No coração da África, referendo desenha um novo país
Após décadas de guerra civil, sul do Sudão vai às urnas para criar a 193.ª nação do mundo. Mas o sucesso da campanha ainda depende de negociações em torno do único bem do país, o petróleo - além dos caprichos de um ditador
![Mapa do Sudão do Sul](https://veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2016/06/sudao-do-sul-original1.gif?w=620&h=320&crop=1)
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![Pessoas na cidade de Juba, sul do Sudão, para onde milhares de sudaneses do norte estão se deslocando antes do referendo que determinará uma possível separação do país Pessoas na cidade de Juba, sul do Sudão, para onde milhares de sudaneses do norte estão se deslocando antes do referendo que determinará uma possível separação do país](https://veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2016/06/sudao-juba-03-original.jpeg?quality=90&strip=info&w=928&w=636)
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![Sudaneses montam tendas para o referendo que que determinará uma possível separação do país Sudaneses montam tendas para o referendo que que determinará uma possível separação do país](https://veja.abril.com.br/wp-content/uploads/2016/06/sudao-juba-12-original.jpeg?quality=90&strip=info&w=928&w=636)
A partir deste domingo, um novo país pode nascer no coração da África. Cinco anos após um frágil acordo de paz, costurado depois de duas décadas de guerra civil, um referendo deve aprovar a criação da 193ª nação do mundo na região sul do maior país do continente, o Sudão. Contra os primeiros prognósticos, o ditador Omar Bashir parece agora inclinado a aceitar o previsível resultado em favor da independência do Sudão do Sul. Mas o sucesso do processo emancipatório, e o fim definitivo do conflito que opôs o Norte, majoritariamente árabe e muçulmano, ao Sul, negro e cristão, dependerá de negociações futuras em torno da única riqueza do país: petróleo. É que as reservas estão no sul do país, e a saída para o mar, ao norte.
Os Estados Unidos e as Nações Unidas se declararam otimistas com a votação. A expectativa é que mais de 90% dos eleitores optem pela independência. A ONU declarou que o Sudão dispõe dos meios para realizar um referendo “pacífico e crível” e prevê que a independência do Sudão do Sul se concretize em julho. Juba seria a capital. Mas caso o Norte não aceite a independência, teme-se uma nova escalada de violência – a triste marca histórica de lutas separatistas mundo afora, em particular no continente africano.
Guerra civil – Além do conflito entre Norte e Sul, que deixou um número aproximado de 2 milhões de mortos, dificuldades econômicas também alimentam as ambições separatistas do Sul. De 169 países, o Sudão está na 154ª posição do ranking de desenvolvimento humano (IDH), enfrenta uma pesada dívida externa e uma inflação galopante provocada pela brusca desvalorização da libra sudanesa nos últimos três meses.
Refúgio – O governo do vizinho Quênia anunciou na quarta-feira planos de contingência para lidar com um possível fluxo de refugiados do Sudão. Mais de 20.000, estima-se, podem cruzar a fronteira se a consulta acabar em violência, segundo o Alto Comissariado para Refugiados da ONU (Acnur). A recepção aos refugiados será feita por meio de uma parceria entre o governo do Quênia e o Acnur. O plano conjunto prevê um sistema de registro e entrega de documentos para os refugiados. O Quênia já abriga atualmente cerca de 360.000 refugiados, a maioria deles de origem somali, sudanesa e etíope, segundo dados do Acnur. Estima-se que pelo menos 4 milhões de sudaneses da região sul vivam fora do país. Nos últimos meses, com a aproximação do referendo, muitos deles voltaram ao país para votar.
Genocídio – O presidente Bashir tem contra ele uma ordem de prisão do Tribunal Penal Internacional por crimes de guerra e genocídio em Darfur, região oeste. O conflito começou em 2003, opondo tribos nômades africanas de língua árabe e religião muçulmana às demais etnias. A ONU estima as mortes causadas pelo conflito entre 50.000. Mas a acusação não parece constranger o ditador, que se desloca sem ser incomodado para o Chade e o Quênia, mesmo sendo esses países membros do tribunal, contando com o apoio da União Africana.