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Um clube seleto: as pressões de países que querem entrar na União Europeia

Desmentindo a profecia de que a UE ia se desintegrar, nações se movimentam para integrar bloco — trazendo junto uma nova e pesada carga de conflitos

Por Ernesto Neves 23 out 2021, 08h00

Apresentada como modelo de integração em torno de valores e interesses voltados para o bem comum, que deu nova configuração a um continente historicamente conflagrado, a União Europeia (UE) já passou por várias crises desde sua fundação, em 1993. Mais recentemente, deu-se um clima de descontentamento nas populações empobrecidas por um terremoto financeiro que quase quebrou Espanha, Portugal e Itália e levou a Grécia à falência, em 2010. Some-se o choque provocado por levas de refugiados amontoados em suas fronteiras, fugindo da guerra e da pobreza na África e no Oriente Médio, e eis o terreno aberto para o avanço de um populismo xenófobo e divisionista que culminou com a saída do Reino Unido do bloco, o célebre Brexit, no ano passado. Mais do que nunca, colocou-se a questão: a UE vai se desintegrar? Não só isso não aconteceu, como mais nações estão batendo na porta querendo entrar.

No início de outubro, os líderes dos 27 países-membros se reuniram em Brdo, na Eslovênia, para discutir a adesão de seis candidatos — Albânia, Macedônia do Norte, Bósnia e Herzegovina, Sérvia, Montenegro e Kosovo. O grupo, tirando a Albânia e acrescentando a Croácia (que já faz parte da UE), compõe a colcha de retalhos estendida sobre a península dos Bálcãs, no extremo sul do continente, e costurada a toque de caixa sob a bandeira da antiga Iugoslávia nos tempos da Guerra Fria.

A mais recente expansão da União Europeia ocorreu em 2013, quando justamente a vizinha Croácia foi aceita. Antes disso, saído de um conflito sanguinário com a Bósnia, o país precisou fazer a lição de casa, restaurando os direitos civis e reafirmando sua adesão a instituições e princípios democráticos. O grupo de esperançosos de agora, que aglomera 20 milhões de pessoas, pressiona há quase duas décadas por um lugar ao sol. Para ele, seria a forma de solucionar o atraso econômico da região, a mais pobre da Europa. “Essa é uma questão crucial para os seis países”, diz Edward Joseph, do Centro de Estudos Internacionais da Universidade Johns Hopkins. Do lado da UE, porém, a ampliação do quadro de sócios, que é positiva, precisa ser contrabalançada pelo histórico de rivalidades, pelas batalhas e divergências culturais e religiosas no seu currículo — sem falar na oposição da Bulgária, membro da UE com pretensões territoriais em algumas regiões.

arte mapa Europa

Os países balcânicos queriam estabelecer 2030 como prazo-limite das negociações, mas a proposta não foi aceita — estão em jogo, antes da aprovação, reformas cruciais para a segurança da democracia na região. No encontro, deliberou-se que Albânia, Macedônia do Norte, Montenegro e Sérvia são candidatos oficiais à integração com a UE, enquanto Bósnia e Kosovo permanecem como candidatos potenciais. Também ficou decidido que a península receberá investimentos de 9 bilhões de euros em melhorias sociais e de infraestrutura.

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O fortalecimento do nacionalismo populista, acirrado a extremos com a entrada na Europa de mais de 1 milhão de refugiados em 2015, facilitou a chegada ao poder de opositores da UE — um movimento que ainda causa muita dor de cabeça aos executivos do bloco, apesar de parecer estar em refluxo. Em eleições realizadas neste mês, as cinco principais cidades da Itália, um dos epicentros do novo populismo, escolheram prefeitos pró-integração europeia, no que foi visto como uma expressiva derrota do Movimento 5 Estrelas (M5S), de extrema direita. Na República Checa, o que soava como impossível aconteceu: a oposição se uniu e removeu do poder o primeiro-ministro Andrej Babis, bilionário comparado a Trump.

Na Polônia, onde o Tribunal Constitucional — dominado por aliados do primeiro-ministro nacionalista Mateusz Morawiecki — decidiu que as leis do país se sobrepõem às da União Europeia, mais de 100 000 pessoas foram às ruas se manifestar pela permanência no bloco. “Partidos que atacam a União Europeia vêm perdendo apelo, porque a população está ciente dos benefícios trazidos pela integração”, diz Mitchell Orenstein, especialista em Europa Central e Rússia da Universidade da Pensilvânia. Mesmo com esses sinais, o bloco europeu segue tendo de pisar em ovos para lidar com autocratas como o próprio Morawiecki e o inspirador de todos eles, Viktor Orbán, há dez anos no poder na Hungria — uma hora fechando os olhos a seus excessos ditatoriais, outra punindo medidas antidemocráticas com a retenção de verbas. Nesse contexto, a entrada de seis nações complicadas, sendo duas delas — Sérvia e Montenegro — também governadas por populistas, corre o risco de passar um bom tempo na mesa de negociação.

Publicado em VEJA de 27 de outubro de 2021, edição nº 2761

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