Cherie Blair, ex-primeira-dama que fala por si – sem pudores

Em sua segunda visita ao Brasil, ela divulga seu livro e relata a sua trajetória

Por Cecília Araújo
29 out 2010, 10h18

A advogada especializada em direitos humanos Cherie Blair, mulher do ex- primeiro-ministro britânico Tony Blair (Eric Piermont / AFP/VEJA)

Em meio a dezenas de modelos que desfilavam pelos corredores do shopping mais luxuoso de São Paulo, o Cidade Jardim, em um evento de moda, uma inglesa de 56 anos chegou sem muito barulho ao local, na quinta-feira. Mas ela tinha muito a dizer. Cherie Blair, ex-primeira-dama britânica que provocou polêmica ao publicar uma autobiografia extremamente franca, em 2008, aproveitou sua segunda visita ao Brasil, acompanhando o marido, o ex-premiê Tony Blair, para divulgar seu livro, Speaking for Myself, em palestra numa livraria.

A advogada especializada em direitos humanos não atraiu tantos olhares no shopping, mas ganhou a admiração do público, formado na maioria por mulheres de meia idade, ao falar sobre sua trajetória. A ex-primeira-dama fez a plateia sorrir ao comparar São Paulo a Liverpool, sua cidade natal, por causa do fanatismo pelo futebol. E ganhou reações positivas quando citou a educação como essencial para o surgimento de oportunidades no futuro de qualquer pessoa. Oriunda de um lar modesto, primeira da família a entrar na universidade, ela dá ressonância especial a esse argumento.

Cherie conseguiu um diploma de Direito e alcançou o posto de advogada conselheira da rainha. Agora, quer ser exemplo para outras mulheres: “Não sou nada excepcional. Com oportunidade de estudo, todos conseguem chegar longe”, afirmou. Apesar de a política ser tão presente em sua vida, evitou o assunto durante todo o tempo – no máximo, relembrou uma noite desagradável com Vladimir Putin e sua esposa Ludmila, quando Blair ainda era primeiro-ministro. Desconcertada com os costumes russos, ela estranhou quando Putin a convidou para caçar após um jantar formal em Moscou.

Na palestra, Cherie repetiu o discurso feminista que exibe no livro (usa frases como “Há um lugar no inferno guardado para cada mulher que não ajuda outras”) e falou sobre a fundação que criou para beneficiar mulheres do Oriente Médio, Ásia e África. No livro, Cherie fala sobre o começo do relacionamento com Blair e trata abertamente da gravidez não planejada de seu quarto filho, Leo. Fala até de sexo. Sobre sua atração inicial pelo marido, escreve: “Comecei a me dar conta de que ele era um jovem muito bem apessoado, alto e magro, com ombros largos. Um corpo realmente forte”. Em entrevista ao site de VEJA, Cherie Blair falou sobre a escrita de seu livro:

Cherie Blair autografa seu livro 'Speaking for Myself', em São Paulo — Cherie Blair autografa seu livro ‘Speaking for Myself’, em São Paulo (VEJA)

Em sua autobiografia, a senhora fala sobre sua vida pessoal sem qualquer pudor, dando detalhes de temas geralmente mantidos em segredo por pessoas de vida pública. Por que decidiu ser tão aberta?

Eu adoro livros, sou uma leitora assídua. Na minha biografia, quis escrever algo que eu mesma gostasse de ler, como se eu estivesse conversando com minhas amigas. Nessas conversas se fala sobre namorados, gravidez… E foi sobre isso que escrevi. O objetivo do meu livro é ser uma companhia agradável.

Tony Blair também lançou recentemente uma autobiografia, Uma Jornada. Os objetivos de cada publicação parecem ser bem distintos…

Eu sabia que meu marido também ia escrever um livro e que seria sobre assuntos sérios. Sua biografia é sobre política, sobretudo liderança. Essa é a sua história a contar. Eu preferi falar da garota humilde de Liverpool que conseguiu chegar aonde cheguei. Meu livro é sobre a transformação da minha vida. Acho que, lendo os dois livros, se tem uma visão mais abrangente e interessante do que Tony e eu somos.

Ele não ficou bravo com os detalhes de sua vida expostos em Speaking for Myself?

Acredito que não. Ele é uma pessoa aberta. Quando escrevi o livro, Tony me deu muito apoio. Na ocasião, pensei que estivesse sendo muito mais romântica do que ele poderia ser, mas, na verdade, seu livro também tem um toque de romantismo. Talvez eu tenha mostrado a ele o caminho.

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Seu marido participou de alguma forma da redação do seu livro, e vice-versa?

Tudo o que eu resgatava da memória para escrever meu livro eu mostrava ao Tony. Ele acabava consertando uma coisa ou outra, dizendo que aquilo não tinha acontecido exatamente daquela forma. Eu também tive a chance de ler o livro dele enquanto escrevia, e tomei a liberdade de opinar também. Ninguém tem uma memória perfeita, então, tentávamos chegar a um acordo sobre o que realmente aconteceu.

Apesar de ter muitos fãs, a senhora recebeu várias críticas sobre a forma indiscreta com que narra sua vida. A senhora se arrepende?

Fui o mais honesta possível no livro. Tentei mostrar que sou um ser humano como outro qualquer, o que significa que não sou perfeita. Espero ter conseguido passar essa ideia. Escrever minha biografia também me fez colocar em perspectiva o que estar no centro das atenções influencia em minha vida.

Então, a senhora quer mostrar que o glamour que imaginamos existir por trás de Downing Street não é tão invejável assim…

Os bastidores mostram claramente que a vida política não é só glamourosa. É importante que se entenda que as pessoas de vida pública e política continuam sendo frágeis seres humanos. Eu sou muito mais comum do que você imagina.