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‘Primavera carioca’ reúne moradores de rua e classe média em ocupação

Por Da Redação
12 nov 2011, 05h03

Morena Madureira.

Rio de Janeiro, 12 nov (EFE).- É bem possível que um dia os livros de história apontem 2011 como o ano das manifestações populares – e depois da Primavera Árabe, do movimento dos ‘indignados’ da Espanha e da ocupação de Wall Street, essa efervescência chegou ao Brasil com mobilizações em diversas cidades do país como o OcupaRio, um acampamento armado na praça da Cinelândia que adquiriu contornos próprios com destaque para a participação ativa de moradores de rua.

A decisão de ocupar a área localizada no centro do Rio de Janeiro, mais especificamente em frente ao Theatro Municipal, foi tomada após um ato realizado no dia 15 de outubro em várias cidades do mundo.

No caso carioca, ficou decidido que as barracas só seriam montadas depois de uma organização preliminar e os primeiros acampados só chegaram à praça uma semana depois.

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De lá para cá, o OcupaRio já passou por algumas transformações, desde a debandada de alguns dos participantes deslumbrados, principalmente adolescentes que no início acreditavam que ‘acabariam com o capitalismo’ em alguns dias, até o fenômeno singular da presença dos moradores de rua na mobilização.

A primeira pergunta que um visitante que se aproxima do aglomerado de cerca de 60 barracas se faz, claro, é ‘por que essas pessoas estão aqui?’. Mas não há uma resposta fácil. Apesar de os movimentos similares registrados em outros países aparentemente terem metas mais delimitadas como o anticapitalismo e a ‘democracia já’, aqui as reivindicações são ao mesmo tempo mais difusas e diversificadas.

‘Eu acho muito engraçado como o pragmatismo é tão inserido em todas as outras questões da vida que as pessoas necessitam que nós sejamos pragmáticos também, e nós não somos. A gente está aqui para construir um processo, uma proposta, mas são várias propostas e ideias diferentes’, explica Mariana, cientista ambiental de 34 anos que está na ocupação desde o primeiro dia e decidiu participar por causas relativas à sua área de atuação, como a oposição à hidrelétrica de Belo Monte.

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Mariana, que como os outros acampados preferiu não revelar sua identidade para manter o caráter horizontal da intervenção, sem líderes estabelecidos, relata que para a organização do acampamento foram formados grupos de trabalho (GTs) de acordo com as demandas do dia a dia, e assim surgiram os aproximadamente dez que existem até o momento, como Cozinha, Infraestrutura, Segurança, Horta Urbana (que promove plantações nos canteiros da praça), Jurídico, Atividades (responsável pela elaboração das inúmeras oficinas diárias), Teoria e Comunicação.

Para viabilizar a ocupação, os acampados precisaram também formar ‘parcerias’ com empresas do entorno e, segundo a cientista ambiental, contaram com um ‘show de solidariedade’. Assim, foram autorizados por escritórios e casas de espetáculo da região a utilizar seus banheiros para tomar banho e pegar água, além de contarem com doações de alimentos de simpatizantes da mobilização e comerciantes das feiras livres que acontecem na área.

A questão da alimentação trouxe uma situação inesperada para os participantes do OcupaRio: atraiu os moradores de rua, que aos poucos passaram a integrar a mobilização de forma efetiva, gerando um ‘choque de realidade’ para muitos dos jovens de classe média que inicialmente eram a maioria esmagadora dos ocupantes.

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‘Um dia foi chegando um, depois dois, dez, e logo a fila para pegar comida estava enorme e chegou a um ponto de 60% da comida ser para os moradores de rua. Aí gerou uma serie de questões sobre como se relacionar com eles’, relembra Kleper, de 29 anos, um dos integrantes o GT da Cozinha.

Os membros desse grupo, que antes cozinhavam fora da ocupação e traziam a comida para os acampados, começaram então a perceber que além de estarem participando pouco das atividades da intervenção, visto que ficavam pouco tempo entre as barracas, estavam gerando acomodação entre os ‘indignados cariocas’, que ficavam sempre à espera de serem alimentados.

‘Resolvemos trazer a cozinha para dentro do acampamento. E foi incrível, porque como a gente não tem fogão, gás nem água encanada, todo mundo ficou sem saber como agir e então chega um morador de rua, que domina a tecnologia de morar na rua, e começa a fazer oficina com as pessoas que não têm essa vivencia. A cozinha hoje é quase 100% gerida pelos moradores de rua e não existe mais separação. São pessoas sedentas pelo movimento, pela ação’, relata Kleper.

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A convivência com os moradores trouxe também outras bandeiras para o OcupaRio, como o caso de Bruna, que vivia nas ruas da Lapa e por apanhar do companheiro foi separada por agentes da Prefeitura da filha recém-nascida, que foi levada para um abrigo.

Ao relatar o caso aos acampados, com os quais convive atualmente, foi ajudada pelo GT Jurídico, que localizou o paradeiro da criança e agora trabalha para reunir mãe e filha.

Além dos moradores de rua, o acampamento conta ainda com uma forte presença estrangeira. O espanhol Matt, por exemplo, apesar de não dormir nas barracas, contribui para o movimento com sua experiência na ‘acampada’ de Barcelona, conhecida como 15-M.

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‘Lá foi mais explosivo e aqui parece que as coisas são mais lentas. Era diferente porque as pessoas já têm muita experiência com auto-gestão, mas também porque na Espanha há um momento histórico e político concreto’, compara.

Mas se em Barcelona a ocupação terminou em cerca de dois meses, ainda não é possível saber se na Cinelândia desfecho será o mesmo, visto que os participantes afirmam que não há exatamente uma meta a ser atingida.

Talvez por conta do caráter global do movimento e temendo uma repercussão negativa, a polícia não tem ameaçado despejá-los e há até quem diga que no final do expediente guarda civis tiram seus uniformes e se juntam aos acampados em suas rodas de violão.

mm/rsd

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