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Carta ao Leitor: Peças no tabuleiro

Se a dualidade entre Estados Unidos e União Soviética foi encerrada com o desmanche do império soviético, o jogo agora é definitivamente entre EUA e China

Por Da Redação 18 mar 2022, 06h00

Deflagrados em 24 de fevereiro, os ataques da Rússia contra a Ucrânia vêm ocupando os noticiários do mundo inteiro, trazendo para perto do nosso dia a dia questões e personagens outrora distantes. De um lado revelou-se a sanha autoritária de Vladimir Putin. Saudoso de um passado de grandeza, em estranha combinação do czarismo com os horrores do stalinismo soviético, ele tratou de invadir um país vizinho e soberano. Entre mortes de civis, milhões de refugiados e o medo da população, que não para de fugir, Putin jogou luz sobre uma outra figura, essa totalmente desconhecida no Brasil: o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky. O ex-­humorista se transformou em um chefe de Estado querido e celebrado internacionalmente, com laivos de heroísmo, ao permanecer em Kiev, numa postura de resistência contra a Rússia. Embora ambos tenham uma importância colossal na resolução desse conflito, o embate entre Putin e Zelensky faz parte de um xadrez mais amplo e muito mais complexo. A invasão e o desejado fim das bombas e tiros representam, na verdade, o início de uma nova ordem mundial.

Desde 1989, ao vencer a chamada Guerra Fria, os Estados Unidos desfilaram como força única — houve, ressalve-­se, o 11 de Setembro, depois os percalços no Iraque e no Afeganistão, mas não havia um rival que, de fato, desafiasse o imenso poderio americano, que definia a posição de todas as peças no tabuleiro. Nesse período, a China, máquina econômica incontestável, cresceu e afiou suas garras — destinadas a ser mostradas primordialmente nas questões econômicas. É condição que já há alguns anos ganha contornos concretos, e que a agressão de Putin sacramentou: os chineses são o fiel da balança global. Representam peça fundamental em torno da qual girará o mundo nas próximas décadas. Se lá atrás havia a dualidade entre Estados Unidos e União Soviética, encerrada com a queda do Muro de Berlim e o desmanche do império soviético, o jogo agora é definitivamente entre Estados Unidos e China. É para onde devem se virar todas as atenções do planeta.

Convém, portanto, como mostra a reportagem a partir da página 56, observar os passos de Xi Jinping. Um mês antes da invasão, ele assinou uma declaração conjunta com Putin dizendo que “a amizade entre os dois países não tem limites”. Durante o conflito, o líder chinês foi imprescindível para reduzir os efeitos das sanções econômicas impostas pelo bloco ocidental à Rússia. Enquanto empresas americanas e europeias implementavam restrições nas movimentações financeiras do país, a China deu suporte para que as operações continuassem. Ao mesmo tempo, Xi simulou uma neutralidade, mantendo uma distância cautelosa das negociações de cessar-fogo. Não é improvável, no entanto, que ele se apresente em breve como o fiador da calmaria necessária, atalho para que a China ganhe ainda mais presença nas economias ucraniana e russa. Seria mais uma jogada de mestre. A história mostra que nem sempre os vencedores disparam mísseis para ganhar a guerra: em 1972, quando quis fustigar a URSS, Richard Nixon tratou de viajar para Pequim. Saiu de lá dizendo que aquela semana “mudaria o mundo”. Ele tinha um quê de razão — e os ecos daquele aperto de mão com Mao Tsé-­tung parecem ser ouvidos ainda hoje.

Publicado em VEJA de 23 de março de 2022, edição nº 2781

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