeitura, ainda não era conhecido da grande massa. A eleição ajudou nesse sentido, pois participei de debates e ganhei seguidores em redes sociais. Fui construindo meu capital para o momento atual. Agora, é claro que peguei carona no fenômeno Jair Bolsonaro. Com o atentado sofrido por ele em Juiz de Fora, eu me tornei um porta-voz do partido no estado. A própria imprensa me ajudou, seja para elogiar, seja para bater, ao se referir a mim como “aliado de Bolsonaro”. Assim, criou-se uma associação direta entre nós. Na campanha, apesar do poder do mundo digital, o contato físico ainda é fundamental.

Como esse contato se deu? Os ativistas de Bolsonaro agendaram muitas carreatas; então cheguei com o time em campo e pronto para atuar. Fui a centenas delas, organizadas por grupos que não fazem parte da vida partidária. O antipetismo é tão forte que as pessoas investiram tempo e dinheiro organizando reuniões e passeatas. Entendo essa turma. Se eu pudesse mudar algo na história do Brasil, a sigla PT não poderia ser usada nem como prefixo de aeronave. Algumas das classes mais atuantes são as comitivas de motociclistas e de atiradores.

Em junho, o senhor apresentou um projeto de lei para isentar motociclistas de pagar pedágio em estradas federais. Seria uma forma de retribuir o apoio? Não foi contrapartida. Essa demanda existe há tempos. Eles temem assaltos na hora de parar no pedágio, além de já terem gastos com as próprias motos.

O senhor se incomoda de ser apontado como membro da “bancada da bala”? Prefiro pertencer à bancada da bala do que à da mala. Quero agora ampliar a minha atuação, mas é natural que eu entenda as demandas dessa classe.

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O senhor anda armado? Sim, por necessidade absoluta. Circulo com uma Glock 17 de 9 milímetros, de minha propriedade. Tenho registro de arma e faço coleção, tenho outros modelos além da Glock. Após o atentado ao Bolsonaro, passei a tomar mais cuidado. Deixei de correr na rua.

O senhor acha que reduzir a maioridade penal para 16 anos é pouco? Meu projeto de lei tinha como objetivo reduzir a maioridade penal de 18 para 12 anos. O criminoso seria preso após uma avaliação psicológica, para analisar se tem discernimento do ato cometido. Meu projeto foi considerado duro demais, então passou dos 12 para os 16 anos. O texto novo foi aprovado na Câmara e agora tramita no Senado. A população está cansada.

“Meu projeto de lei tinha como objetivo reduzir a maioridade para 12 anos. Se trinta marginais tiverem de ficar em cela com capacidade para dez, acho melhor do que estarem soltos”

O senhor concorda com o bordão “bandido bom é bandido morto”? Não, não acho que bandido bom é bandido morto, creio que bandido bom é bandido preso.

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Quando atuou na Polícia Militar, o senhor foi responsável pela morte de alguém? Já trabalhei em ocorrências que resultaram em óbitos, mas nunca tirei a vida de um bandido. Agora, quem atira na polícia tem de morrer. Se o marginal chega com um fuzil 756, o Estado tem de equipar a polícia com um modelo superior, o fuzil 762.

O Brasil sofre um déficit de 360 000 vagas nas cadeias. Com a redução da maioridade, como evitar o agravamento desse problema? É necessário que o marginal não seja punido à luz do Estatuto da Criança e do Adolescente. Se alguém não quer ir para a cadeia, que não cometa crimes de nenhuma ordem. Entre ver confinados esses marginais e deixá-los no convício da sociedade, barbarizando a todos, prefiro que estejam presos. Se trinta pessoas tiverem de ficar em uma cela com capacidade para dez, acho melhor do que estarem soltas.

Bolsonaro já declarou que as minorias devem se curvar à maioria. O que o senhor acha dessa declaração? Eu diria que houve um exagero (da parte dele). Como aquela máxima do caipira, a língua é o chicote do corpo. Veja a questão da Maria do Rosário, por exemplo. Primeiro, ela o chamou de estuprador — daí ele revidou dizendo que não a estupraria por ser feia. Tenho certeza que hoje Bolsonaro não falaria isso. Tem manifestações que fazemos ao longo da vida e, depois, mudamos de comportamento. Isso se chama amadurecer.

Ele também já declarou que os gays são resultado de falta de surra. O senhor concorda? Lógico que não. Nem ele pensa assim, pois defende a liberdade. Amadurecer é reconhecer erros do passado. O Bolsonaro jamais falaria algo do tipo hoje. Ninguém tem a ver com o que um cidadão faz em sua vida íntima.

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Então por que Bolsonaro não se manifesta sobre o assunto, uma vez que minorias estão sofrendo ataques? Puxa, mas é o que ele mais tem feito hoje em dia. Com o episódio da morte do capoeirista em Salvador (Moa do Katendê, morto com doze facadas por um apoiador de Bolsonaro), o candidato se manifestou dizendo que nada justifica a violência de inspiração política. Ele nem quer o voto daquelas pessoas que praticam a violência.

Bolsonaro também disse que não tem “nada a ver com isso”. Imagine se um candidato da esquerda tivesse sido esfaqueado, como aconteceu com ele. O conflito no Brasil seria horrível. Até aqui, não tivemos nenhuma viatura quebrada porque somos legalistas e não queremos a violência de ordem alguma.

João Doria, candidato ao governo de São Paulo, foi ao Rio para ser recebido por Bolsonaro e não conseguiu. O senhor trabalhou para esse constrangimento? A assessoria do João Doria divulgou que ele se encontraria com o Bolsonaro, que inclusive faria uma declaração de apoio à eleição ao governo de São Paulo. Liguei para o Bolsonaro para saber se era verdade. Era tudo mentira do Doria. O Bolsonaro me assegurou que só vai apoiar em três estados: Roraima, Rondônia e Santa Catarina, onde há candidatos do PSL. Nos outros, vai se manter neutro. O Doria foi oportunista conosco.

Como assim? Ainda no primeiro turno, o grupo dele saiu pregando o voto “Bolsodoria”. Foi algo imoral e antiético, pois o PSL tinha candidato ao governo paulista, o Rodrigo Tavares. A linha de raciocínio é simples: todos os políticos do PSL foram bem votados, exceto o Tavares. O Doria confundiu o público. No segundo turno, voto em Márcio França porque não abraço o meu carrasco.

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O senhor acha que João Doria tem chance de ganhar? Vai perder. O PSDB não aumenta o salário dos policiais há muitos anos nem investe em melhorias na corporação. Sei que o partido tem culpa em cada caso de policial que enterrei. Todos os funcionários públicos e seus parentes não querem mais saber do partido que governa o estado há duas décadas sem olhar para nenhuma classe. Além disso, o Doria está provando do próprio mal. Ele foi desleal com o governador Geraldo Alckmin, agora os prefeitos tucanos estão trabalhando pelo França. Não querem Doria porque ele é um traidor.

O que o senhor fez na noite anterior à votação? Fui ao aniversário da filha de um amigo, onde tomamos umas cervejas. Cheguei em casa e vi a série O Atirador, na Netflix. Não durmo bem em geral, mas na eleição tudo piorou. Sempre achamos que a próxima mensagem de WhatsApp terá mais impacto, será mais compartilhada. A rede social ajuda a ganhar uma eleição, mas gera muita ansiedade.

Publicado em VEJA de 24 de outubro de 2018, edição nº 2605

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