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STF manda soltar Cesare Battisti

Para ministros, governo italiano não tem legitimidade para questionar decisão de Lula de manter terrorista no Brasil; Battisti será solto até a manhã de quinta

Por Gabriel Castro
8 jun 2011, 21h08

Após uma intensa batalha jurídica de quatro anos, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta quarta-feira, que o terrorista italiano Cesare Battisti, condenado à prisão perpétua em seu país de origem por quatro assassinatos nos anos 70, deve ser libertado. A decisão tem validade imediata. O terrorista pode ser libertado ainda nesta quarta ou até a manhã de quinta-feira.

O julgamento foi feito em duas etapas: na primeira, os ministros analisaram recurso proposto pelo governo italiano contra decisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de negar a extradição de Battisti, que integrou o grupo extremista Proletários Armados pelo Comunismo (PAC). No jargão jurídico, eles não conheceram do recurso. Ou seja, sequer analisaram o seu mérito.

Na segunda etapa, analisaram petição apresentada pela defesa do italiano pedindo sua libertação. E mandaram soltar Battisti. Em ambas as fases, o placar foi de seis votos a três – vencidos o presidente do Supremo, Cezar Peluso, e os ministros Gilmar Mendes (relator) e Ellen Gracie.

A sessão foi longa – durou cerca de seis horas – e permeada por embates entre os ministros. Mas já na primeira fase da discussão os inconformados com a permanência de Battisti no Brasil perderam a batalha. A porta para discutir a questão sob o aspecto técnico foi fechada quando o tribunal decidiu não analisar o mérito do recurso da Itália. Sepultado o recurso, não havia como reabrir a discussão. Como o processo de extradição foi considerado extinto, já não havia porque manter Battisti preso.

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Argumentos – No julgamento, Mendes lançou argumentos pertinentes ao questionar se, ao delegar ao Executivo a palavra final num processo de extradição, a corte não perderia o sentido de existência: “Se for assim, o papel do tribunal é de um clube lítero-poético recreativo”, comparou.

Ele afirmou que o Supremo havia recomendado que Lula cumprisse um acordo internacional firmado com a Itália, e que o presidente não poderia decidir manter o italiano no Brasil. E desmontou a argumentação de que Battisti é um perseguido político: “Nós estamos a falar de alguém que é condenado por quatro assassinatos. Não estamos a falar de alguém que foi preso por estar fazendo um passeio, um trottoir“, declarou.

A ministra Ellen Gracie disse que faltou sustentação no parecer da Advocacia Geral da União que sustentou a decisão de Lula: “Li e reli o parecer oferecido pela AGU ao presidente e ali não encontrei menção a qualquer razão ponderável, a qualquer indício que nos levasse a crer que o extraditando fosse ser submetido a condições desumanas”. Segundo o parecer, Battisti correria riscos ao retornar para a Itália.

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Peluso finalizou: “Estou convencido que o senhor presidente da República, neste caso, descumpriu a lei e a decisão do Supremo Tribunal Federal

Questão encerrada – Na corrente oposta, Joaquim Barbosa disse que o caso já estava encerrado com a decisão de Lula: “O STF resolveu a questão por maioria. Numa decisão acessória, indicou ao presidente qual era a linha que ele poderia tomar. Ele tomou a sua decisão. Questão encerrada. Não há nada para um estado estrangeiro se imiscuir. Chega”.

Ricardo Lewandowski, que havia votado pela extradição de Battisti no julgamento de 2009, disse nesta quarta que a corte não poderia desfazer a decisão de Lula: “Neste momento, não é esta a questão que está em jogo. Trata-se de saber agora se o Supremo Tribunal Federal pode ou não examinar e rever um ato que o presidente da República exerceu dentro dos preceitos constitucionais que lhe foram assegurados”.

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Luiz Fux citou críticas feitas por autoridades italianos ao Brasil na época da decisão de Lula e elevou o caso a um outro patamar: “O que está em jogo aqui não é nem o futuro nem o passado de um homem. O que está em jogo aqui é a soberania nacional”.

Peluso, Mendes e Ellen foram vencidos. Tinham razão lá atrás, ao criticar a não-extradição do terrorista. Afinal de contas, a cúpula do Judiciário brasileiro rompeu com a própria tradição, consolidada ao longo de 200 anos, ao dar ao chefe do Executivo arbítrio num tema que deveria ser despolitizado ao máximo e tratado de maneira estritamente técnica. Mas hoje já não havia um caminho jurídico que eles pudessem trilhar.

Defesa – O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, disse que a simples tentativa do governo italiano de reverter a decisão de Lula afronta a soberania nacional do estado brasileiro. “Tal tentativa de interferência do processo de extradição de ambas as partes é violadora do princípio de não-intervenção nos negócios internos de outras partes”. Ele definiu como “inaceitável” e “afrontosa” a posição do governo da Itália.

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Nabor Bulhões, advogado do governo italiano, diz que o presidente foi induzido a erro pelo parecer da Advocacia Geral da União, e classificou a decisão de Lula como “irrazoável” e “insubsistente”.

Já Luis Inácio Adams, advogado-geral da União, disse que a palavra final de Lula é inconstestável: “Não há razões que possam justificar o juízo do presidente por outro juízo”, afirmou. O advogado de Battisti, Luis Roberto Alves, abusou da teatralidade, tentou criar compaixão pela figura do réu, disse que Battisti corre risco na Itália mas não negou o principal: os quatro homicídios pelos quais o terrorista foi responsabilizado.

Análise: Decisão sobre Battisti simboliza a política exterior hipócrita do governo Lula

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Imbróglio – A discussão sobre o futuro de Battisti é um verdadeiro imbróglio jurídico. O STF autorizou a extradição do terrorista, pedida pelo governo da Itália, em novembro de 2009. Mas deixou para o presidente Lula a palavra final sobre o imbróglio. A votação foi encerrada após três dias de julgamento, em um apertado placar de 5 votos a 4.

Os ministros entenderam que os crimes imputados a Battisti não tiveram conotação política e não prescreveram. Lula foi na direção oposta e negou a extradição, o que resultaria, em tese, na soltura imediata do italiano. O refúgio a Battisti foi decidido pelo então presidente Lula no último dia de seu governo. A Itália recorreu, contestando a decisão de Lula e o caso voltou à pauta da Suprema Corte nesta quarta-feira.

Battisti é acusado de quatro homicídios ocorridos nos anos 70. À revelia, o italiano foi condenado à prisão perpétua no país de origem. O julgamento terminou em 1993, mas ele nunca cumpriu pena. Fugiu para a França, onde viveu até 2004, quando o então presidente do país, Jacques Chirac, se posicionou a favor da extradição.Battisti fugiu de novo e veio parar no Brasil.

Em março de 2007, foi preso no Rio de Janeiro e transferido para a penitenciária da Papuda, em Brasília. O italiano nega a autoria dos crimes e afirma ser vítima de perseguição política. Chegou a dizer, reiteradas vezes, que a extradição seria um “troféu” para o governo de Berlusconi. A Itália diz que houve crime comum.

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