Nesta semana, o presidente brasileiro Jair Bolsonaro afirmou em conferência dos BRICS que divulgará a lista dos países que compram madeira ilegal proveniente de desmatamento da Amazônia, uma vez que a Polícia Federal desenvolveu um método pelo qual é possível rastrear uma espécie de “DNA” da madeira, e a sua proveniência. “Daí sim estaremos mostrando que estes países, alguns deles que muitos nos criticam, em parte têm responsabilidade nessa questão”, disse Bolsonaro. Dias depois ele não apresentou a lista, mas deu a entender em live que a França seria um deles.
Desde que assumiu a Presidência da República e os dados sobre o desmatamento da Amazônia passaram a crescer, o presidente brasileiro vem sendo pressionado a tomar providências para frear a devastação da mata. Floresta de grande importância para o mundo, a Amazônia e a sua preservação vêm sendo alvo de atenção principalmente de países da Europa, como a própria França e a Alemanha. E um dos maiores instrumentos usados para pressionar o presidente brasileiro a se preocupar com essa agenda é o acordo Mercosul com a União Europeia, que deve beneficiar o Brasil por facilitar as exportações de produtos brasileiros para o bloco. O acordo, no entanto, está parado sobre a mesa de negociação.
Dados compilados pelo Ibre/FGV a pedido da VEJA mostram que, a despeito das pressões internacionais, as vendas brasileiras à União Europeia ainda não foram diretamente impactadas pelas pressões ambientais. Apesar da queda nas exportações de 14,2%, de janeiro a outubro de 2020 em relação ao mesmo período de 2019, Lia Valls, pesquisadora responsável pelo levantamento, afirma que ela é decorrente da recessão econômica causada pela Covid-19, e não por questões pontuais ligadas à Amazônia. “Não é possível associar queda nas exportações com pressões na área climática, pois não foi tomada nenhuma medida sobre aplicação de sanções”, diz ela.
Além disso e apesar de a imagem do país estar manchada devido às questões ambientais, a balança comercial brasileira não foi fortemente impactada neste ano principalmente por causa das boas relações comerciais do Brasil com a China e da eficiência do agronegócio brasileiro. Na contramão da queda das vendas nos produtos industrializados, houve aumento na exportação das commodities para o gigante asiático, que se recuperou mais cedo da primeira onda da Covid-19 e cresceu, ao contrário do que ocorreu com as demais grandes economias do mundo.
O alerta, no entanto, deve permanecer aceso para o Brasil porque a agenda ambiental deve surgir com mais força no próximo ano, quando Joe Biden assumir a Casa Branca. O democrata tem o combate ao meio ambiente como uma de suas prioridades políticas e, se o Brasil não se posicionar mais veementemente no tema, pode se prejudicar comercialmente. “Os setores exportadores que estão preocupados com seus negócios podem fazer mais pressões no governo brasileiro para que ele modere o tom”, diz Valls. As ameaças de restrições na Europa também podem se tornar realidade em algum momento.
Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da USP e membro do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), acredita que haverá uma redistribuição de poder global com a eleição de Biden, mas que isso levará alguns meses para se concretizar. A curto prazo, porém, o que lhe chamou a atenção foi o discurso do presidente brasileiro sobre a divulgação dos países que compram madeira ilegal do Brasil. “Foi uma coisa surpreendente. O governo admite explicitamente que sabe das atividades, sabe quem compra, quem vende, e isso é uma atividade ilegal. Isso rebaixa o Brasil para um país que tolera ilegalidades, é muito ruim para o nosso país”, diz ele.