O governo francês alertou o Irã que os esforços europeus para manter o acordo nuclear entre os dois lados não são uma carta branca para Teerã violar os direitos humanos de seus cidadãos. A declaração é uma resposta à sentença aplicada à advogada Nasrin Sotoudeh, condenada a 38 anos de prisão e a 148 chibatadas por defender ativistas do feminismo e mulheres processadas ao não usar o véu islâmico, de uso obrigatório no país, segundo informações de seu marido.
Sotoudeh é uma conhecida ativista dos direitos humanos e foi agraciada com o Prêmio Sakharov em 2012. A honraria é concedida pelo Parlamento Europeu como homenagem a pessoas e a organizações que defendem a liberdade de pensamento.
“Houve uma indignação global sobre o caso da senhora Sotoudeh, e nosso governo partilha totalmente desta indignação”, disse o ministro das Relações Exteriores da França, Jean-Yves Le Drian, a parlamentares.
Sotoudeh já tinha sido condenada a onze anos de cadeia em 2011, quando foi proibida de exercer a advocacia e de deixar o Irã durante 20 anos. As acusações contra a ativista basearam-se em suas entrevistas à imprensa estrangeira sobre clientes que foram detidos após as eleições presidenciais de 2009.
Ela defendeu muitos ativistas e políticos iranianos, incluindo Mehdi Karroubi, um dos principais dirigentes da oposição. Após um recurso, essa primeira pena foi reduzida para seis anos de reclusão, que cumpria em liberdade até junho de 2018, quando voltou a ser detida por acusações de espionagem, disseminação de propaganda e por insultar o líder supremo do Irã.
O regime iraniano nega a pena noticiada pelo marido de Sotoudeh, Reza Khandan. Oficialmente, o governo declara que a iraniana foi condenada a apenas cinco anos de cadeia por “conspirar contra contra a segurança nacional” e mais dois anos por “insultar o Líder Supremo do país, Ali Khamenei”, segundo informa a agência de notícias IRNA.
“Nós fizemos esforços consideráveis com o Irã para manter o acordo nuclear (assinado por Teerã e cinco potências mundiais), apesar da saída dos Estados Unidos”, disse Le Drian.
Ele reforçou que o esforço para manter o acerto não é uma “carta branca” para o Irã e que, certamente, a França não ignora as ações de Teerã contra os direitos humanos. “É por isso que a França fará tudo para assegurar a liberdade da senhora Sotoudeh”, concluiu o ministro.
O maior objetivo do acordo era aliviar sanções impostas ao Irã, principalmente pelos Estados Unidos, em troca de limitações em seu programa nuclear. Com o anúncio da saída dos Estados Unidos, o presidente Donald Trump desmantelou um dos principais legados democráticos do seu antecessor, Barack Obama.
O presidente americano alegou que o acordo era “desastroso” e mencionou investigações conduzidas por Israel sobre a suposta continuidade do programa nuclear de Teerã. A Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) sustenta que o Irã não descumpre o acordo.
Trump restabeleceu as sanções econômicas contra o regime iraniano e ainda instituiu duras medidas contra o país e seus aliados, sem deixar claro se os países envolvidos no pacto poderiam ser afetados. Na mesma fala, Trump afirmou que “está pronto para negociar um novo documento com os iranianos quando possível.”
Sistema de defesa
Apesar da crescente pressão dos Estados Unidos e dos países associados ao pacto, o Irã está determinado a reforçar seus recursos de defesa, afirmou nesta quinta-feira, 21, o líder supremo do país, o aiatolá Ali Khamenei.
“Precisamos levar o Irã ao ponto em que o inimigo entenda que não pode nos ameaçar. As sanções da América tornarão o Irã autossuficiente”, afirmou Khamenei em um discurso transmitido ao vivo na televisão estatal.
O Irã diz que seu programa de mísseis é puramente defensivo e rejeita as limitações exigidas pelos americanos, adotando ainda um discurso midiático ameaçador, que anuncia mísseis de até 2 mil quilômetros de alcance que colocariam Israel e bases militares dos Estados Unidos sob perigo iminente.
Khamenei, um líder conservador que tem a palavra final nas relações diplomáticas da República Islâmica, desqualificou o apoio e as cobranças dos demais signatários do acordo nuclear, afirmando que eles foram incapazes de preservar os interesses econômicos iranianos.
“Este mecanismo estabelecido pelos europeus é como uma piada cruel”, reclamou Khamenei, referindo-se a um canal aberto pelos aliados europeus para que negócios do Irã que não envolvam dólares se esquivem das sanções dos EUA.
“Eles sempre apunhalaram o Irã pelas costas. Os países ocidentais provaram que não são confiáveis”, disse ele, durante discurso na cidade xiita sagrada de Mashhad. Outras autoridades iranianas apoiam romper com o acordo caso as potências europeias não permitam que Teerã colha benefícios econômicos de seu desenvolvimento bélico.
(Com Reuters)