Uma multidão recebeu o rei Charles III nesta terça-feira, 13, na Irlanda do Norte, como parte de sua viagem às três partes do Reino Unido. A visita, em ocasião da morte da rainha Elizabeth II, gerou um raro momento de união entre políticos e foi recheada de simbolismos, dado o histórico britânico na Irlanda e anos de violência na Irlanda do Norte.
Centenas de pessoas se alinharam na rua que leva ao Castelo de Hillsborough, perto de Belfast, a residência oficial da família real na Irlanda do Norte. A área em frente aos portões do edifício foram tomadas por centenas de flores.
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Junto da esposa, a rainha consorte Camilla, Charles saiu do carro para cumprimentar algumas pessoas. Em um momento, até mesmo fez carinho em um Corgi, a raça de cachorro preferida da falecida rainha, que foi levado por uma das pessoas na multidão.
Também nesta terça-feira, o caixão da rainha Elizabeth será levado da Catedral de Saint Giles, em Edimburgo, para Londres. O caixão ficará na capital inglesa por quatro dias antes de um funeral de Estado, marcado para segunda-feira.
Sentimentos mistos
Apesar da recepção calorosa dada a Charles, a monarquia britânica evoca sentimentos mistos na Irlanda do Norte, onde há duas comunidades principais: unionistas protestantes que se consideram britânicos e nacionalistas em grande parte católicos romanos que se consideram irlandeses.
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A presença do monarca coloca luz sobre cicatrizes de três décadas, no conflito entre nacionalistas católicos e sindicalistas protestantes, que deixou cerca de 3.600 mortos. O acordo de paz assinado em 1998 dissolveu a fronteira entre a província britânica e a vizinha República da Irlanda — um país integrante da União Europeia — mas, nos últimos anos, o Brexit colocou pressão sobre esse delicado equilíbrio, exigindo a introdução de controles alfandegários entre o Reino Unido e o bloco.
Entre os mortos nos “Troubles”, como são conhecidas as décadas de violência envolvendo grupos paramilitares de ambos os lados e forças militares britânicas está um membro da família real. O lorde Louis Mountbatten, primo da rainha e mentor de Charles, que morreu em um ataque a bomba em 1979 feito pelo Exército Republicano Irlandês (IRA).
Apesar do acordo de paz de 1998, uma profunda divisão ainda permanece na região. Para alguns nacionalistas irlandeses, a monarquia britânica representa uma força estrangeira opressiva. Em 2012, em um momento de reconciliação outrora visto como impensável, a rainha Elizabeth II se encontrou com Martin McGuinness, ex-comandante do IRA e membro do partido Sinn Fein, se tornando a primeira monarca em quase um século de independência a fazer uma visita de Estado.
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“Minha mãe viu a Irlanda do Norte passar por mudanças históricas. Ao longo desses anos, ela nunca deixou de rezar por temos melhores para este lugar e este povo”, disse Charles. “Minha mãe sentiu profundamente, eu sei, a importância do papel que ela mesma desempenhou ao reunir aqueles que a história separou e ao estender a mão para tornar possível a cura de feridas antigas”.
Em um sinal de avanço em direção a uma paz mais estrutura, representantes do Sinn Fein também irão participar de eventos em homenagem à rainha e irão se encontrar com o rei nesta terça-feira.
Por outro lado, algumas pessoas se posicionaram contra qualquer encontro. No reduto nacionalista de Falls Road, em Belfast, diversos muros foram decorados com murais de Bobby Sands, um membro do IRA que morreu durante greve de fome na prisão em 1981 e outros membros mortos durante confrontos.
“Ele não é nosso rei. Bobby Sands era nosso rei aqui”, disse Bobby Jones, de 52 anos, à agência de notícias Associated Press. “A rainha nunca fez nada por nós. Nunca fez. Nenhum dos membros da realeza”.