Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

A ressurreição dos mortos

A larga vitória da chapa de Cristina Kirchner sobre a de Macri nas primárias sacode os mercados e embaralha as projeções para a Argentina

Por Kátia Mello
Atualizado em 16 ago 2019, 15h00 - Publicado em 16 ago 2019, 06h45

A Argentina começou a semana engolfada em uma onda de incertezas e turbulências que deve sacudir o país por um bom tempo. No domingo 11, dia das Primárias Abertas Simultâneas e Obrigatórias (Paso), uma eleição que precede a votação “de verdade” e serve de termômetro para o que virá, a chapa encabeçada por Alberto Fernández e com a enrolada e malfalada ex-presidente Cristina Kirchner como vice desmentiu todas as pesquisas e ganhou de lavada da do candidato à reeleição, Mauricio Macri — 47% a 32%, em vez do quase empate que se antecipava. Os mercados tremeram, o peso desabou 30% e as projeções para o futuro entraram em parafuso, sendo a mais preocupante delas a que levantava dúvidas sobre a capacidade de Macri levar a termo seu governo, que chega ao fim em dezembro. Para afastarem a sombra de uma ruptura institucional, os dois adversários dispararam mensagens tranquilizadoras. “Ele se comprometeu a colaborar de todas as formas para que o processo eleitoral, e a incerteza política que desperta, afete o menos possível a economia”, escreveu Macri no Twitter, após uma “longa e boa” conversa por telefone com Fernández. Este, por sua vez, havia assegurado em entrevista que “o presidente sabe que conta com minha ajuda para terminar o mandato”.

+ 1 Minuto com Augusto Nunes: a Argentina flerta com a catástrofe

Cristina e, antes dela, o marido, Néstor Kirchner (morto em 2010), fecharam o país ao comércio internacional, compraram briga com os provedores de empréstimos, nacionalizaram empresas, entraram em confronto com os agricultores argentinos e mergulharam o país em profunda crise econômica. Macri, empresário bem-sucedido situado na direita liberal que encanta eleitores mundo afora, assumiu em 2015 com a promessa de mudar tudo isso e tirar a Argentina do buraco. Fracassou fragorosamente na empreitada, mas, mesmo assim, pouca gente acreditava que os argentinos perdoariam Cristina — além de tudo, enredada em seis processos por corrupção. Pois perdoaram. Contribuiu para isso ter se candidatado a vice e posto no cargo mais alto um político centrista e moderado, que em outros tempos rompeu com ela e criticou duramente sua política intervencionista.

ATORDOADO - Macri: após a derrota, apelo ao adversário para estancar a crise (Agustin Marcarian/Reuters)

Agora, o avanço peronista causa arrepios no mercado financeiro e em países vizinhos — Brasil inclusive. “Não há solução mágica para tirar a Argentina da crise e, neste momento, a estabilidade depende de Macri e Fernández se entenderem”, alerta Sergio Doval, diretor do instituto de pesquisa argentino Taquion. Os votos a favor da dobradinha Fernández-­Cristina foram impulsionados pelo desastre econômico em que o país se encontra: inflação em 55%, desemprego em 10%, terceiro ano seguido de recessão e 32% da população na pobreza. Pesou na balança o empréstimo de 57 bilhões de dólares, com a usual contrapartida de arrochos, que Macri tomou do Fundo Monetário Internacional — instituição da qual os argentinos têm as piores lembranças —, sem conseguir realizar o ajuste fiscal que sanaria as contas públicas (veja a coluna de André Lahóz Mendonça de Barros).

Após a derrota, Macri anunciou um pacote de bondades — bônus para os funcionários públicos, redução de imposto para aposentados, mais ajuda para famílias necessitadas — que não deve ter grande impacto. Diante do provável resultado da eleição de 27 de outubro, o presidente Jair Bolsonaro incorporou o espírito de um torcedor em jogo do Brasil contra a Argentina e disparou insultos a Fernández e Cristina, os “bandidos da esquerda”. Pelo jeito a turma dos panos quentes vai ter trabalho.

Publicado em VEJA de 21 de agosto de 2019, edição nº 2648

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.