Maquiagem do Coringa vira símbolo em protestos na França
Os bombeiros, que temem ter de trabalhar para além dos 57 anos, exigem correção do adicional de periculosidade. Não é fácil quebrar a cadeia de privilégios
Deve ser difícil viver em um país em que a reforma da Previdência, pendurada no vaivém ideológico há décadas, acende um pavio de protestos. Não é fácil quebrar a cadeia de privilégios de algumas categorias profissionais. E o governo, na contramão do que vigorou até agora, vai em frente em nome de um sistema “mais justo e simples”. E, voilà, eis o cenário da França do presidente de centro-direita, Emmanuel Macron. Para ele, as novas regras, submetidas ao Parlamento na semana passada, inauguram um tempo em que “cada euro de contribuição dará os mesmos direitos a todos”. Funcionários da estatal ferroviária SNCF e da rede de metrô parisiense, preocupados por perder o que sempre tiveram, não gostaram nada da iniciativa. O “não gostar” na França é sinônimo de lenha na fogueira. Que o digam os bombeiros, que temem ter de trabalhar para além dos 57 anos e exigem correção do adicional de periculosidade, estagnado desde os anos 1990. Enfurecidos, eles desceram ao asfalto com a maquiagem característica do Coringa — o personagem vilão dos quadrinhos que, com o recente sucesso do filme estrelado por Joaquin Phoenix, virou sinônimo de desobediência civil. Protegidos por roupas especiais, alguns manifestantes atearam fogo ao próprio corpo, de forma controlada, para que outro colega “apagasse o incêndio”. Incendiários foram também os apoiadores de Bolsonaro no Brasil que, ao tomarem conhecimento das dificuldades de Macron, postaram mensagens no Twitter. O deputado Marco Feliciano não vacilou e escreveu, debaixo da foto que se vê aí ao lado: “França de Macron no caos. É esse cara aí que quis ensinar o PR Jair Bolsonaro a governar?”.
Publicado em VEJA de 5 de fevereiro de 2020, edição nº 2672