O jovem cineasta franco-senegalês Alain Gomis apresentou nesta sexta-feira na disputa pelo Urso de Ouro de Berlim seu filme “Aujourd’hui” (Hoje), uma fábula sobre o último dia da vida de um afro-americano que volta a Dacar, cidade dominada pela revolta de seus habitantes contra a pobreza.
O personagem Satché é interpretado pelo ator e músico nova-iorquino Saul Williams.
Embora algumas vezes pareça um documentário, filmado com câmeras digitais nas ruas da capital senegalesa, o espectador sabe que se trata de uma fábula porque nos primeiros planos pode-se ouvir a voz de um velho narrador.
“Para mim, o filme é uma maneira de celebrar a vida, é um filme contra o medo, uma maneira de reafirmar que o presente é a porta da eternidade. É um filme sobre o presente, sobre o valor de cada instante, a única coisa que possuímos”, declarou Alain Gomis, de 40 anos, nascido em Paris, de mãe francesa e pai senegalês.
Gomis esclareceu que as imagens das violentas manifestações vistas no filme foram rodadas há mais de um ano em Dacar e não têm relação com os recentes distúrbios causados pelos protestos contra a candidatura de Abdulaye Wade às eleições presidenciais.
“A tensão que se vê em Dacar é produto de uma situação mundial, o contraste entre uma minoria de ricos e a maioria, milhões de pessoas, que sofrem com a pobreza, com o cotidiano difícil”, disse o cineasta, destacando que a realização deste filme “foi uma luta permanente”.
Embora não fale muito no filme, Saul Williams, conhecido principalmente por sua música e a atuação no longa-metragem “Slam”, precisou aprender algumas frases no idioma wolof. “Ir ao Senegal foi uma experiência muito forte para mim, foi como voltar na imaginação às minhas raízes, depois de quatrocentos anos”, disse.
“Não foi preciso falar muito, tudo é sutil, emoção. Precisei me preparar, como ator, com a ideia de que meu personagem sabia que ia morrer na próxima noite. Confesso que tive medo de falecer enquanto fazia o filme”, disse.
O cineasta explicou que foi difícil conseguir dinheiro para uma produção fora dos formatos habituais. “Rodamos com pouco dinheiro. Tanto os atores quanto os técnicos foram muito mal pagos. Hoje em dia estamos imersos num sistema destruidor da criatividade. Realizar um filme que saia dos códigos tradicionais da narração é uma proeza”, afirmou.