Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

Primeiro debate republicano revela que será difícil tirar Trump de cena

Não há, até onde a vista alcança, ninguém na direita americana capaz de fazer sombra ao atual rei Sol e sua ruidosa onipresença.

Por Caio Saad 26 ago 2023, 08h00

O jogo promete ser quente, embora um tanto desequilibrado. Na abertura semioficial da corrida para a Casa Branca, com o primeiro debate entre os pré-candidatos do Partido Republicano, realizado pela rede de TV Fox News, oito aspirantes marcaram presença, mas a grande estrela do partido, o ex-presidente Donald Trump, ficou de fora. Ou, como definiu o mediador Bret Baier, havia um “elefante fora da sala”, ao brincar com a dimensão política do personagem e a logomarca dos republicanos. Líder nas pesquisas de intenção de voto, Trump decidiu não dar a cara em um encontro no qual seria o centro dos ataques. Esperto, gravou uma entrevista para o jornalista conservador e chapa-branca Tucker Carlson.

O resultado da noite americana? Goleada de Trump. O show dos oito, insosso, atraiu 24 milhões de telespectadores. A conversa trumpista, transmitida na plataforma X, que um dia se chamou Twitter, alcançou a marca de 74 milhões de visualizações. Não há, portanto, até onde a vista alcança, ninguém na direita americana capaz de fazer sombra ao atual rei Sol e sua ruidosa onipresença.

Houve um momento, no debate, que ajuda a resumir a força magnética de Trump, e da qual parece ser impossível escapar. Baier perguntou à penca de candidatos se apoiariam a nomeação do líder republicano mesmo se ele fosse condenado em algum dos quatro processos que enfrenta na Justiça. Os que concordassem deveriam levantar a mão. Seis dos presentes se manifestaram positivamente. Apenas Asa Hutchinson, ex-governador do Arkansas, permaneceu impávido. Chris Christie, ex-governador de Nova Jersey, balançou timidamente um dedinho: “Quer você acredite ou não que as acusações criminais estão certas ou erradas, a conduta está abaixo do cargo de presidente dos Estados Unidos”, justificou, sob vaias da plateia. Foi o ápice de uma refrega chocha, em que sobraram respostas evasivas sobre temas espinhosos como mudanças climáticas, aborto e imigração. Apenas o novato Vivek Ramaswamy brilhou, na cola de Trump, a quem parecia imitar, dados os trejeitos e os olhares. Jovem empresário do ramo da tecnologia, filho de imigrantes indianos, ele afirmou que concederia perdão presidencial ao todo-poderoso. O ex-vice-presidente Mike Pence e o governador da Flórida, Ron DeSantis, que lutam para conquistar apoio, pareciam fantasmas sem voz.

Do lado de lá, fora do picadeiro, nos 46 minutos em que esteve com Carlson, o apresentador de maior audiência da Fox, que foi demitido e trava uma batalha judicial com a emissora, Trump foi Trump. Cometeu racismo explícito ao defender que brancos “estão sendo trocados por pessoas de cor”; sugeriu que adversários poderiam tentar matá-lo; e disse que a combinação entre paixão e ódio, em um patamar nunca antes observado, poderia ser explosiva. No comentário mais cínico da noite, afirmou que havia “muito amor” entre a multidão que invadiu o Capitólio para tentar impedir a certificação de Joe Biden como presidente, em 6 de janeiro de 2021. “As pessoas dizem que foi o dia mais bonito que já viveram”, disse, esquecendo-se convenientemente dos cinco mortos no episódio e dos inúmeros feridos. Sem rebater os argumentos, o entrevistador se limitou a afagar o empresário: “Foi uma decisão terrível termos ficado sem você”, lamentou, deixando de lado as diversas vezes em que criticou o magnata, em mensagens privadas vazadas para a imprensa.

MONOTONIA - A turma dos oito no debate: havia um “elefante fora da sala”
MONOTONIA - A turma dos oito no debate: havia um “elefante fora da sala” (Win McNamee/Getty Images)

A ausência de Trump no debate republicano foi mantida em suspense enquanto se pôde e assessores se encarregaram de espalhar que ele “estava tentado” a comparecer, em um truque barato e antigo. Foram desmentidos pelo próprio pré-candidato. Em postagem na sua rede, a mentirosa Truth Social, ele alegou que a posição confortável nas pesquisas justificavam o bolo. Trump conta, segundo os levantamentos mais recentes, com 52% da preferência dos eleitores republicanos. Seu rival mais próximo, DeSantis, tem 12%. Todos os demais patinam em um mísero dígito. Outra sondagem aponta que 70% dos eleitores registrados no partido acham que seu mandato na Casa Branca foi bom e 60% querem que ele seja candidato novamente. “A vantagem de Trump sobre o segundo colocado não é limitada por situação socioeconômica ou área geográfica”, avalia Matthew Baum, professor de políticas públicas da Universidade Harvard. “Ela retrata o domínio dele em todo o espectro republicano.”

Enquanto segue confiante, dizendo-se vítima de perseguição, Trump se enrola cada vez mais na pilha de processos a que responde por atos relacionados ao período em que foi presidente. No mais recente, no estado da Geórgia, seus advogados concordaram com o pagamento de uma fiança de 200 000 dólares para que ele possa aguardar o julgamento em liberdade, a primeira vez que a exigência foi feita — nas ações anteriores, ela foi considerada desnecessária.

A promotora encarregada do caso, Fani Willis, com base em uma lei criada para combater mafiosos, acusa o ex-presidente e dezoito assessores de formarem uma organização criminosa para tentar alterar o resultado da eleição no estado — aí incluído o famoso telefonema de Trump para o republicano Brad Raffensperger, funcionário encarregado da apuração, solicitando que ele “achasse” votos suficientes para reverter a derrota para o democrata Biden. A expectativa é que pelo menos dois julgamentos se realizem antes da eleição, mesmo sendo o ex-presidente especialista em postergar processos judiciais. Se podem ou não influenciar o resultado da eleição, ninguém se arrisca a prever. O elefante está na sala.

Publicado em VEJA de 25 de agosto de 2023, edição nº 2856

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.