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Tenista Emma Raducanu se torna símbolo do multiculturalismo no esporte

Filha de pai romeno e mãe chinesa, ela nasceu no Canadá mas defende o Reino Unido

Por Luiz Felipe Castro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 out 2021, 11h09 - Publicado em 2 out 2021, 08h00

“Envio meus parabéns. É uma conquista notável para alguém com tão pouca idade e um testemunho de seu trabalho árduo e dedicação.” Setenta e sete anos separam o nascimento da remetente da carta de felicitações, a rainha Elizabeth II, 95, de sua destinatária, Emma Raducanu, 18, campeã do último US Open, um dos quatro Grand Slams do tênis, em Nova York. De uma semana para outra, a jovem atleta de pele morena, olhos puxados e gracioso sorriso tornou-se uma das maiores celebridades do Reino Unido, mesmo sem ter nascido lá — fato que, a propósito, explica boa parte do burburinho.

Filha de pai romeno e mãe chinesa, Emma Raducanu nasceu em solo canadense. A família mudou-se para a região de Bromley, na grande Londres, quando a garota tinha apenas 2 anos. Os Raducanu fazem, portanto, parte dos mais de 9 milhões de imigrantes da ilha. Emma é britânica, cidadã do mundo e orgulhosa de suas raízes. Ela surpreendeu ao fazer parte de seu discurso de campeã em mandarim, o que a alçou imediatamente ao estrelato na Ásia, e ergueu o troféu vestindo um uniforme nas cores da bandeira da Romênia (vermelha, amarela e azul), país que visita anualmente para ver a avó. “A história dela é a história de Londres. Aqui nós abraçamos e celebramos a diversidade”, discursou Sadiq Khan, o prefeito da capital, filho de paquistaneses. Como se sabe, contudo, a vida real não é tão singela assim.

arte Tenista

Antes da grande final, na qual Raducanu venceu Leylah Fernandez, outra expoente da pluralidade — é canadense, filha de pai equatoriano e mãe com raízes filipinas —, Emma estampou uma controversa capa de tabloide, na qual foi tratada como a nova queridinha dos britânicos, bem ao lado de uma manchete que exaltava a ordem de retorno imediato à França de imigrantes que tentavam entrar no Reino Unido pelo Canal da Mancha. Em um único dia de agosto, mais de 800 viajantes, a maioria vindos de nações como Irã, Afeganistão, Iêmen, Síria e Sudão, encararam a travessia em busca de dias melhores. Um famoso apresentador local, Adil Ray, foi direto na canela: “Se você joga uma final de tênis, você é britânico. Se trabalha na construção ou é garçom, aí passa a ser romeno”, tuitou Ray, de ascendência paquistanesa e queniana.

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O nacionalismo deu o tom do Brexit, o plebiscito com o qual 51,9% dos britânicos decidiram pela saída do Reino Unido da União Europeia. Pela nova legislação, em vigor desde 31 de janeiro de 2020, os pais de Emma teriam enfrentado enormes barreiras para se estabelecer na terra da rainha. Eis a grande contradição. Emma só é britânica quando vence? Sabiamente, a garota fugiu da polêmica, enquanto o premiê Boris Johnson, defensor do Brexit, foi um dos vários acusados de hipocrisia ao exaltá-la.

Assim como Emma, outros ídolos do esporte, da música e do cinema foram tratados como símbolos de um mundo sem fronteiras, enquanto outros tiveram de encarar a fúria do preconceito nas fases ruins. O odioso termo “britânico de plástico” para tratar os atletas nascidos fora do país ganhou as ruas nos Jogos Olímpicos de Londres 2012. No último verão europeu, o que era para ser uma festa inesquecível em Wembley terminou em pesadelo para três jovens atletas negros e filhos de imigrantes: Jadon Sancho e Marcus Rashford, de raízes caribenhas, e Bukayo Saka, filho de nigerianos, que erraram pênaltis na decisão da Eurocopa contra a Itália e, por isso, enfrentaram ataques racistas nas redes sociais. Trata-se de uma minoria, mas barulhenta.

RACISMO - Saka: o jovem foi alvo na Eurocopa -
RACISMO – Saka: o jovem foi alvo na Eurocopa – (Michael Regan//The FA/Getty Images)

Raducanu, por ora, vem recebendo apenas carinho e também um enorme assédio de patrocinadores. No início do US Open, ela brincou que seu objetivo era apenas passar da primeira fase para poder comprar novos AirPods, os fones de ouvido que havia perdido nos EUA. Acabou levando a premiação de 2,5 milhões de dólares e, ato contínuo, assinou contrato com a joalheria Tiffany & Co., a tempo de aparacer com brincos avaliados em 20 000 euros em um evento de gala. A jovem já é agenciada pela IMG, empresa que impulsionou a carreira de Roger Federer, Maria Sharapova e outras estrelas da modalidade, e negocia a renovação de seu contrato com a Nike. O preço dos ingressos do próximo Wimbledon saltou apenas por causa dela. O publicitário Mark Borkowski, uma espécie de guru britânico das relações públicas, se entusiasmou ao cravar que Emma será uma estrela bilionária. “Este é o começo de algo épico, sem dúvidas”, disse à imprensa local.

Raducanu, portanto, repete os passos de outra tenista multicultural, Naomi Osaka, de 23 anos, dona de quatro títulos de Grand Slam e atleta mulher mais bem paga de todos os tempos. Em um ano, ela faturou 60 milhões de dólares, sendo 55 milhões com patrocínios, de acordo com lista da revista Forbes. Negra, nascida no Japão e criada nos EUA, ela foi a escolhida para acender a pira olímpica nos Jogos de Tóquio, mas sucumbiu à pressão e passou longe do pódio. Assim como a ginasta americana Simone Biles, Osaka é uma referência na luta por saúde mental na elite esportiva e admitiu ter enfrentado um quadro de depressão. A nova xodó dos britânicos parece atenta à realidade que vai enfrentar e surpreendeu ao anunciar a demissão de seu treinador, Andrew Richardson. “Neste momento, sinto que preciso de um treinador com mais experiência. Procuro alguém que já esteve num nível alto e saiba o que é preciso para se manter lá”, afirmou Emma durante um evento, na companhia da duquesa Kate Middleton. Como se vê, boa súdita a tenista já é.

Publicado em VEJA de 6 de outubro de 2021, edição nº 2758

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