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Sem estrutura, transporte de presos coloca Rio em perigo

Dezenove veículos precisam transportar 400 detentos por dia, para encontros com defensores e depoimentos. Para compensar, até ambulâncias são usadas

Por Pâmela Oliveira, do Rio de Janeiro
9 nov 2013, 12h53

“Quando o motorista percebe que o carro vai parar, ele tenta chegar a um lugar mais seguro, como um batalhão ou uma delegacia. Quando a van quebra, a gente procura ficar atrás de uma árvore ou um poste, para fazer escolta com menos risco até que o reboque chegue.”

Na semana em que o Rio de Janeiro reabriu a discussão sobre o uso de videoconferência para ouvir depoimentos de presos considerados perigosos, o site de VEJA teve acesso a números e informações que expõem a precariedade no sistema de transporte da população carcerária no Estado. Quantidade insuficiente de veículos, muitos em condições precárias de conservação, e o uso até de ambulâncias nos deslocamentos são alguns dos problemas que transformam uma operação logística que deveria primar pela segurança em uma manobra arriscada. Além de colocar vidas de agentes penitenciários e policiais em risco, uma operação mal sucedida pode facilitar o trabalho de criminosos que se aproveitam de qualquer brecha para planejar uma operação de resgate a comparsas.

A Secretaria de Administração Penitenciária (Seap) precisa organizar o deslocamento de cerca de 400 detentos diariamente, que deixam as penitenciárias para prestar depoimentos em processos ou julgamentos, participar de entrevistas com defensores e/ou receber sentenças. Para cumprir toda a logística, porém, o governo conta com apenas 19 veículos, entre micro-ônibus e vans. Ou seja, cada um deles deveria levar 21 pessoas – considerando que nem sempre elas têm o mesmo destino final. Por meio de nota, a Seap ainda admite que “inúmeros agendamentos são feitos no mesmo horário” e que pode acontecer de “um mesmo acautelado ser solicitado por comarcas diferentes”, resultando em ainda mais atrasos e cancelamentos. Isso sem levar em consideração o trânsito.

Na última quarta-feira, as audiências das varas criminais de Bangu, na Zona Oeste da capital, foram adiadas porque nenhum dos catorze réus havia sido apresentado à Justiça até as 16h30. Em nota, a secretaria colocou a culpa em “um problema na viatura” que seria usada no transporte dos detentos. A justificativa é comum. Muitos dos veículos da Seap estão sem a manutenção adequada e, frequentemente, quebram no meio do caminho, deixando vulneráveis a equipe de segurança e os presos – entre os quais, condenados por tráfico, homicídio, estupros e roubos. “Quando o motorista percebe que o carro vai parar, ele tenta chegar a um lugar mais seguro, como um batalhão da PM ou uma delegacia. Quando a van quebra, a gente procura ficar atrás de árvores ou postes para fazer escolta com menos risco, até que o reboque chegue”, revelou um agente que pediu para não ser identificado. “Os veículos rodam bastante e têm muito problema com freio e suspensão”, detalha.

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Ataque de criminosos – Na noite do dia 13 de junho passado, um agente da Seap morreu e outras quatro pessoas ficaram feridas durante uma tentativa de resgate de detentos que eram transportados do Fórum de Araruama, na Região dos Lagos, para o Complexo Penitenciário de Gericinó, na Zona Oeste do Rio – uma distância de cerca de 150 quilômetros. Vinte bandidos armados interditaram um trecho da Rodovia Niterói-Manilha (BR-101), por volta das 20h, e interceptaram uma van com onze presos. Na época, um dos agentes afirmou que o local era ermo e escuro, o que dificultou a reação. O objetivo do bando era resgatar Lindomar de Oliveira Abrantes, o Dodô, apontado como chefe do tráfico de drogas de Reta Velha, em Itaboraí, município vizinho a São Gonçalo, na Região Metropolitana. Casos como esse não são raros.

Para suprir a carência de veículos oficiais, o Serviço de Operações Especiais (SOE) da Seap, que é quem realiza o deslocamento dos detentos, recorre muitas vezes às ambulâncias do sistema carcerário – e, como quem tenta se ajeitar com um cobertor curto, cobre a falha do transporte de presos deixando desassistido o atendimento de saúde. Outra alternativa adotada com frequência é começar a recolher os presos cada vez mais cedo para conseguir cumprir a agenda. Alguns são pegos ainda à noite ou de madrugada, e ficam circulando por um tempo muito maior pela cidade. “Claro que o ideal seria transportar os presos só durante o dia. Mas é impossível, com as condições que temos hoje”, lamenta o agente.

Houve até quem mudasse o horário de atendimento aos presos, na tentativa de facilitar o próprio trabalho. A defensora pública Carla Vianna, da 43ª Vara Criminal, conta que até o início do ano os defensores entrevistavam detentos de segunda a sexta-feira – o procedimento é necessário para que se conheça o processo e a versão do acusado. Mas diante das falhas recorrentes, todos os defensores precisaram mudar sua agenda, e concentrar as sessões nas segundas, quartas e sextas. “As audiências atrasavam ou eram canceladas, porque os presos não chegavam. Muitas vezes, a Seap entregava a pessoa que faria entrevista com o defensor, mas não conseguia levar aquele que tinha audiência marcada. Por isso, decidimos reduzir os dias de atendimento.”

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Resposta – Em nota, a Seap informou que licitou 48 vans e cinco micro-ônibus para o transporte de presos e que os veículos devem ser entregues até o dia 20. A secretaria admite que atualmente não consegue cumprir todos os agendamentos devido ao excesso de pedidos. Afirma ainda que, na última sexta-feira, 170 presos foram transportados para receber a sentença do juiz, mas esse número poderia ser menor se a comunicação da sentença pudesse ser feita por um oficial de justiça. A Seap acrescenta que o ideal seria que o “Tribunal de Justiça pudesse construir um fórum no Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, para minimizar problemas, como a apresentação de presos distantes da sua unidade prisional de origem”, o que faz com que eles sejam obrigados a “cruzar toda a cidade”.

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