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‘Vou votar nulo’, diz Doria sobre possível disputa entre Lula e Bolsonaro

O ex-governador tucano afirma que ele e Moro sofreram com os políticos tradicionais: 'Fomos massacrados'

Apresentado por Atualizado em 27 jun 2022, 11h20 - Publicado em 24 jun 2022, 06h00

Respaldado na excelente gestão que fez no governo de São Paulo e no esforço realizado para a vacinação contra a Covid-19, João Doria era um dos mais qualificados e obstinados candidatos a ocupar a liderança da terceira via e fazer frente à polarização entre Luiz Inácio Lula da Silva e Jair Bolsonaro. Apesar desses ativos, a campanha nunca decolou e ele acabou renunciando à pretensão. Agora, mostra-se muito descrente de uma candidatura alternativa. “Infelizmente, o populismo de esquerda ou de direita vai vencer no Brasil, o que será desastroso para o futuro do país”, afirmou ele a VEJA, referindo-se a Lula e Bolsonaro. Dono de uma admirável trajetória profissional (começou a vida como office boy e se tornou um empresário milionário), anunciou há alguns dias que voltará a atuar no setor privado e concedeu a sua primeira entrevista a um veículo de comunicação desde a saída do páreo para o Palácio do Planalto. Além de criticar as posturas e propostas de Lula e de Bolsonaro no encontro realizado em São Paulo na tarde da última quarta, 22, Doria fez um balanço de sua frustrada tentativa de encabeçar a chapa presidencial do PSDB e reclamou de ter sido vítima da mesma rejeição que o ex-juiz Sergio Moro sofre hoje dos políticos tradicionais. “Fomos massacrados”, lamentou.

Faltando menos de 100 dias para as eleições, pesquisas reforçam o favoritismo de Lula e Bolsonaro. A terceira via naufragou? Vejo com dificuldades a terceira via. Não quero fazer prognósticos, nem deixar de ter respeito por Simone Tebet, Luiz Felipe d’Avila, Luciano Bivar, Ciro Gomes e outros candidatos. A bipolarização se fortaleceu de tal forma que, lamentavelmente, o destino do Brasil é ser governado por um populista, de esquerda ou de direita. Lula e Bolsonaro não representam esperança para o Brasil. Infelizmente, nas eleições, vivemos um pêndulo, que sai da extrema esquerda e vai para a extrema direita. Os extremos se tocam nos procedimentos, nas condutas equivocadas, no empoderamento excessivo e nas práticas pouco democráticas.

No caso de Lula e Bolsonaro seguirem para o segundo turno, em qual dos dois o senhor votaria? Pela primeira vez na vida, se isso acontecer, vou anular o meu voto. Nunca votei em branco e nunca anulei. Quero estar em paz com minha consciência.

Como enxerga o futuro do país diante dessas duas possibilidades? O Brasil não precisa de um populista à frente do país, mas é isso que vai acontecer. O populismo não vai diminuir a miséria, nem melhorar a condição do povo. Quando você tem governos populistas, você impõe sofrimento, mordaça, atitudes que condenam as ideias mais modernas de liberalismo econômico. O Brasil não precisa de ideologia. Precisa mesmo é de administração, gestão, eficiência, honestidade.

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“Em caso de fracasso, Bolsonaro não irá aceitar não apenas a derrota, mas também a perspectiva de derrota. É um golpista que afronta a Carta e defende a ditadura”

Hoje liderando as pesquisas e com possibilidades de vencer no primeiro turno, o ex-presidente Lula tem se movimentado para receber apoios de centro, inclusive do PSDB. Mas, nas declarações e no esboço do plano de governo, ele levanta velhas bandeiras de esquerda, falando das revisões das privatizações e da reforma trabalhista. Se for eleito, qual Lula vai governar? Será o presidente do retrato do atraso. O atraso populista da esquerda que se toca com a extrema direita. É um retrocesso anular políticas como as das privatizações e revisar a lei trabalhista.

Em caso de derrota de Bolsonaro, que toda hora faz críticas ao sistema eleitoral, o senhor acredita que ele poderá tentar um golpe ou criar alguma confusão? Infelizmente, sim. Vejo momentos turbulentos pela frente. Bolsonaro não irá aceitar não apenas a derrota, mas também a perspectiva da derrota. Bolsonaro claramente é um golpista, que advoga e abraça o golpe como forma de se perenizar no poder. Ele afronta a Constituição e defende a ditadura. Eu sei o que foi a ditadura: meu pai foi cassado pelo golpe militar de 1964. Eu vivi isso de perto.

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Mas Bolsonaro já defendia a ditadura antes de chegar à Presidência, inclusive quando o senhor o apoiou no segundo turno das eleições de 2018. Quase 60 milhões de brasileiros votaram em Bolsonaro. Foi um voto anti-­Lula. Como eu, há milhões de brasileiros arrependidos. Escolhemos o remédio errado para salvar o Brasil. O Brasil, de fato, ficou pior com Bolsonaro.

O senhor acredita que ele poderá virar o jogo, faltando pouco mais de três meses para as eleições? Se sim, como seriam mais quatro anos de Bolsonaro no Brasil?  Não sou um profeta de pesquisas, mas, hoje, concretamente, as chances de Lula são maiores do que as de Bolsonaro. Vamos acompanhar o processo antes de sofrer por antecipação.

No seu discurso de desistência da candidatura a presidente, o senhor pediu desculpas pelos erros e falou que, se cometeu excessos em alguns momentos, foi por vontade de acertar. Quais foram os erros e os excessos nesses anos todos? Quem faz essa avaliação é a população. Aquilo que fizemos de correto, cumprimos nossa obrigação. No que as pessoas julgaram como excesso e equívoco, peço desculpas. Tudo o que fiz foi com boas intenções.

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A sua desistência ocorreu após uma somatória de questões, como a baixa popularidade e dos números nas pesquisas, apesar da boa avaliação do seu governo. Quais desses fatores pesou mais na sua decisão de retirar a candidatura? Fizemos uma boa gestão, trouxemos 124 milhões de doses da vacina (CoronaVac), salvamos milhares de vidas. Graças a São Paulo o Brasil começou a vacinar em janeiro, quando o governo federal falava em início da campanha apenas para abril. Com isso, salvamos cerca de 350 000 vidas, conforme as estatísticas de especialistas sérios que fazem esse tipo de projeção. Tivemos muitos avanços em diversas áreas. Mas houve uma reação da máquina de fake news bolsonarista que nos atingiu profundamente, como se a culpa pela paralisação da economia fosse das medidas que adotamos com pioneirismo em São Paulo para proteger a vida das pessoas.

Há quem diga que os confrontos públicos contra o presidente na fase mais aguda da pandemia ajudaram a aumentar a rejeição do senhor. Faria algo diferente com relação a esse tipo de comportamento? Não faria nada diferente, pois o confronto era necessário. Contra quem defendia a cloroquina, eu defendia a vacina. Fiz o papel que se espera de um gestor responsável.

Como candidato a presidente, o senhor tinha uma boa história a apresentar: bem-sucedido, com uma gestão bem avaliada, com a importância da vacina no currículo. No centro, havia ainda o ex-juiz Sergio Moro, que também tinha uma boa história para contar. Mas ambos foram descartados e quem ocupou esse lugar foi a senadora Simone Tebet, que teve relevância na CPI da Pandemia, mas ainda é pouco conhecida nacionalmente. Como explicar essa decisão? Sergio Moro e eu fomos massacrados pela política. Nós não somos profissionais da área. Há os momentos em que podemos participar da vida pública e os momentos nos quais a política nos afasta da vida pública. Tenho respeito pelo Sergio Moro e espero que ele se eleja deputado federal pelo Paraná.

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A sua rejeição no meio político é atribuída ao fato de o senhor não cumprir alguns rituais que são caros a esse meio, como receber prefeitos do interior para cafezinhos. Como encara esse tipo de crítica? Os prefeitos têm imagem positiva do nosso governo. Em vez de café, destinamos recursos para a saúde, educação, meio ambiente, habitação, estradas vicinais. Tenho certeza de que a maioria dos prefeitos prefere recursos e apoios na sua gestão a cafezinho e tapinha nas costas.

É quase um consenso entre aliados tucanos que foi um erro de sua parte confiar em Bruno Araújo, o presidente do PSDB. Ele atuou nas prévias tucanas a favor de seu rival, o ex-governador gaúcho Eduardo Leite. Depois, quando houve o episódio da ameaça de sua renúncia ao governo de São Paulo, ele divulgou uma carta garantindo o resultado da eleição interna, mas em seguida voltou a relativizar a sua vitória nas prévias do PSDB. São águas passadas. Você não pode ser um poço de mágoas na vida e nem ficar permanentemente avaliando o passado. Tenho boas relações com o Bruno.

“O Brasil não precisa de populismo nem de ideologia. Isso não vai diminuir a nossa miséria. O país precisa mesmo é de administração, gestão, eficiência, honestidade”

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Mas ele foi correto com o senhor ao longo de todo esse processo? Temos de analisar o que temos hoje, não o passado. Hoje nossas relações são boas, fluidas, corretas com ele, com o ex-governador Eduardo Leite, o senador Tasso Jereissati. Aqueles que fizeram oposição a mim no partido, possuo hoje boas relações com eles. Prefiro ficar com essas relações.

O ex-governador gaúcho Eduardo Leite disputou as prévias, fez críticas e acusações pesadas, depois posou de mãos dadas com o senhor. Mas demorou a abandonar o desejo de uma virada de mesa. Depois, jurou que não concorreria à reeleição estadual e voltou atrás. O que acha das idas e vindas dele? Uma decepção na política? Não me sinto à vontade de fazer juízo de valor sobre o Eduardo Leite. Só desejo que ele, com 37 anos, tendo sido prefeito de sua cidade, Pelotas, e bom governador do Rio Grande do Sul, continue tendo uma boa trajetória política. Mas prefiro me abster de fazer qualquer juízo sobre ele.

A atuação do deputado Aécio Neves contra sua candidatura foi decisiva? Prefiro não fazer juízo de valor sobre Aécio Neves. Mas sempre procurei ficar em paz com minha consciência. Nos seis anos em que estive na política, nunca vendi minha consciência.

Como o senhor vê o papel do ex-governador e ex-aliado Geraldo Alckmin na campanha de Lula? Eu gostaria que o Geraldo não tivesse saído do PSDB, mas ele tomou uma decisão e aceitou ser candidato a vice-presidente do Lula. Geraldo é um homem de bem, correto, ainda que ao lado de Lula, que ele combateu por três décadas.

O senhor falou que deixaria a política, mas não ficou claro se voltaria um dia. Voltará? Comecei minha carreira como um modesto office boy, com 13 anos, até me tornar empresário. Só depois me decidi ir para a vida pública. Neste momento minha opção é pelo privado, onde estive por 45 anos.

Publicado em VEJA de 29 de junho de 2022, edição nº 2795

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