Em 14 de abril de 2016, dois dias antes da votação do impeachment da então presidente Dilma Rousseff, o deputado federal Eduardo Bolsonaro publicou uma recomendação de investimento que até hoje repercute. “Não compre dólar agora”, disse o filho do agora presidente da República, Jair Bolsonaro. À época, a moeda americana estava cotada a 3,46 reais e, de fato, viria a cair nos meses seguintes. Tudo mudou a partir de 2018, principalmente após a eleição de seu pai. Pouco a pouco, o dólar passou para 3,70 reais, depois para 4,20 reais, e com a crise econômica causada pela pandemia do coronavírus, disparou até bater em 5,90 reais durante o pregão desta quarta-feira, 13. Desde a vitória de Bolsonaro, em 28 de outubro de 2018, até agora, o real se desvalorizou 89%. A frase do deputado Eduardo virou meme e motivo de cobranças constantes sobre o preço do dólar. O principal motivo está nos planos de muitos brasileiros que pensam em viajar, trabalhar ou estudar fora e que podem estar inviabilizados devido à queda brutal do real — a maior de uma cesta de mais de 40 moedas relevantes para o comércio internacional.
O ano de 2020 apresenta-se, de fato, como um mau momento para se pensar em viagens, mas muita gente que tem passagem marcada para o fim do ano enfrenta, além da agonia de saber mesmo se conseguirá embarcar para o destino planejado por conta da pandemia, a disparada do dólar. Isso torna a fase de preparação ainda mais complicada. Com a equação da taxa de juros baixa, falta de controle sobre a pandemia de Covid-19 e a instabilidade política, o dólar comercial, a cotação oficial se aproxima dos 6 reais, e para os turistas, já passou há muito disso. O papel moeda para turistas era vendido entre 6,05 reais a 6,14 reais em casas de câmbio de São Paulo na manhã desta quarta-feira, 13. Para quem não consegue adiar os planos da viagem e precisa embarcar ainda este ano, não há solução a não ser encarar o câmbio.
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Clique e AssinePara Mauriciano Cavalcante, gerente de câmbio da Ourominas, não há como o viajante fugir do bom e velho planejamento, com compra de moeda aos pouquinhos. Segundo ele, as seguidas crises que o país enfrenta aceleram a cotação do dólar, que reflete na modalidade turismo, usada por quem viaja. “Continuamos recomendando que o turista faça a compra aos poucos, conforme vá entrando recursos que possa destinar a viagem. Assim, é possível fugir de surpresas desagradáveis, como as últimas que vem acontecendo”, afirma. Segundo Mauriciano, como o viés da moeda é de alta, não vale a pena especular o momento de compra, porque não se sabe quanto tempo a cotação levará para descer e se isso acontecerá. Caso o viajante já tenha se planejado anteriormente, conseguiu aproveitar cotações um pouco melhores. Se precisar realmente viajar, a melhor estratégia é comprar aos poucos até a data da viagem.
Desde o começo de 2019 planejando uma viagem com a família para Orlando, o bancário Celso Eduardo de Souza, 36 anos, conseguiu comprar dólar na casa dos 4 reais durante o ano passado. Ele embarcaria em março com a mulher, a filha de 6 anos e outros familiares, porém, na semana que iria viajar, os parques da Disney fecharam por causa da pandemia do coronavírus. Com isso, a família decidiu adiar a viagem. Como os voos para os Estados Unidos ainda estavam acontecendo, Celso perdeu as passagens, mas conseguiu reembolso dos hotéis, aluguel de carros e a possibilidade de remarcar os ingressos para os parques até 5 de dezembro deste ano.
Para não perder o dinheiro já gasto nos parques, porque não foi dada a opção de reembolso, ele planeja embarcar em novembro para curtir a viagem. “O duro que com essa cotação do dólar, a viagem que planejávamos fazer, vai ser outra porque tudo ficou mais caro. Planejava trocar de celular, comprar um computador, mas com o dólar a seis reais, eu pagaria lá o mesmo preço que está custando aqui”. Assutado com o valor da cotação, Celso ainda não comprou novas passagens para a família e trocou mais dólar. Ainda está nos planos visitar o Mickey, porém Souza afirma que irá esperar mais um tempo para ver se a cotação cede ou então cancelará o passeio em definitivo.
Para Edward Moya, analista de mercado financeiro da Oanda, é difícil acreditar que a cotação do dólar ceda nos próximos meses. “O real brasileiro é a moeda com pior desempenho nas Américas este ano e essa tendência não deve ser interrompida tão cedo. Eventualmente, o Brasil verá uma recuperação, mas isso provavelmente será uma história de 2021″. No cenário das economias globais muito combalidas pela pandemia e os cenários de incerteza, o conselho é tentar fazer a viagem em outro momento. ” Historicamente, os viajantes são incentivados a comprar gradualmente até a viagem, mas isso pode não valer a pena desta vez. O dólar poderá permanecer forte pelos próximos dois meses, mas a recuperação econômica global verá as moedas de commodities se recuperarem primeiro, depois as de mercados emergentes. O dólar está próximo das máximas de todos os tempos em relação ao real do Brasil, mas fechar em um valor no momento pode ser um erro caro”.
Preocupada com a disparada no valor das moedas, a funcionária pública Carina Reis, 30, adiou os planos de um intercâmbio para a Nova Zelândia, onde ficaria por cinco meses a partir do início de 2021. Carina fechou o pacote em maio de 2019, quando o dólar americano para turismo estava na cada dos 4,24 reais e o dólar neozelandês a 2,89 reais. No plano inicial, sem pandemia e com um câmbio oscilando dentro da normalidade, ela compraria a passagem para embarcar no meio deste ano, e já começaria a trocar dinheiro para despesas no novo país. Porém, com o dólar da Nova Zelândia a 3,75 reais e o dólar americano estourado, ela diminuiu o curso para dois meses e postergou para agosto do ano seguinte, mas ainda não sabe se realmente conseguirá viajar. “Não esperava esse descontrole na moeda, que encarece tudo. Lá terei que pagar a acomodação inclusive, e a variação foi muito grande. Tinha pensando em ficar mais tempo para poder ter o visto de trabalho, mas com dois meses não posso tirar essa autorização. A viagem ficou bem desvantajosa e ainda estou estudando o que posso fazer”. Além da viagem para aprimorar o inglês, a funcionária pública iria a passeio para o Chile em outubro, mas não sabe se conseguirá embarcar, por isso, não se planejou para comprar moeda. “A recomendação é levar dólar, mas não tem condição de comprar. Vamos esperar chegar mais perto e, se for vantajoso, compro. Se não der para viajar, paciência”.
Se adiar não é possível, a boa e velha dica da compra planejada de moeda segue válida porque, segundo Pedro Paulo Silveira, Economista-Chefe da Nova Futura Investimento, não se sabe qual o rumo que a crise política irá tomar e, com isso, o dólar pode estressar ainda mais. De acordo com o especialista, nas compras periódicas de moeda para quem planeja uma viagem, é preciso que o turista compre linearmente um valor em dólar, e não em real. Ou seja, com a moeda cara, esse gasto irá subir. “A compra do dinheiro precisa sempre ser planejada em moeda estrangeira porque é esse dinheiro que você irá utilizar no exterior. Não adianta manter o montante em real porque a variação do dólar pode fazer falta”.