Uma série de mensagens enviadas por jihadistas franceses para seus parentes retrata a miséria e a violência que marca o cotidiano de jovens europeus recrutados pelo grupo terrorista Estado Islâmico (EI), assim como a ingenuidade daqueles que viajaram para combater na Síria. As mensagens, publicadas pelo jornal Le Figaro, contêm ainda pedidos de ajuda e várias queixas banais. “Estou de saco cheio. Meu iPod não funciona mais. Preciso voltar!”, disse um dos mais de 300 franceses que estão na Síria. A maioria deles tem entre 17 e 23 anos.
Outros reclamam que esperavam combater numa “guerra santa”, mas acabaram sendo relegados ao papel de meros empregados de jihadistas veteranos. “Eu não faço nada, exceto entregar roupas e comidas”, diz um deles. “Eu também ajudei a limpar algumas armas e a transportar corpos de combatentes mortos. O inverno está chegando aqui. Está começando a ficar difícil”. Outro jihadista é mais específico em suas queixas. “Não aguento mais. Eles me fazem lavar a louça!”. Outro aponta uma queixa mais desesperada: “Eles querem me enviar para a frente de combate, mas eu não sei lutar”.
Em comum, as mensagens divulgadas pelo jornal têm indícios de arrependimento por parte dos jihadistas e pedidos de conselhos sobre como voltar à França. “Se eu voltar à França, o que vai acontecer comigo? Posso evitar a prisão? O que devo fazer em troca?”, questiona um jovem para sua família. Outro pergunta se o seu bebê, nascido na Síria, terá direito à nacionalidade francesa.
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Aproveitando a divulgação das mensagens, o Le Figaro levantou a questão sobre a possibilidade desses franceses voltarem para casa. A França, assim como outros países europeus, tem imposto uma série de medidas para dificultar a saída e o retorno de cidadãos que se juntaram ao Estado Islâmico e outros grupos radicais no exterior, como o confisco de passaportes e processos na Justiça. De acordo com o jornal, advogados das famílias dos jihadistas na França estão se organizando para tentar encontrar uma solução para o retorno de “arrependidos”.
“Todos sabem que quanto mais tempo essas pessoas ficarem lá, pior vai ser porque ao ficar assistindo ou cometendo atrocidades eles vão se transformar em bombas-relógio”, disse um advogado citado pelo jornal. A questão, no entanto, esbarra em uma série de dificuldades. “Nenhum político vai assumir o risco. Imagine se um desses ex-jihadistas se envolver em algum ataque no futuro?”, ele admite.
De acordo com o jornal, os advogados, cientes dessas dificuldades, estão tentando uma abordagem mais discreta, como a divulgação dessas mensagens para conquistar simpatia da Justiça e atestar “arrependimento”. Outra estratégia é fazer contatos com a polícia antiterrorismo da França e o gabinete do ministro do Interior, Bernard Cazeneuve. De acordo com a publicação, apesar de não oficial, o conselho das autoridades tem sido recomendar aos candidatos franceses à deserção do EI que eles se apresentem aos consulados do país na Turquia para que a sua situação seja avaliada. Até o momento, cem jihadistas voltaram à França. Destes, 76 foram enviados para a prisão. O restante é mantido sob vigilância.