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‘Transgressões terão seu preço’, diz criador de ‘Westworld’

Série da HBO exibe o último capítulo de sua primeira temporada neste domingo, à meia-noite

Por Da redação
4 dez 2016, 15h34

Um parque futurista habitado somente por robôs dotados de inteligência artificial. Quem está nesse lugar pode fazer o que quiser, satisfazer os mais loucos desejos, sem sofrer qualquer tipo de represália. Ou quase isso. Segundo os criadores de Westworld, a série da HBO que se apoia nesse enredo, tudo tem seu preço. “As pessoas se colocaram no centro das próprias fantasias, mas aquelas transgressões terão seu preço”, diz Jonathan Nolan, criador, roteirista e produtor executivo do seriado ao lado de sua mulher, Lisa Joy. A série, que é inspirada no filme de mesmo nome de 1973, dirigido por Michael Crichton, exibe o último episódio de sua primeira temporada neste domingo, à meia-noite.

Confira abaixo a entrevista:

 

Foi difícil pensar em retomar algo que foi concebido nos anos 1970, levando em conta todo o avanço da tecnologia desde essa época?

Jonathan Nolan: Nós ainda encaramos a história como ficção científica, mas passados quarenta anos ainda nos aproximamos muito daquela situação. O que se tornou imperativo na narrativa foi a ideia de que o importante não é o que nós pensamos sobre a inteligência artificial e sim o que ela vai pensar de nós. Parece uma suposição lógica pensar que a inteligência artificial vai surgir nas próximas duas décadas. Como ela vai interagir conosco, o que ela vai fazer com os seus criadores? Ou seja, como ela vai nos ver?

Westworld combina dois gêneros – faroeste e ficção científica –, e parece que ambos estão ligados ao medo de mudança, ao medo do progresso, ao desconforto que acontece quando o mundo muda, mas representados de maneira diferente. É isso?

Lisa Joy: Eu acho que quando você pensa no faroeste como um gênero, e na ficção científica como um gênero, ambos contam de certa forma histórias sobre limites. Os faroestes abordam o ser humano diante da ilegalidade, de uma terra selvagem. Na ficção científica, o panorama é diferente, mas os assuntos são os mesmos – é o ser humano diante de um limite desconhecido.  No caso de Westworld, esse limite é tecnológico – a criação de máquinas artificialmente inteligentes e as maneiras como os seres humanos vão interagir com elas. Esses dois tipos de histórias sobre limites interagem entre si de modos interessantes e simbióticos. Eu acho que é um momento muito oportuno para explorar a inteligência artificial na ficção. Antigamente, a ideia da inteligência artificial era um conceito nebuloso distante. As pessoas, em geral, costumavam tratar a ideia como um pesadelo inacreditável ou uma grande farsa. Mas, agora, a tecnologia existe. O surgimento de uma inteligência artificial verdadeira é viável e iminente.

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JN: Outro gênero está escondido no filme original, um thriller paranoico pós-Watergate, em que não estávamos só preocupados com a ideia de sermos devorados pela tecnologia e pelas nossas criações, mas pelos nossos próprios desejos. O ponto de partida do filme, que nós usamos para a nossa construção, foi a ideia de um espaço onde as pessoas podem entrar, agir e dar asas às suas fantasias mais obscuras. Nós nos concentramos nas pessoas que foram a Westworld para fazer exatamente o que elas queriam, uma espécie de modelo Las Vegas em que “o que acontece em Las Vegas fica em Las Vegas.” E o medo de que a tecnologia acelere o ciclo cármico e que os nossos desejos voltam para nos castigar; o sentido de que aquelas pessoas se colocaram no centro das próprias fantasias, e aquelas transgressões terão seu preço.

Ou seja, supõe-se que não haverá consequências, mas você está dizendo que não é possível evitar que haja algumas consequências?

JN: Supõe-se que não haverá consequências, supõe-se que ninguém está vendo, supõe-se que não ficarão registros do comportamento de cada um. E, é claro, nós questionamos tudo isso.

Considerando que Las Vegas existe realmente, nós todos só estamos esperando uma chance de deixar a aparência de sofisticação de lado para agir em função dos nossos desejos mais baixos?

LJ: Os seres humanos podem ser reduzidos às cores primárias de diversas maneiras, e dependendo de como você olha para essas cores primárias elas podem ser boas ou horríveis. A primeira cor primária é a violência. Existe uma predisposição para a violência em todos nós em níveis diferentes. Eu diria, inclusive, que quase todos nós brigaríamos por alguém ou alguma coisa que amamos. Esse impulso vem de outra cor primária, que é o amor, algo maravilhoso. Na série, nós analisamos o comportamento humano – esses impulsos, sejam eles bons, nobres, terríveis ou trágicos – que está impresso no nosso próprio código genético, no nosso DNA.

A memória também é claramente uma questão muito importante na série. Vocês têm grande interesse pelo assunto? Até onde ele vai? O que é a memória exatamente?

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LJ: Sim, é uma coisa muito interessante – como seres humanos, nós nos contamos a história sobre quem somos, mas não somos narradores confiáveis. A nossa memória também não é confiável. É claro que não existe ninguém que limpe a nossa memória no meio da noite como acontece com os anfitriões. Mas o nosso processo é mais traiçoeiro, porque nós nos lembramos das coisas de acordo com a nossa própria engrenagem. Nós construímos a história sobre nós mesmos a partir de lembranças não confiáveis. Às vezes, os nossos próprios mitos pessoais são tão fictícios quanto os dos anfitriões.

Qual é a sua relação pessoal com a tecnologia?

JN: Nós temos um carro autônomo há alguns anos. É uma nova experiência ter um carro que a cada mês, ou a cada dois meses, você sabe que ele pode fazer alguma coisa nova. Quando compramos o carro, ele era basicamente um bom carro comum. Enquanto estávamos fazendo esta série, o nosso carro evoluiu. Quando estávamos filmando o final da temporada, o carro já podia dirigir literalmente sozinho.

LJ: E estamos de novo diante dos mitos que os seres humanos se contam. Eu conheço muita gente que tem medo de avião. Eu acho que parte desse medo se deve à sensação de perda de controle da situação. Hoje grande parte dos voos é feita por máquinas, por pilotos automáticos. Eu acho que as pessoas gostam da ilusão do controle, mesmo sendo mais falíveis do que uma máquina. As pessoas tendem a ver o mundo por meio das suas lentes egocêntricas – tendem a pensar que são excepcionais, a dar mais importância às suas próprias experiências, ver as suas dores como trágicas, os seus atos como justos. Nós raramente nos sentimos vilões nas nossas próprias histórias. Esse egocentrismo pode ofuscar a verdade das situações, tornar mais difícil ter empatia com os outros.

JN: Essa é uma das questões que nós abordamos na série: a maneira como nós vemos o mundo, a maneira como nós nos vemos, e este lugar, Westworld, este parque, amplia esse egocentrismo, esse narcisismo, porque todo mundo pode ser herói ou vilão.

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